O casamento entre pessoas do mesmo sexo e seu impacto nas crianças

Novo estudo destaca riscos afetivos e psicológicos

Por John Flynn, LC

ROMA, 23 de Fevereiro de 2015 (Zenit.org) – Um novo estudo publicado este ano traz evidências de que as crianças obtêm melhores resultados em seu desenvolvimento quando são criadas por pais heterossexuais. O artigo “Problemas emocionais entre crianças criadas por pais homossexuais: diferença por definição” foi publicado na edição de fevereiro de 2015 do British Journal of Education, Socity and Behavioural Science. O autor do estudo é o professor de sociologia Donald Paul Simmons, da Universidade Católica da América, e se baseia numa amostragem de mais de duzentas mil crianças, incluindo 512 criadas por parceiros do mesmo sexo.

As conclusões indicam incidência consideravelmente maior de problemas emocionais nas crianças cujos responsáveis são pessoas do mesmo sexo, em comparação com os filhos de pais heterossexuais. “Os filhos de pais biológicos casados apresentam 1/4 dos problemas emocionais identificados entre as crianças criadas por pais do mesmo sexo”.

Na introdução, o estudo menciona que, ao longo dos últimos anos, várias pesquisas afirmaram que as crianças criadas por pais do mesmo sexo não sofrem desvantagens em comparação com os filhos de pais heterossexuais. Tais pesquisas foram tão bem divulgadas que chegaram a embasar sentenças em processos judiciais e decisões tomadas em políticas públicas e em ambientes profissionais.

Mais recentemente, porém, revisões dessas pesquisas revelaram deficiências em sua elaboração, ao mesmo tempo em que novos estudos vêm apontando resultados negativos no desenvolvimento de crianças de famílias do mesmo sexo. Muitas das pesquisas que alegavam não haver diferenças entre crianças de diferentes tipos de famílias se baseavam em amostragens muito pequenas ou em fontes não representativas, além de apresentarem limitações metodológicas.

Instabilidade familiar

Um fator que afeta em especial as crianças criadas por parceiros homossexuais é o maior índice de instabilidade e dissolução da relação entre os parceiros, na comparação com os casais de sexo oposto.

“Estudos sobre o divórcio sugeriram que a dissolução familiar pode afetar a saúde emocional da criança devido ao aumento do conflito parental anterior à separação (…) Pais afetiva ou mentalmente instáveis são um fator de risco para o desenvolvimento de transtornos mentais ou emocionais na criança. Há indicativos robustos de que a atração por pessoas do mesmo sexo está associada a um risco mais elevado de sofrimento psíquico”, acrescentou Simmons.

A falta de laços biológicos para as crianças criadas por casais do mesmo sexo é outro fator que pode causar problemas. “Nenhuma criança participante deste estudo e criada por parceiros homosseuxias vivia com ambos os pais biológicos, ao passo que, nas famílias heterossexuais, quase dois terços (64%) viviam com pai e mãe biológicos”, informa o artigo, recordando também que “quase todos os estudos que já examinaram esta questão apontaram que o bem-estar infantil é mais elevado entre as crianças que vivem com ambos os pais biológicos”.

“No mínimo, não é acurado afirmar que as crianças criadas por parceiros do mesmo sexo não sofram desvantagem alguma em relação às que são criadas por famílias heterossexuais”, observa o autor.

Estigmatização?

Simmons constatou que a suscetibilidade a problemas emocionais devidos à estigmatização dos casais homossexuais foi pouco marcante. Por isso, “deve ser rejeitada a hipótese de que as restrições relativas à paternidade ou ao estado civil dos parceiros homossexuais explique o maior risco de problemas emocionais”.

“O estudo indica que os problemas emocionais das crianças criadas por parceiros do mesmo sexo têm relação justamente com a privação da experiência de ser criadas pelo pai e pela mãe biológicos”, já que, “funcionalmente, o casamento entre pessoas de sexos opostos é uma prática social que, tanto quanto possível, garante às crianças um cuidado conjunto de ambos os pais biológicos, com os seus consequentes benefícios naturais”.

O que é Transverberação

O fenômeno da transverberação ficou conhecido principalmente por causa da famosa escultura de Gian Lorenzo Bernini, chamada “O Êxtase de Santa Teresa”, que está na Igreja de Santa Maria della Vittoria, em Roma. Essa magnífica obra barroca retrata uma experiência relatada pela própria Santa Teresa de Jesus, em sua autobiografia:

“Quis o Senhor que eu tivesse algumas vezes esta visão: eu via um anjo perto de mim, do lado esquerdo, em forma corporal, o que só acontece raramente. Muitas vezes me aparecem anjos, mas só os vejo na visão passada de que falei. O Senhor quis que eu o visse assim: não era grande, mas pequeno, e muito formoso, com um rosto tão resplandecente que parecia um dos anjos muito elevados que se abrasam. Deve ser dos que chamam querubins, já que não me dizem os nomes, mas bem vejo que no céu há tanta diferença entre os anjos que eu não os saberia distinguir.

Vi que trazia nas mãos um comprido dardo de ouro, em cuja ponta de ferro julguei que havia um pouco de fogo. Eu tinha a impressão de que ele me perfurava o coração com o dardo algumas vezes, atingindo-me as entranhas. Quando o tirava, parecia-me que as entranhas eram retiradas, e eu ficava toda abrasada num imenso amor de Deus. A dor era tão grande que eu soltava gemidos, e era tão excessiva a suavidade produzida por essa dor imensa que a alma não desejava que tivesse fim nem se contentava senão com a presença de Deus. Não se trata de dor corporal; é espiritual, se bem que o corpo também participe, às vezes muito. É um contato tão suave entre a alma e Deus que suplico à Sua bondade que dê essa experiência a quem pensar que minto.”[1]

De acordo com a descrição de Santa Teresa, está a se falar, sobretudo, de uma experiência extraordinária do amor de Deus. Como muitos não acreditaram no que ela relatou – a própria santa faz referência “a quem pensar que minto” –, o próprio Deus fez questão de mostrar a veracidade do que ela dizia. Em 1591 – dez anos após a sua morte e vinte após a sua transverberação –, exumaram o seu corpo e perceberam que estava incorrupto. Então, a pedido de um bispo, o coração de Teresa foi retirado, a fim de que fosse exposto na cidade de Alba de Tormes, onde ela morreu. Para espanto geral, havia em seu coração uma ferida cicatrizada, com sinais de cauterização – o que se encaixa perfeitamente com a experiência da transverberação, quando foi penetrada por um “dardo de ouro comprido” em cuja ponta de ferro “parecia que tinha um pouco de fogo”: o atestado divino de que esse fenômeno é verdadeiro e a santa não estava mentindo.

A própria Igreja, porém, tem critérios muito rigorosos para aprovar esses tipos de milagres. O padre Quevedo, no livro “Os Milagres e a Ciência”, fala, por exemplo, do cardeal Prospero Lambertini – Papa Bento XIV –, que, com bastante cuidado científico, investigou o caso da transverberação de Santa Teresa e defendeu a fé católica contra embustes e falsificações, aprovando esse fato extraordinário.

Mas, em que consiste, de fato, a transverberação? Trata-se de uma experiência que, antes de qualquer coisa, acontece na alma. Santa Teresa mesma diz que a dor causada pelo dardo místico do anjo “não é dor corporal, mas espiritual”. No caso dela, bem como no caso de São Pio de Pietrelcina e de São Francisco de Assis, a transverberação teve efeitos também corporais. Mas eles não são necessários, como explica São João da Cruz:

“Se Deus, por vezes, permite que se produza algum efeito exterior, nos sentidos, semelhante ao que se passou no espírito, aparece a chaga e ferida no corpo. Assim aconteceu quando o serafim feriu a São Francisco: chagando-o de amor na alma com as cinco chagas, também se manifestou o efeito delas no corpo, ficando as chagas impressas na carne, tal como foram feitas na alma ao ser chagada de amor. Em geral, não costuma Deus conceder alguma mercê ao corpo, sem que primeiro e principalmente a conceda no interior, à alma.”[2]

No processo de santificação, o mais importante é o que acontece no espírito, não no corpo. Por isso, adverte ainda São João da Cruz, “quanto mais intenso é o deleite, e maior a força do amor que produz a chaga dentro da alma, tanto maior é também o efeito produzido na chaga corporal, e crescendo um, cresce o outro”[3]. Ou seja, a medida verdadeiramente extraordinária desse fato não está senão no interior, no que acontece à alma.

Santa Teresinha do Menino Jesus também passou por essa realidade mística, mas sem receber chagas corporais. Em um relato do dia 7 de julho de 1897, recolhido no “Caderno Amarelo”, de Madre Inês de Jesus, é possível ler:

“Começava a minha Via Sacra quando, de repente, fui tomada por um amor tão violento pelo Bom Deus, que não posso explicar isso senão dizendo que era como se me tivessem mergulhado toda no fogo. Oh! Que fogo e que doçura ao mesmo tempo! Eu ardia de amor e sentia que um minuto, um segundo a mais, e não conseguiria mais suportar tal ardor sem morrer. Compreendi, então, o que dizem os Santos sobre esses estados que eles experimentaram tantas vezes.”[4]

Mas, afinal, o que acontece à alma transverberada? Ela é completamente invadida pelo amor divino. É Deus mesmo quem age na alma para aumentar nela a caridade.

Isso é feito no sentido de aumentar a comunhão da alma com Deus. Algumas pessoas têm uma visão equivocada de santidade: acham que é um “moralismo”, em que se seguem os mandamentos e, com as próprias forças, se chega à perfeição. Mas a santidade não é isso. Ela é, ao invés, o progresso no amor: Deus derrama em nossos corações o Seu Espírito e purifica o nosso amor, até chegarmos à caridade perfeita, às últimas moradas do nosso “castelo interior”.

Como se dá esse processo? Primeiro, acontece a conversão, quando se deixa a vida de pecado e se trilha a “via purgativa”, com oração e mortificações. Então, não havendo mais o que se purificar ativamente, Deus prova a alma pela “noite escura dos sentidos” e pela “noite escura da alma”, depois das quais ela se encontra em um estágio elevado de santificação.

Santa Teresa recebeu o dom da transverberação quando estava na sexta morada. Tendo passado pela “união árida” (também chamada “noite escura”), não tinha ainda chegado à perfeição. Ela encontrava-se em um estágio intermediário, chamado de “união extática”, em que alma recebe os fenômenos extáticos, é tocada pelo amor, mas ainda existem muitos altos e baixos. Faltava-lhe passar pela “união transformante”, na qual a alma se configura definitivamente a Cristo – o que aconteceu quando ela entrou na sétima morada.

São João da Cruz, ainda em seu “Chama Viva de Amor”, descreve com detalhes a transverberação:

“Acontece-lhe, então, sentir que um serafim investe sobre ela, com uma flecha ou dardo todo incandescente em fogo de amor, transverberando esta alma que já está inflamada como brasa, ou, por melhor dizer, como chama viva, e a cauteriza de modo sublime. No momento em que é cauterizada assim, e transpassada a alma por aquela seta, a chama interior impetuosamente irrompe e se eleva para o alto com veemência, tal como sucede num forno abrasado ou numa fogueira quando o fogo é revolvido e atiçado, e se inflama em labareda. A alma, então, ao ser ferida por esse dardo incendido, sente a chaga com sumo deleite. Além de ser toda revolvida com grande suavidade, naquele incêndio e impetuosa moção que lhe causa o serafim, provocando nela grande fervor e amoroso desfalecimento, ao mesmo tempo sente a ferida penetrante e a força do veneno com que vivamente estava ervada aquela seta, qual uma ponta afiada a enterrar-se na substância do espírito, a traspassar-lhe o mais íntimo da alma.”[5]

Em resumo, a transverberação é Deus agindo na alma para purificar o amor humano e levar à paz definitiva com Cristo já nesta terra. Assim conduzida, a alma santificada pode finalmente dizer: “Eu vivo, mas já não sou eu; é Cristo que vive em mim”[6].

Referências bibliográficas

  1. O Livro da Vida, capítulo 29, n. 13
  2. Chama Viva de Amor, canção II, n. 13. In Obras Completas, volume II, p. 131
  3. Ibidem
  4. Santa Teresinha do Menino Jesus, Obras completas escritos e últimos colóquios. São Paulo: Paulus, 2002. p. 897
  5. Chama Viva de Amor, canção II, n. 9. In Obras Completas, volume II, p. 130
  6. Gl 2, 20

    Padre Paulo Ricardo

A especialista Angela de Malherbe responde às perguntas dos casais sobre o método Billings

O método Billings é confiável?

Quando é bem ensinado e aplicado, o método Billings tem 99% de eficácia, no caso de casais que querem evitar ou adiar uma gravidez.

Por outro lado, este método é seguido por 80% das pessoas que optaram por um método de regulação natural dos nascimentos.

Sua eficácia também foi comprovada pelos casais que queriam filhos, mas não conseguiam engravidar. Os resultados são muito superiores aos obtidos pelas fecundações in vitro (70% contra 25%).

– Em que se baseia esta confiabilidade?

O método Billings é um método científico, concebido por um casal de médicos, John e Evelyn Billings, australianos.

A eles se uniram pesquisadores de renome internacional: o sueco Erik Odeblad, professor de medicina biofísica, e o professor James B. Brown, endocrinologista da Nova Zelândia.

Eles validaram os trabalhos dos Billings e prosseguiram as pesquisas com eles. O professor Brown e sua equipe estudaram mais de 850.000 ciclos femininos.

O método foi reconhecido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 1978.

Ele se baseia na observação do muco cervical da mulher, que permite detectar com precisão a ovulação, bem como os períodos de fertilidade e infertilidade.

Cada mulher tem um padrão de muco próprio, que, além disso, pode variar de um mês para outro. O método Billings não é algo padronizado, ele se adapta ao perfil único de cada mulher.

– O método Billings é reservado aos católicos?

Assim como o muco feminino (que não é especialmente católico!), o método Billings é universal. Sobretudo porque é gratuito e, portanto, acessível aos mais pobres. É indicado também para analfabetas. Ele se destina a todos os casais que buscam um método de regulação natural fiável.

Como muitas iniciativas promovidas pela Igreja, ele supera o limite dos Estados e das religiões. A China é um exemplo disso: lá foram abertos muitos centros Billings a pedido do governo comunista em 1995, após constatar sua eficácia.

– O maior obstáculo é a abstinência sexual durante os períodos de fertilidade da mulher?

Na sociedade atual, a abstinência pode parecer difícil de se propor e de se viver.

É preciso levar em consideração, em primeiro lugar, que a observação do muco permite que o casal faça sexo frequentemente durante o ciclo, especialmente em sua segunda parte, ou seja, depois da ovulação.

Além disso, a abstinência beneficia o casal. John Billings fala dela como uma “doce disciplina”, que permite que as pessoas cresçam, tornando-as mais responsáveis.

Outra incidência: favorece-se o diálogo. A mulher também se sente mais amada. Um padre médico me disse que, entre os casais que praticam a abstinência, é visível o respeito entre os cônjuges.

– E o prazer?

Quando a pessoa faz sexo após um período de espera, o prazer é mais intenso. Os casais que seguem o método Billings fazem mais sexo e sentem mais plenitude sexual que os casais nos quais a mulher toma a pílula, pois ela diminui a libido. Constata-se também que há menos divórcios entre os primeiros.

– Você apresenta um quadro idílico! O que dizer dos que afirmam que o desejo sexual é mais forte justamente nos momentos em que a pessoa não pode fazer sexo?

É verdade que a libido da mulher é maior no momento da ovulação, que prepara seu corpo para uma concepção possível. Mas a experiência demonstra que a espera faz a libido aumentar.

– O que dizer às pessoas que viajam muito a trabalho? Não se poderia, então, usar o preservativo?

Um oficial da marinha me disse certa vez: “Se eu fiquei ausente 3 meses, não me custa esperar mais 5 dias para fazer sexo com a minha esposa, se ela está ovulando quando chego de viagem…”

Há mil maneiras de expressar o amor: palavras, carinho, sair juntos…

Com relação ao preservativo, segundo as estatísticas publicadas na França e nos Estados Unidos, ele tem um nível de fracasso de 14%.

– Quais são os ingredientes para que o método Billings “funcione”?

É necessário que o marido ame sua esposa pelo que ela é, e não pelo prazer que ela pode lhe dar. Muito além da motivação e do rigor necessários, o sucesso do método se baseia no diálogo entre o casal.

– Após o sínodo da família, de outubro de 2014, e a beatificação de Paulo VI, poderíamos dizer que o método Billings tem um futuro promissor?

Sim, porque as mulheres estão muito cansadas de ser “libertadas” por todo tipo de pessoas que lhes impõem uma libertação falsa.

Também suportam todos os meses a anticoncepção, que parece uma falta de sentido em uma época na qual se promove cada vez mais a ecologia.

Quando Paulo VI escreveu a encíclica “Humanae vitae” (que comemorará seus 50 anos em 2018), ele foi muito criticado. Mas o tempo lhe deu razão. Não foi por acaso que ele foi beatificado no último dia do sínodo da família (19 de outubro de 2014), já que ele tratou deste tema tão delicado.

Dois jovens, a mesma doença, diferentes escolhas… qual a melhor lição sobre a dignidade da vida?

philip x brittany

Seminarista responde a jovem que recorreu à morte assistida: “Eu sinto por ela e entendo sua difícil situação, mas nenhum diagnóstico justifica o suicídio”

No último mês, a história da norte-americana Brittany Maynard ganhou as manchetes e os noticiários do mundo inteiro. Diagnosticada com um glioblastoma multiforme – a forma mais agressiva e letal de câncer de cérebro –, a jovem de 29 anos de idade publicou um vídeo na Internet, anunciando a sua decisão de morrer [1]. Para conseguir o “direito” de fazê-lo, Brittany se mudou da Califórnia para o Oregon, onde o “suicídio assistido” é permitido para pacientes terminais.

Mesmo afirmando que a sua escolha poderia ser adiada, no último dia 1º de novembro, Brittany pôs fim à própria vida. “Adeus a todos os meus queridos amigos e parentes que amo”, escreveu ela no Facebook, horas antes de morrer. “Hoje é o dia que escolhi partir com dignidade diante de minha doença terminal, este terrível câncer cerebral que tirou tanto de mim… mas que poderia ter tirado muito mais”. Os últimos dias da vida de Brittany foram dedicados a uma campanha pela legalização do “suicídio assistido”, chamado eufemisticamente de “morte com dignidade”.

Em inglês, a expressão utilizada pelos veículos de comunicação e pelos adeptos da campanha é “death-with-dignity”. Deste modo, a modernidade tenta abrandar, com palavras bonitas, aquilo que é intrinsecamente mau e condenável – como se a alteração das palavras pudesse mudar a substância das coisas. O “suicídio assistido”, por mais que se queira pintá-lo com novos nomes, é o que é: um suicídio, “o mal extremo e absoluto; a recusa de interessar-se pela existência; a recusa de fazer um juramento de lealdade à vida”. Como bem escreve Chesterton, “o homem que mata um homem, mata um homem”, mas “o homem que se mata, mata todos os homens; no que lhe diz respeito, ele elimina o mundo” [2].

Quando se condena com veemência a atitude de Brittany, não se pretende ignorar ou menosprezar o sofrimento pelo qual a jovem passou após descobrir o tumor no seu cérebro. As pessoas e famílias que lidam dia a dia com o drama do câncer – e de qualquer outra enfermidade – sabem que não é nada fácil enfrentar a doença e, principalmente, as suas consequências espirituais, que tocam as profundezas da existência humana. A opção da jovem norte-americana, no entanto, mais do que um “não” ao sofrimento, trata-se de um “não” à própria existência e à dignidade humana. E o pior é que tudo isso recebe o amparo do Estado, como se a liberdade humana fosse onipotente e intocável, até mesmo quando destrói e degrada a si mesma.

A Igreja, ao assumir o papel profético de defesa da vida, não fica à margem do mistério da dor e da morte. O Papa São João Paulo II, em 1984, por meio da carta apostólica Salvifici Doloris, procurou perscrutar o “sentido do sofrimento”, que ele classificava como uma experiência “quase inseparável da existência terrena do homem”. Na ocasião, o Papa afirmava que, pela Cruz, “o homem está (…) ‘destinado’ a superar-se a si mesmo” e que “o Amor é ainda a fonte mais plena para a resposta à pergunta acerca do sentido do sofrimento” [3]. De fato, nos anos finais de seu pontificado, após a entrada no terceiro milênio, ele mesmo enfrentaria com coragem a cruz de uma doença, a qual, vivida com amor e entrega a Deus, elevá-lo-ia à honra dos altares.

A santificação do sofrimento, no entanto, não é uma obra restrita ao Papa ou a um ou outro membro do clero, mas um chamado pessoal a todos os cristãos. Quando Brittany prenunciou ao mundo o seu suicídio, em outubro, o jovem Philip Johnson, seminarista da Diocese de Raleigh, na Carolina do Norte, respondeu à sua iniciativa com um bonito artigo, publicado na Internet [4]. A sua história, muito parecida com a de Brittany nos detalhes – também ele foi diagnosticado com um câncer terminal no cérebro, com apenas 24 anos de idade –, tem, todavia, um final bem diferente.

Quando descobriu o câncer, Philip servia como oficial da marinha norte-americana no Golfo Pérsico. “Recordo o momento em que vi as imagens computadorizadas dos scanners cerebrais. Fui à capela da base e caí no chão chorando. Perguntei a Deus: ‘Por que eu?’”. Depois de consultar os médicos, ele foi informado de que perderia gradualmente o controle de suas funções corporais – “desde paralisia até incontinência” – e que muito provavelmente também as suas faculdades mentais desapareceriam.

Ele conta, porém, que nada disso o faria procurar o chamado “suicídio assistido”. “Eu acho que ninguém quer morrer dessa maneira”, declara. “A minha vida significa algo para mim, para Deus e para a minha família e amigos, e, salvo uma recuperação milagrosa, continuará significando muito, mesmo depois de paralisado em uma cama de hospital”.

O seminarista reconhece a tentação de Brittany de acabar com a sua vida “por seus próprios termos”, mas não pode aceitar a sua decisão. “Eu concordo que o seu estado é duro, mas a sua decisão é tudo, menos corajosa”, afirma. “Eu sinto por ela e entendo sua difícil situação, mas nenhum diagnóstico justifica o suicídio”.

Philip também assegura que, com sua doença, pôde experimentar “incontáveis milagres”. Ele aprendeu, sobretudo, que “o sofrimento e a dor de coração, que fazem parte da condição humana, não devem ser desperdiçados ou interrompidos por medo ou procurando controle em uma situação aparentemente incontrolável”. “Não procuramos a dor em si mesma – explica Philip –, mas o nosso sofrimento pode ter grande significado se tentamos uni-lo à Paixão de Cristo e oferecê-lo pela conversão ou intenções dos outros”.

Mesmo passando por momentos de grande dificuldade, Johnson mantém a confiança em Deus e segue em seus estudos para tornar-se padre. “Ainda fico triste, ainda choro”, escreve. “Ainda peço a Deus que mostre a Sua vontade através de todo este sofrimento e me permita ser Seu sacerdote (…), mas sei que não estou sozinho no meu sofrimento”.

Eis o exemplo de quem se configurou à redenção de Cristo e, com isso, deu sentido ao próprio sofrimento. Que Deus tenha misericórdia da alma de Brittany Maynard. E que todos os que sofrem ouçam, com esperança, o apelo de Nosso Senhor: “Vinde a mim, vós todos que estais aflitos sob o fardo, e eu vos aliviarei. Tomai meu jugo sobre vós (…), porque eu sou manso e humilde de coração e achareis o repouso para as vossas almas. Porque meu jugo é suave e meu peso é leve.” [5].

 

  1. The Brittany Maynard Fund – YouTube
  2. Ortodoxia, V, p. 76
  3. Salvifici Doloris, 2. 3. 13
  4. Dear Brittany: Our Lives Are Worth Living, Even With Brain Cancer | Diocese of Raleigh
  5. Mt 11, 28-30

 

Fonte: Equipe Christo Nihil Praeponere

Eu fui estuprada durante uma viagem de negócios. Mas meu marido e eu escolhemos a vida

Em janeiro passado, durante uma viagem a negócios, eu fiquei hospedada em um pequeno hotel de uma cidade universitária. Acho que, geralmente, sou mais cuidadosa com o que acontece ao meu redor, mas havia tanta neve e vento que eu não teria ouvido os passos dele nem sequer se ele viesse pisando com força. Aconteceu tudo muito rápido. A porta foi aberta, eu me virei para fechá-la e lá estava ele. Um homem corpulento. Meu primeiro instinto não foi de medo, mas de confusão. No instante seguinte, ele me deu um soco no rosto. Eu não me lembro de ter sido arrastada do quarto, mas fui encontrada na escada. Não sei por quê. Talvez eu tenha tentado correr e pedir ajuda.
Os exames depois do estupro deram negativo para HIV, gonorreia, clamídia, sífilis, herpes e dezenas de outras coisas das quais eu nunca tinha ouvido falar. Deus é misericordioso.

No mês seguinte, eu estava escalada para trabalhar em um navio de cruzeiro. No segundo dia, tive uma disenteria e não melhorei com os antibióticos. Fui levada para um hospital quando ancoramos em Cartagena, Colômbia. Passei por um ultrassom para averiguar se havia alguma obstrução intestinal. Foi quando descobrimos que, dentro de mim, existia algo do tamanho de uma ervilha.
Era o meu filho.

De novo a bordo do navio, contei aos médicos uma versão abreviada da minha história, o que os levou a me colocar em quarentena. Medo de suicídio? Risco de um surto psicótico que me fizesse correr nua pelo navio? Quem vai saber… O que eu sei é que passei a semana seguinte ouvindo uma equipe muito bem intencionada de médicos e enfermeiras me consolando e dizendo o quanto seria “fácil lidar com isso”. Traduzindo: seria “fácil” matar o bebê e “seguir a vida”. Fácil???

Muitas coisas foram discutidas naquela semana em vários telefonemas transatlânticos para casa, cheios de ruídos na linha e de lágrimas no meu rosto, mas aquela tal possibilidade de “lidar com isso” nunca saiu dos meus lábios. Nem do meu marido. Quando eu disse a ele que estava grávida, ele respondeu com a voz calma e firme: “Certo… Certo… Está tudo bem. Está tudo bem, ok?”.

Perguntei: “O que você quer dizer com tudo bem?” 200466079-001

“Eu quero dizer que nós vamos conseguir. Nós vamos passar por isso. Vai ficar tudo bem. E… Eu amo bebês. Nós vamos ter outro bebê! Meu amor, isto é um presente. É algo maravilhoso, que veio de algo terrível. Nós vamos conseguir!”.

E eu comecei a sentir a movimentação da alegria pela vida nova que se desenvolvia no meu ventre, florescendo sob o meu coração! Esse novo amor cresceria com tanta garra que acabaria com qualquer hesitação ou angústia. E o meu marido estava certo: nós íamos conseguir!

Na minha última manhã a bordo do navio, eu disse àquela equipe solidária: “Se alguma vez vocês pensarem neste assunto, se algum dia vocês se perguntarem o que aconteceu comigo, saibam que eu tive um lindo bebê em outubro de 2014″. A reação deles… os olhares em seus rostos… A médica que tinha me empurrado o aborto com mais veemência do que os outros… Ela tinha lágrimas nos olhos. Pela primeira vez, eu pensei que Deus iria saber o que fazer com aquilo, com aquele pesadelo que eu tinha sofrido.

Eu moro na Carolina do Norte, nos Estados Unidos. O doutor que fez o parto dos meus dois filhos estava concorrendo nas primárias republicanas para o Senado. Ele tem que responder às pessoas o tempo todo sobre aquela questão infalível: “E em casos deestupro?”.

Bom, no meu caso, o meu filho vai ter voz. Mas até ele poder usá-la, é responsabilidade minha e privilégio meu falar por ele.

Durante a gravidez, eu entrei e saí do hospital uma série de vezes. Fiquei mais dentro do que fora. Tive pré-eclâmpsia e pressão arterial elevada. Foi aterrador quando, na 26ª semana, eles me disseram que provavelmente eu teria que dar à luz naquela noite. Aterrador porque eu queria desesperadamente que o meu filho vivesse! Mas nós conseguimos atravessar todo aquele susto. Eu precisei ficar em repouso absoluto, mas pelo menos estava em casa. Cada semana depois disso foi ainda mais incrível, com a expectativa do quanto eu ficaria feliz quando ele finalmente chegasse aos meus braços em segurança. Na parte emocional, eu estava indo muito bem.

Tínhamos uma equipe de médicos muito abençoada. Tudo é questão de confiar plenamente. Não era algo novo. Eu tinha me sentido completamente fora de mim desde aquela violência sofrida em janeiro. O meu mundo tinha sido abalado e não voltaria a ficar bem até que o meu filho nascesse. Mas tudo aquilo me livrou da atitude arrogante e autossuficiente de dizer a Deus: “Está tudo bem, eu encaro isso”.
O nosso pequeno menino pode ter sido concebido num ato de violência, mas ele é um dom de Deus, um presente delicioso que preencheu em nossa família uma lacuna que eu nunca tinha percebido que existia. Ele nos tornou completos!

Eu me sinto profundamente grata por ter entrado em contato com outras mães que também engravidaram depois de sofrer um estupro. Nós somos sobreviventes. Não somos apenas vítimas. E foi o meu filho quem me curou.

A pressão da comunidade médica para abortar me abriu os olhos de uma forma impactante. Eles me disseram muitas vezes o quanto seria “simples” e rápido “lidar com isso” e “seguir a vida” depois que tudo “aquilo” tivesse acabado. Era de partir o coração ter que ouvir isso vezes e mais vezes. Mesmo alguns amigos achavam que ter o bebê era um erro, que eu não seria capaz emocionalmente.

Mas toda vez que nós, mães sobrevivente de estupro, compartilhamos as nossas histórias, saímos mais fortalecidas e fortalecemos os outros. Afinal, quantas vidas podem ser poupadas quando se conta com esse apoio e com essa coragem?

Fonte: Aleteia