A arte de desenhar pessoas manipulando seu DNA, uma arrogância potencialmente desastrosa

 

Na última semana, pesquisadores chineses editaram, pela primeira vez, genes de embriões humanos. A prática levanta questões éticas fundamentais. A principal: é seguro criar mutantes cujas sequências genéticas são selecionadas em laboratório e, assim, desafiar a natureza?

Em um laboratório de cidade chinesa de Guangzhou foram criados os primeiros embriões humanos geneticamente modificados. Em tubos de ensaio, pesquisadores da Universidade Sun Yeat-sen manipularam o DNA das células para apagar o gene da beta talassemia, doença hereditária que origina anemias graves e pode ser fatal. É a primeira vez na história que a ciência intervém nas próximas gerações humanas de modo tão rápido e direto. Os chineses mostraram ao mundo que, em poucos anos, teremos o poder de modificar nossa espécie de maneira irreversível – para o bem ou para o mal. O que fará com que a interferência humana supere de vez o processo natural de seleção natural. Não seria mais a natureza, mas os cientistas, que definiria como viriam a ser as futuras gerações de animais, plantas e indivíduos.

O estudo com os detalhes do experimento, publicado em 18 de abril na obscura revista Protein & Cell, revelou que apenas uma mínima fração dos embriões foi bem-sucedida na manipulação. O resultado foi um “mosaico genético”, ou seja, o DNA apresentou várias alterações que não as visadas pelos cientistas. Para esses primeiros estágios das células, isso pode ser mortal. No entanto, de acordo com os especialistas, esse é um obstáculo que está prestes a ser superado. Com o avanço das pesquisas e da tecnologia, a técnica será aperfeiçoada a ponto de possibilitar a edição completa dos genes em embriões humanos.

Esse é mais um indício de que vivemos um momento crucial para o que alguns cientistas chamam de Antropoceno, a era em que as ações humanas são responsáveis pela alteração do planeta. Outra prova recente: na última semana, cientistas da Universidade Harvard, nos Estados Unidos, inseriram o DNA do mamute em células vivas de um elefante, tornando muito próxima a volta do animal que foi, naturalmente, extinto. O experimento dos cientistas chineses sugere que, em um futuro próximo, além de intervir em espécies de animais e vegetais e escolher indiretamente algumas características interessantes para nossa permanência no globo, atuaremos de maneira certeira e definitiva na seleção natural humana. A questão é se antes superaremos as discussões éticas relativas à prática e se estamos preparados para suas consequências.

É uma nova era para a biomedicina. Só que ainda não se sabe se o esforço humano em controlar seu destino genético causará benefícios ou danos”, definiu o biomédico americano George Daley, da Universidade Harvard.

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