Estabelecer políticas educacionais oficiais de estímulo à masturbação não é uma boa ideia

Isto, além de violar o direito à intimidade, a liberdade sexual e religiosa, ainda desconsidera o pudor, a castidade que advém de um genuíno sentimento de respeito próprio ou de delicadeza pessoal de quem vê a sexualidade como um dom a ser compartilhado responsavelmente com um cônjuge, no interior de uma relação afetiva estável e consequente, e não esvaída em brincadeiras egoístas e autocomplacentes

Paulo Vasconcelos Jacobina |  03 de Dezembro |  ZENIT.org |  Análise |  Brasília |  40
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Hoje pela manhã, enquanto eu estava trabalhando, recebi um telefonema de um amigo, professor de ensino médio aqui no Distrito Federal, que queria me falar sobre uma certa proposta de inserir informações sobre a masturbação nas agendas estudantis a serem distribuídas aos estudantes da rede pública para o ano de 2016. Diante do meu espanto, ele me passou o arquivo em PDF por e-mail. O arquivo que ele me enviou estava devidamente redigido e formatado, com todos os logotipos governamentais, pronta para, eventualmente, ser encaminhada à produção e distribuição.

Relutei muito em transcrever o material que ele me transmitiu, mas, diante do fato de que a ideia ali contida é a de que algo assim seja um dia distribuído aos nossos pré-adolescentes e adolescentes, é importante que nós saibamos exatamente de que se trata. Peço a compreensão do leitor.

Eis o texto que ele me enviou, sobre masturbação feminina:

“Masturbação feminina. Sabe aquelas horas que você tira para se conhecer? É natural e permite um maior conhecimento do corpo. Feita com cuidado não machuca. É importante explorar a região da vagina e toda a área pubiana de forma tranquila e relaxada, descobrindo o que lhe dá mais prazer. Ah! Mãos e unhas limpas são fundamentais. Sujeirinhas indesejáveis podem causar infecções mais indesejáveis ainda. Sabe o que é isto? Masturbação feminina.”

O texto sobre masturbação masculina enviado por ele é assim:

“Eu comigo mesmo. Sabe aquelas horas que você tira para se conhecer? É natural e permite um maior conhecimento do corpo. Não cria cabelos nem calos nas mãos. O que pode acontecer em masturbações frequentes ou intensas é irritação na pele do pênis (ele literalmente fica um pouco esfoliado) e diminuição na quantidade de esperma ejaculado. O esperma, contudo, é constantemente renovado pelo organismo. Por isso o homem não corre o risco de ficar estéril (incapaz de ter filhos) ou com o esperma “ralo”. Sabe o que é isto? Masturbação masculina”.

Perguntei ao meu amigo professor qual objetivo educacional se quer atingir, ao pleitear que se publique, com dinheiro público, e se distribua, por meios oficiais, a pré-adolescentes e adolescentes um material assim. Qual seria exatamente o objetivo pedagógico? Combater, em plena escola, o pudor e a castidade que alguns jovens têm de discutir publicamente suas práticas íntimas? Expor estes jovens ao bullying por terem estes sentimentos de pudor ou princípios religiosos? Arrancar deles estes sentimentos, que algum educador ou profissional da saúde considere inadequados para a contemporaneidade? Ou talvez parta de visão, sem qualquer fundamento científico, de que valorizar a prática de sexo solitário reduziria as doenças sexualmente transmissíveis. O que seria contraditório: estimular alguém a despertar precocemente para o sexo não parece ser exatamente uma medida inteligente para reduzir a respectiva atividade sexual.

Fiz estas ponderações a ele. Há, neste texto, além de toda a inconveniência de lidar com valores morais que não estão entregues ao governo, mas aos jovens e às suas famílias, certamente uma falácia lógica, a de que, se as consequências clínicas e físicas da masturbação não são graves nem permanentes, então nenhuma outra objeção de ordem moral, educacional ou mesmo religiosa à prática seria válida. Mas isto é tão evidentemente falso que se faz desnecessário reafirmá-lo.

Imagino que tipo de mensagem um texto assim passaria, por sob suas palavras, quando dirigido diretamente aos jovens em material oficial do governo. Cito algumas: seria uma mensagem impícita às famílias de que elas não têm o direito de transmitir seus próprios princípios aos seus filhos, ou seja, que eventualmente as restrições morais ou religiosas ao vício da masturbação que as famílias tiverem são consideradas presumidamente inválidas pelo governo. Aliás, haveria também a mensagem implícita de que o julgamento moral da conduta sexual cabe à autoridade pública de educação ou de saúde. E é claro que, sendo esta autoridade tão libertária em matéria de promoção de prazeres sexuais, não é difícil imaginar quão facilmente isto seria introjetado pelos jovens.

Outra consequência implícita é passar a mensagem de que é lícito ao governante estabelecer os critérios morais sexuais, impondo-os coativamente à população, com uso de dinheiro público, à exclusão de quaisquer outros que as famílias, líderes religiosos ou sociais, conselheiros e orientadores possam ter. Ademais, o Estado estimularia os jovens a “gastar horas” para “se conhecer” (ou seja, a expressão eufemística para masturbar-se) como atividade pedagogicamente pelo menos tão importante quanto estudar matemática ou física, a ponto de merecer conselhos de encorajamento da autoridade educacional. Como consequência, argumento, será que a rede pública de educação estaria legitimada a, por exemplo, promover sessões escolares de “autoconhecimento sexual” em que os jovens tirem, na prática e reciprocamente, suas dúvidas sobre como sentir mais prazer sexual masturbatório, assistidos por algum professor ou agente de saúde?

Se esta proposta fosse acolhida e divulgada, seria, além disso, muito desrespeitosa com todas as famílias que têm valores divergentes em matéria de pudor sexual, independentemente dos princípios religiosos que possam ou não professar. Seria desrespeitoso também com o direito das famílias de educar moralmente seus filhos de forma livre. Seria desrespeitoso, no limite, com os artigos do Estatuto da Criança e do Adolescente que criminalizam a promoção e divulgação pública de práticas sexuais com ou para crianças e adolescentes. Seria implicitamente ofensivo à liberdade religiosa, de opinião e de intimidade dos próprios jovens. E tudo isto, segundo está proposto, partiria do Poder público, com dinheiro público, na rede pública de educação. Dinheiro que advém do trabalho honesto de uma população cujos valores morais majoritários são, arrisco dizer, majoritariamente diferentes daqueles que fundamentam uma proposta assim.

Portanto, eu disse a ele que não consigo atinar com a razão para pleitear a aprovação de tal proposta. Não pode ser a simples pretensão de ensinar a prática da masturbação aos jovens. Isto, ressalte-se, já seria ruim o suficiente. Mas reconheçamos que seria desnecessário: todas as gerações que nos antecederam foram capazes de chegar até estas práticas sozinhas, e de modo bem eficaz, sem ajuda oficial da rede de ensino e do dinheiro público. Na verdade, o que se transmitiria aqui seria a ideia de que a “repressão” sexual parental não somente é ilegítimo, como tem falsos fundamentos, minando a confiança das crianças e jovens na capacidade das famílias de orientá-las bem. A ideia de que qualquer autoridade parental deve ser objeto de desconfiança juvenil reforça o poder cada vez maior do Estado sobre crianças e jovens, como única instância de discernimento moral (ou, no caso, imoral), que, além disso, se opõe às demais e as deslegitima. Haveria, no limite, a mensagem de que simplesmente é inaceitável, para o Estado, que algum jovem tenha algum tipo de sentimento de pudor ou castidade para com o próprio corpo. É como se todo pudor, toda castidade, viesse apenas de preconceitos e tabus que devem ser quebradospor atuação estatal positiva.

Mas isto é absurdamente falso. É evidente que existe um pudor, uma castidade que advém de um genuíno sentimento de respeito próprio ou de delicadeza pessoal de quem vê a sexualidade como um dom precioso demais, a ser compartilhado responsavelmente com um cônjuge, no interior de uma relação afetiva estável e consequente, e não esvaída em brincadeiras egoístas e autocomplacentes. Isto parece ter sido esquecido na contemporaneidade, que cultiva o pensamento de que o mal do mundo não está nos comportamentosdesordenados, mas na culpa que eles provocam, culpa que alguns estudiosos e filósofos imputam à cultura judaico-cristã. Para destruir o mal, pensam eles, não se deve ensinar os jovens a ordenar seus comportamentos, de modo a torná-los dignos de orgulho e louvor e não de culpa; eles propõem simplesmente eliminar a cultura judaico-cristã, de modo que todos possam fazer o que bem entenderem sem que sintam culpa. Estão errados. Os problemas de consciência que são causados pelas práticas desordenadas não se resolvem pela eliminação da própria consciência, mas da ordenação da conduta. O mal não está na culpa, mas na conduta que a gera. Eliminar a culpa sem examinar a conduta em si não faz a humanidade mais feliz. Apenas a faz mais psicopática.

Por fim, eu ponderei com meu amigo, há algum motivo para que todas as culturas, em todos os tempos, terem considerado a masturbação como uma prática menor, imatura,egoística e fechada, a ser superada em prol do desenvolvimento de relações afetivas saudáveis, envolvimento amoroso e responsável com o outro, o que representa a maturidade sexual humana. É por isto, por representar uma incompletude individualista, uma fixação narcisista que não aperfeiçoa ninguém, que a masturbação, mesmo quando foi (em raríssimas situações e culturas) em algum grau tolerada, nunca foi promovida por nenhuma cultura, povo, religião ou nação como comportamento a ser fomentado e estimulado publicamente, como política de Estado para crianças e adolescentes, como este texto propõe. É por tudo isto, por embutir desrespeito à intimidade, à liberdade sexual e religiosa, ao direito das famílias de estabelecer seus próprios standarts morais sem intervenções indevidas do Estado, que uma proposta assim não deve ser aprovada. E não porque provoque “calos” ou “pelos”, “infertilidade” ou “infecções”. Não se trata de moralismo, mas de ter critérios para educar. Educar significa conduzir, e conduzir significa levar para fora de si, para aabertura saudável ao outro, não para o fechamento narcisista e autocomplacente da masturbação. Tal fechamento, conduz, isto sim, do melhor para o pior, do mais perfeito para oimperfeito. Significa, também, estabelecer coordenação e parceria entre os atores sociais, e não a presunção de ilegitimidade e desconfiança recíproca entre eles. Isto tudo é ocontrário exato de educar.

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