Entrevista com Mons. Vitaliano Mattioli, missionário italiano no Brasil
Por Thácio Siqueira
BRASILIA, quinta-feira, 09 de agosto de 2012 (ZENIT.org) – O Anteprojeto do Novo código penal Brasileiro propõe algumas mudanças que, praticamente, descriminalizará a prática do aborto no Brasil. ZENIT, portanto, conversou dessa vez com Mons. Vitaliano Mattioli, que nos fala sobre como se aprovou o aborto na Itália e as suas consequências funestas para a vida da mulher e de toda uma nação.
Mons. Vitaliano Mattioli, nasceu em Roma em 1938, realizou estudos clássicos, filosóficos e jurídicos. Foi professor na Universidade Urbaniana e na Escola Clássica Apollinaire de Roma e Redator da revista “Palestra del Clero”. Atualmente é missionário Fidei Donum na diocese de Crato, no Brasil.
Publicamos hoje a primeira parte da entrevista. A segunda parte será publicada amanhã, sexta-feira.
***
ZENIT: O senhor é missionário no Brasil há 2 anos e veio de uma nação, Itália, que tem um forte movimento a favor da vida. O aborto foi aprovado na legislação da Itália?
MONS.VITALIANO: O aborto foi aprovado na Itália pela lei n. 194 do 22 de maio de 1978. Na sequência o Movimento Pro Vida promoveu um referendum para a revogação (17 de maio de 1981). Lembro-me da campanha muito acalorada a favor e contra o aborto. O resultado foi que a lei a favor do aborto foi confirmada. Não devemos esquecer a influência que teve a aprovação desta lei na França, no dia 17 de janeiro de 1975. Um importante papel tiveram os Partidos laicistas e especialmente o Partido Radical. Na campanha, a lei foi apresentada de uma forma muito ambígua: para evitar o flagelo do aborto clandestino apresentaram o aborto legal como a única solução. Eram os primeiros anos depois do Concílio. A grande desorientação que se vivia naquele período, também no mundo católico, influenciou muito essa decisão.
ZENIT: Qual é a visão dos católicos italianos e da sociedade italiana sobre o aborto?
MONS.VITALIANO: Hoje, depois de 34 anos, a situação é diferente. Há uma outra sensibilidade. Mas remover esta lei é muito difícil. Embora a verdadeira Ciência afirme sempre mais claramente que a vida começa a partir da concepção, é difícil remover uma opinião pública. Individualmente, as pessoas são mais críticas do que antes, mas há muitos interesses que impedem a revogação desta lei. Há especialmente o pansexualismo, os chamados direitos sexuais, o sexo fácil, a ideologia do Gênero que infelizmente é promovida pelos mesmos Órgãos da ONU, que formam uma mentalidade distorcida, que não escuta a razão, com a condição de continuar a viver uma vida sem regras éticas. Não devemos esquecer a forte luta contra a Igreja, que defende o direito à vida como o primeiro dos direitos. Muitos dos Meios de Comunicação social são organizados para orientar a opinião pública em favor da liberdade sexual total.
ZENIT: Na sua experiência de guia familiar, o que acontece com um casal que resolve abortar por motivos econômicos?
MONS.VITALIANO: O aborto, por qualquer motivo, sempre deixa uma marca profunda. As diferentes situações, por exemplos as econômicas, podem diminuir a responsabilidade do casal, mas não tocam na gravidade do ato. Sabe-se, contudo, que a situação económica não é a causa principal e a maioria dos abortos não acontece por este motivo. É só pensar na quantidade de adolescentes que a cada dia abortam. E este número aumenta continuamente. Não têm razões econômicas. O trauma é sempre muito grande. As vezes não se nota imediatamente, mas sim depois de muitos anos. Especialmente se o aborto foi realizado em uma idade jovem, com grande inconsciência e irresponsabilidade. No começo aciona-se um sistema psicológico de proteção mas em seguida, com o tempo, e uma maior maturidade, a mulher toma consciência e se envolve num sentimento de culpa que permanece por toda a vida. Pessoalmente conheci mais de uma pessoa octogenária que comentou com muita tristeza: eu matei meu filho porque quando era jovem pratiquei um aborto.
ZENIT: Existe alguma circunstância extrema na qual a Igreja permita abortar?
MONS. VITALIANO: A Igreja deve ser coerente com a doutrina expressa pela lei natural e afirmada na Sagrada Escritura: cada vida humana é sagrada desde a concepção até a morte natural. Esta firmeza na doutrina é muitas vezes confundida com uma falta de sensibilidade, de respeito, e de compreensão da Igreja para com a mulher. Não é assim. Quando a Igreja condena o aborto se refere ao fato de abortar, que é sempre intrinsecamente ilícito. Nunca a Igreja tem falado contra a mulher que infelizmente teve um aborto. A Igreja é uma mãe que compreende as situações humanas, a fraqueza e os condicionamentos sociais. Tudo isso pode diminuir a responsabilidade da mulher, mas não pode alterar o juízo ético negativo sobre a ação cometida. A Igreja segue a pedagogia aplicada por Jesus. No Evangelho de João, à jovem adúltera, o Mestre respondeu: “Ninguém te condenou? Nem eu te condeno. Vai, mas de agora em diante não peques mais” (João 8, 11). Jesus, compreendendo as diversas circunstâncias, perdoou a jovem mas ao mesmo tempo a fez compreender que a sua atitude estava errada e que não deveria nunca mais repetí-la.