Este texto, escrito em 2001, é o testemunho de uma mãe de família católica que, preocupada com a formação moral de seus filhos e havendo passado por uma experiência com o mundo do ocultismo, quer alertar as famílias para os males da magia e da feitiçaria, principalmente quando a cultura ao nosso redor tende a ridicularizar a oposição a essas práticas como exagero ou até mesmo “fanatismo”.
Não se trata propriamente de um “anátema” aos livros de Harry Potter, mas sim de um convite a refletir sobre a educação que damos a nossos filhos e as influências a que os deixamos expostos — e é com esse espírito que gostaríamos que todos lessem este texto, pois o que está em jogo aqui, mais do que a avaliação de uma obra de literatura (hoje, aliás, não tão em alta quanto alguns anos atrás), é a salvação das almas de nossas crianças.
A matéria original em inglês, de autoria de Toni Collins, foi adaptada aqui e ali para esta publicação.
Harry Potter: você por acaso se lembra de quando ele entrou na sua vida? Notou que crianças que mal conseguiam concentrar-se na leitura de uma carta de Pokémon eram capazes, de repente, de ler por horas a fio? Seus filhos repentinamente vinham da escola para casa contando, entusiasmados, histórias de magos e bruxas?
Os livros de Harry Potter, escritos por J. K. Rowling, ganharam milhões de crianças e adultos. Trata-se indiscutivelmente da obra mais rapidamente abraçada pelo público infantil na história. Você teria de se esconder no mais remoto dos eremitérios para evitar de ver os livros, e estar tão isolado quanto para evitar a controvérsia em torno deles.
São abundantes, de fato, as controvérsias, e Harry Potter mexe com as emoções de muitos. Alguns pais se entusiasmam com o fato de seus filhos se dedicarem à leitura pela primeira vez. Eles dizem amar o modo como os livros pintam o bem contra o mal, e usam os livros para ajudar seus filhos a aprender a diferença entre o que é certo e errado. Mas outros pais ficam profundamente perturbados com o assunto tratado pela saga. Eles se preocupam em ver tantas crianças abraçando um mundo de magia e bruxaria.
Quanto a mim, sou uma mãe que se enquadra nesta última categoria. Frequentemente me vejo no desconforto de tentar explicar aos amigos mais queridos o porquê de eu ficar tão incomodada com os livros. Não é fácil dizer a alguém: “Eu sei que você ama esses livros, mas…”.
Quando eu toco nesse assunto, vejo-me obrigada a compartilhar, mesmo que a contragosto, um pouco de meu testemunho antes de ser católica. Mas tem ficado difícil se abrir a respeito do próprio passado, principalmente porque aqueles de nós que passaram pelas mesmas experiências tendem a possuir, também, uma espécie de receio quanto à popularidade de Harry Potter. Apesar de meu incômodo com os livros, tenho de admitir que eles me ajudaram a perceber como um antigo pecado não confessado estava emperrando minha vida.
Astrologia, hipnotismo e bruxaria
Tendo sido batizada em um lar de católicos não-praticantes, passei minha infância frequentando várias igrejas protestantes. Aprendi a fazer minhas orações antes de dormir. Meus pais enfatizavam a educação moral em casa. Eu tinha um sentimento profundo e permanente da presença de Deus em minha vida. Sabia que Ele me amava e sempre soube que podia me voltar para Ele.
Mas, tanto quanto posso me lembrar, pela época em que meus pais se divorciaram, quando eu tinha 14 anos, Deus deixou de ser enfatizado em minha casa. Lembro-me de haver uma ênfase pesada na importância da astrologia para explicar as personalidades das pessoas, um fascínio com adivinhação e uma incrível festa temática do “zodíaco” que eu e minha mãe demos, cheia de luzes ambientes e jogos de levitação para entretenimento.
Não muito tempo depois, fui assistir a um espetáculo de hipnose, que depois comecei a frequentar. O show dava a uma jovem vaidosa como eu a oportunidade de cantar em frente a uma plateia. Considerava a hipnose uma fraude até a noite em que aquele hipnotizador me escolheu para o finale do seu show. Dizendo que meu corpo era “rígido como uma barra de ferro”, ele me fez deitar ao longo de duas poltronas reclináveis e então ficou em cima de mim.
Tê-lo ali, agindo sobre meu corpo aerotransportado, ensinou-me que algo realmente acontece quando você é hipnotizado. Meus amigos cristãos tentaram me dizer que esse “algo” não era saudável para mim espiritualmente, mas eu não dei ouvidos. Eu realmente pensava que não podia me afetar, que tudo não passava de diversão. Mas olhando para trás na minha vida, eu agora posso dizer que o final dos dois anos que eu passei assistindo ao show daquele hipnotizador coincidiu com minha decisão consciente de voltar as costas a Deus.
Consequência direta de ter sido hipnotizada? Provavelmente não. Posso assegurar a você, no entanto, que autorizar alguém a regularmente tomar o controle de minhas escolhas conscientes não fez bem algum à minha fraca vida de fé.
Meus amigos cristãos tentaram me dizer que aquilo não era saudável para mim espiritualmente, mas eu não dei ouvidos.
O evento mais assustador de minha vida aconteceu quando eu me arrisquei a fazer uma bruxaria. Eu cresci como uma menina de poucos amigos e havia me transformado em uma adolescente solitária, sempre à procura de amor. Um dia, escolhi um desses livrinhos que sempre são vendidos nos caixas de supermercados, e esse que comprei era sobre feitiços de amor. Levei-o para casa, tranquei-me no quarto e comecei a lançar um feitiço sobre o meu “namoradinho” da escola. Eu não me lembro das palavras que usei (graças a Deus), mas jamais esquecerei o que aconteceu.
Comecei a lançar o feitiço. Pá! Uma imensa porta preta (como o monólito de Uma Odisseia no Espaço) bateu com força como se viajasse de minha mão esquerda para a direita. “Deus não quer que você faça isso”, disse uma voz bem fundo dentro de mim. Pá! Uma porta tão grande quanto bateu forte na outra direção, e uma voz respondeu: “Tanto faz, Deus não existe”, eu me senti tentada a escutar. Pá! A porta bateu de volta na direção original e uma voz disse, devagar mas com firmeza: “Sim… Ele… existe”.
Coloquei o livro de magia no chão, para nunca mais pegá-lo. Fiquei bastante mexida com aquilo e sabia que havia encontrado algo além deste mundo. A dúvida havia entrado na minha vida pela primeira vez, e eu sabia que poderia ter abraçado um universo sem Deus no instante em que aquela segunda porta bateu. Eu sabia que algo ali queria que eu me afastasse de Deus para sempre, e esse algo teve a sua oportunidade quando eu tomei parte no mundo da bruxaria.
Teria esse ato abortado de bruxaria deixado consequências? Certamente sim. Pouco tempo depois, quando saiu o filme O Exorcista, aquele meu namorado enamorou-se pelo demônio, ao mesmo tempo atraído por ele e desejando ter o seu poder. Eventualmente ele começou a cruzar as ruas de Hollywood procurando por relacionamentos homossexuais, e eu dei fim à nossa amizade.
Eu também senti as consequências, mas elas não viriam à tona enquanto eu não abandonasse a Deus e voltasse a Ele, então, tornando-me católica. A essa altura eu descobri em mim uma incrível sensibilidade para o oculto. Qualquer coisa mesmo que remotamente associada a esse mundo — horóscopos, ler a mão, livrarias de astrologia ou cura através dos cristais — era capaz de me perturbar profundamente. Era como se eu sentisse um “borbulhar” obscuro dentro de minha alma, puxando-me para o preternatural. Eu lutava contra isso rezando pelas pessoas envolvidas em tais práticas e, ao mesmo tempo, protegendo-me de qualquer exposição a coisas desse gênero.
E Harry Potter?
Junto com isso, veio Harry Potter. Fui apresentada a ele quando minha melhor amiga descobriu que a saga havia feito seu filho mais velho gostar de leitura pela primeira vez na vida. Em seguida, Harry Potter já estava em todo lugar, e minha filha de 18 anos estava lendo os livros. Mas eu senti aquele “borbulhar”, e por isso sabia que precisava descobrir se meus medos tinham algum fundamento na realidade.
Muito assustada para ler os livros logo de cara, comecei a ler o que outras pessoas tinham a dizer sobre eles. Comecei a notar um padrão. Dos comentaristas que eu li e que diziam amar os livros de Harry Potter, praticamente nenhum havia passado por uma alguma experiência com o oculto. Para eles, a saga não passava de uma fantasia agradável do mesmo gênero de J. R. R. Tolkien e C. S. Lewis. Em contraste, quase todo comentarista que eu lia e que havia passado por alguma experiência com o oculto achava os livros perturbadores, quase como se eles fossem cartilhas de iniciação à magia.
Por que a diferença de opiniões? Li os primeiros dois livros, Harry Potter e a Pedra Filosofal e Harry Potter e a Câmara Secreta, e cheguei a uma resposta. A maior parte dos livros são, de fato, uma fantasia agradável. A autora, Joanne Rowling, faz cócegas em nossa imaginação com contos de unicórnios, jogos de quadribol e corujas mensageiras.
Mas em meio a esses charmosos retratos encontram-se seções mais tenebrosas, particularmente na parte inicial da educação recebida por Harry. Essa combinação — elementos mais sombrios introduzidos no começo e um acabamento agradável que só pode ser considerado imaginativo — deixa muitos leitores com uma sensação geral boa a respeito dos livros.
Então por que eu senti tal pavor ao ler Harry Potter? Por que outras pessoas que deixam o ocultismo, de modo geral, não gostam dos livros? John Gibson, que se converteu do neopaganismo para o catolicismo e cuja história de conversão encontra-se registrada em Surprised by Truth 2 (“Surpreendidos pela Verdade II”, sem tradução para o português), escreveu-me o seguinte: “Antes e acima de tudo, a maioria das pessoas que se envolveram com o oculto possuem como que uma impressão digital disso em suas almas. Isso nos dá uma espécie de sensibilidade ao oculto que outras pessoas não têm.”
“Uma impressão digital na alma” — era essa a diferença que eu estava vendo entre os leitores que amavam Harry Potter e aqueles de nós que não o fazíamos. Aquela “impressão digital” estava sendo cutucada novamente toda vez que eu lia Harry Potter, e nossas almas iam se remexendo. Nós estávamos reconhecendo coisas com as quais já tínhamos tido contato no passado e que havíamos rejeitado por amor a Deus.
Para esclarecer o que eu quero dizer aqui, permitam-me oferecer apenas algumas histórias de pessoas cujas vidas, em algum ponto, entrelaçaram-se com o oculto e que hoje externam preocupações a respeito de Harry Potter.
“Só existe um tipo de magia”
Clare McGrath Merkle é uma ex-curandeira Nova Era, bem versada no ocultismo e convertida ao catolicismo. Sua preocupação com os livros de Harry Potter é profunda, porque ela reconhece em suas páginas muitas das artes que ela praticava. Ela e suas amigas de ocultismo — psicólogas, médicas e outras profissionais (que também eram feiticeiras e bruxas) — defendiam seus estudos juntas “como sendo da categoria de magia branca, quase como a escola de magia de Harry Potter”, isto é, Hogwarts.
Mas, tendo ela mesma deixado o mundo do oculto para entrar no aprisco da Igreja Católica, ela agora reconhece que, na verdade, só existe um tipo de magia, “conhecida por vários nomes, como magia negra, ocultismo, satanismo ou artes das trevas”.
“O ocultismo é a porta principal pela qual o diabólico entra na vida de uma pessoa.”
Jacqui Komschlies dá um alerta similar: “Nós precisamos lembrar que a bruxaria, na vida real, não só pode como leva à morte — e a morte do tipo eterno”. Por mais de dez anos ela ficou fascinada com o sobrenatural, desenvolvendo um “apetite” pela leitura de histórias de “magos, magia, poder e aventura”. Eventualmente, ela descobriu que o sobrenatural estava tomando controle de seus pensamentos.
Um dia os espíritos, os poderes e as deusas que povoavam até mesmo seus sonhos começaram a falar com ela. Assustada, ela invocou Deus. Ele a resgatou, e as vozes cessaram.
Hoje ela adverte: “Nosso mundo está explodindo de interesse por bruxaria de verdade. Digite ‘Como posso me tornar uma bruxa?’ no Google e você terá listas para dezenas de sites relacionados. Uma matéria chega a trazer um processo de oito passos para se tornar uma bruxa por conta própria.”
Ainda que Vivian Dudro não tenha nenhum passado com o ocultismo, ela partilha das mesmas preocupações de Jacqui sobre o crescente fascínio das crianças com o oculto. Uma pesquisa feita por ela mesma mostra que, “em San Francisco, as histórias de Harry Potter já inspiraram numerosas crianças a procurar outros livros a respeito de bruxas, magos e fantasmas. As livrarias da cidade encheram suas prateleiras de contos juvenis com histórias desse gênero… A tendência me preocupa porque não só se trata de um pecado sério, mas o ocultismo é a porta principal pela qual o diabólico entra na vida de uma pessoa” [3].
“Brincando com fogo… do inferno”
Steve Wood, editor da St. Joseph’s Covenant Keepers, uma comunidade virtual de pais sob o patrocínio de S. José, ponderou sobre o assunto a partir de sua própria experiência com o oculto. Tendo lido os primeiros livros da saga, ele sustenta uma opinião forte a respeito:
Antes de minha conversão ao cristianismo, eu estive envolvido em Nova Era e falsos movimentos religiosos que realmente praticavam várias das coisas casualmente descritas nos romances de Harry Potter… Tenho conduzido jovens do próprio mundo descrito nesses livros a um compromisso com Cristo… Eu pessoalmente confrontei e atendi indivíduos possessos envolvidos com satanismo e ocultismo. À luz dessa experiência, advirto os pais que expor os filhos ao ‘fascinante’ mundo de Harry Potter é brincar com fogo do inferno.
Não são apenas os leigos que se preocupam com Harry Potter. O padre Phillip Scott é um sacerdote que vive perto de uma comunidade de “góticos” na Flórida. Os jovens dessa comunidade praticam “missas” satânicas, vivem o ocultismo e realizam malefícios espirituais, frequentemente amaldiçoando a ele e a seus irmãos no sacerdócio.
O padre Phillip acredita que a entrada nesse estilo de vida horrendo começa com a curiosidade, e ele acredita que livros como Harry Potter podem estimular essa curiosidade. Em uma entrevista com Steve Wood, o padre conta ter atendido um jovem cuja mente estava povoada com imagens dos livros de Harry Potter. O mais assustador é que os livros não haviam sido escritos à época que o rapaz fora atendido; olhando para trás, o padre Phillip reconheceu nas páginas de Harry Potter exatamente as imagens que haviam atormentado aquele rapaz. Para este sacerdote, os livros de J. K. Rowling são um “veneno”.
Feitiços e poções
O que são algumas dessas imagens e quais os seus respectivos riscos? Em seu livro de 1991, Ungodly Rage (também sem tradução para o português), Donna Steichen partilhou esta citação perspicaz de uma ex-praticante da Wicca, Carmen Helen Guerra:
Quando eu era uma bruxa, eu realizava rituais, evocava espíritos e entidades, fazia feitiços, queimava velas e misturava poções. A única coisa que eu não fazia era voar a bordo de uma vassoura, mas eu provavelmente teria descoberto como fazer isso se tivesse tido tempo para tanto. Mas aonde isso me levou? Para a escuridão, a depressão e a criação de uma aura de melancolia ao meu redor. Eu vivia sob constantes ataques demoníacos. A casa em que eu vivia estava cheia de atividades fantasmagóricas… devido a “convidados” de rituais meus que haviam permanecido. Meus familiares e amigos tinham medo de mim. Eu sabia que não tinha futuro; tudo o que eu tinha era um presente sombrio. Eu estava presa por juramentos e pelo “destino”. Mas eu tinha poder, algo que eu sempre quis. Não era culpa de Satanás. “Ele não existia”, assim eu pensava. Eu desisti de tudo, e procurei a Jesus com os joelhos no chão… Ele me libertou da opressão em que eu vivia e devolveu-me a alma — que eu havia tão estupidamente entregado ao mal em troca de poder.
O que isso tem a ver com Harry Potter? Ainda que estejam travestidos com luzes e doçuras, o primeiro livro da série traz rituais (como a “Cerimônia de Seleção”); feitiços (como Hermione lançando o feitiço do “corpo preso” sobre Neville); espíritos e outras entidades não-humanas (Voldemort possui o corpo de Quirrell e há uma miríade de fantasmas em Hogwarts); velas (milhares flutuando sobre as mesas em Hogwarts); e poções (com aulas especiais do professor Snape).
Pode não ser agradável pensar nisso, mas realmente existem pessoas que praticam bruxaria, que lançam feitiços e fazem rituais, e procuram resultados. J. K. Rowling escreve como se esses poderes pudessem ser usados para o bem, e é esse o grande perigo dos seus livros. Rituais, feitiços e poções são usados por bruxas no mundo real, e só funcionam pelo poder de espíritos maus. Em si mesmos, eles não podem jamais levar ao bem. Retratar essas práticas intrinsecamente más como se pudessem ser “domadas” para o bem é uma mentira perigosa.
Rowling fomenta ainda mais confusão a esse respeito por retratar a bruxaria não como um problema moral, mas como uma questão de herança genética. No mundo de Rowling, a habilidade de praticar magia é herdada. Mas, na realidade, você não precisa pertencer a uma determinada linha de sangue para fazer trabalhos de bruxaria. Tudo o que você precisa fazer é atrair maus espíritos, mudar a sua vontade e trocar Jesus Cristo pelo mundo do ocultismo.
Nós temos duas falsidades, portanto, apresentadas às crianças que lêem esses livros: primeiro, que o “status” de bruxos está escrito em seus genes; e segundo, que se eles forem os “sortudos”, podem usar os poderes que têm para o bem. Essas são mentiras nocivas que se aprendem, porque a realidade é muito diferente e nada inofensiva. Basta perguntar às pessoas que se envolveram com isso no mundo real.
O alerta da Igreja
O Catecismo da Igreja Católica afirma de modo inequívoco: “Todas as práticas de magia ou de feitiçaria com as quais a pessoa pretende domesticar os poderes ocultos, para colocá-los a seu serviço e obter um poder sobrenatural sobre o próximo — mesmo que seja para proporcionar a este a saúde —, são gravemente contrárias à virtude da religião. […] A Igreja adverte os fiéis a evitá-lo” (n. 2117).
Essa é uma linguagem forte no Catecismo, a mesma linguagem usada para condenar a luxúria, a fornicação e o aborto. Os católicos não podem em boa consciência menosprezar esse alerta. Se Harry estivesse usando luxúria, fornicação ou aborto para salvar seus amigos em Hogwarts, nós ainda consideraríamos esses livros alimento aceitável para crianças?
Rituais, feitiços e poções são usados por bruxas no mundo real, e só funcionam pelo poder de espíritos maus.
É importante destacar que a bruxaria sobre a qual Rowling escreve contrasta frontalmente com o mundo mágico retratado por Tolkien e Lewis. As boas personagens da Terra Média e de Nárnia não lançam feitiços sobre ninguém, não evocam espíritos, não convivem com eles como vizinhos queridos, não realizam rituais tampouco preparam poções. As boas personagens em Hogwarts, no entanto, fazem todas essas coisas.
Na Terra Média, um anel transporta você para outro mundo e, em Nárnia, relâmpagos aparecem em algum momento crítico para realizar alguma poderosa façanha. Mas em Hogwarts o malvado Voldemort encanta um diário para possuir a alma de uma garota. Essas são diferenças profundas e substanciais, e requerem que vejamos a magia de Rowling sob uma luz bem diferente da “magia” de Tolkien e Lewis.
À primeira vista, Harry Potter parece um nobre garotinho que colocará sua própria vida em risco para salvar seus amigos. Ele defende os fracos, conforta os abatidos e luta contra o mal. Mas eu descobri que ele também tinha uma má propensão a quebrar as regras da escola e a mentir.
De fato, ao fim do primeiro livro, Harry salva o mundo do malvado Lord Voldemort contando covardemente uma mentira. Fazer isso para salvar o mundo pode parecer aceitável à primeira vista, mas temos de lembrar que esta é uma obra de ficção, e a autora poderia facilmente ter encontrado uma forma honesta de Harry salvar o mundo. Uma leitura atenta do segundo livro mostra que mentir, a partir de então, tornou-se muito mais fácil para Harry do que era no primeiro livro. Assim o caráter de Harry vai se enfraquecendo, ao invés de fortalecer-se.
Também me preocupa a forma como Harry é autorizado a evitar a devida disciplina. Ele é famoso e talentoso, uma celebridade. Várias vezes, tanto no primeiro quanto no segundo livro, quando Harry quebra as regras da escola, ou ele é esperto o suficiente para se safar ou artificioso o bastante para não ser castigado.
Repetidamente ameaçado com expulsão, ele é sempre perdoado. No pior de todos os casos, ele é ameaçado com expulsão de Hogwarts se voar em sua vassoura. Mas quando ele de fato o faz, e com grande talento, ele na verdade é recompensado com uma posição privilegiada no time de quadribol da escola.
Como muitos heróis do esporte, ele não recebe uma punição sequer, precisamente por ser um grande atleta. A mensagem que fica é de que, se você for bonito o suficiente, talentoso o suficiente, forte o suficiente, ou esperto o bastante, você não precisa se preocupar com seguir as regras em seu cantinho do universo. Isso dificilmente me parece ensinar a diferença entre o que é certo e errado.
Um agente de conversão
Há muitas outras coisas que eu vejo de errado nos livros de Harry Potter, mas deixei para o final um modo importante por meio do qual eles mudaram minha vida… para melhor.
Vocês se lembram do feitiço que eu havia tentado fazer quando era jovem? Não tendo sido educada como católica, nunca me havia ocorrido de levar aquele ato para o confessionário. Em meu grande desconforto com os livros, sentindo aquele “borbulhar” na minha alma só de olhar para eles, eu finalmente me dei conta de que precisava da graça da Confissão por haver tentado, uma vez, lançar um feitiço sobre alguém. Eu poderia ter argumentado que não precisava me confessar (pois certamente não havia preenchido todos os requisitos para o cometimento de um pecado mortal), mas fiquei muito feliz por ter feito isso.
Por meio da minha confissão, Deus em sua misericórdia concedeu-me um grande dom: seu perdão abençoou minha vida e eu experimentei benefícios palpáveis vindos do sacramento que eu recebi naquele dia. Aquele “borbulhar”, aquela força oculta e poderosa que costumava atrair-me para o oculto, tudo isso se foi. Eu ainda rezo por bruxas e adivinhos quando deparo com eles, e com frequência peço a Deus proteção contra o mundo do ocultismo, mas não mais com o medo paralisador que eu sentia antes.
Feliz liberdade! Nesse sentido, eu devo ver Harry Potter como um agente de minha conversão. É nesse sentido que eu espero que você também o veja como um agente de conversão na vida de seus filhos.
Nem todos que lêem Harry Potter serão espiritualmente prejudicados. Ao mesmo tempo que eu vejo nos livros o perigo de estimularem um interesse pelo ocultismo, sou a última a me preocupar com crianças protegidas pelos sacramentos e bem educadas na sua fé.
Se seus filhos ainda não leram Harry Potter, eu espero que você lhes dê várias razões para que não o façam. Mas, se eles já tiverem lido os livros, como tantas crianças nos Estados Unidos, no Brasil e mundo afora, eu espero que você use esta matéria para incentivar uma discussão dentro de sua família. Compartilhe com seus filhos o ensinamento da Igreja sobre a magia, e fale com eles da influência destrutiva que o ocultismo exerce sobre as pessoas.
Se Harry Potter se tornar para sua família uma prevenção contra o ocultismo, ao invés de um portão que conduz a ele, ele terá feito, ainda que involuntariamente, um grande favor a seus filhos.