Francisco: “Nunca vi um caminhão de mudança atrás de um cortejo fúnebre”

Papa propõe uma reflexão na missa diária sobre não acumular riquezas na terra

Por Redacao

CIDADE DO VATICANO, 21 de Junho de 2013 (Zenit.org) – Pedir a Deus a graça de um coração que saiba amar e que não se deixe desviar por tesouros inúteis: esta é a substância da homilia do papa Francisco na Casa Santa Marta, durante a missa concelebrada nesta manhã com o cardeal Francisco Coccopalmerio, o bispo Juan Ignacio Arrieta e o auxiliar José Aparecido Gonçalves de Almeida, presidente, secretário e subsecretário do Pontifício Conselho para os Textos Legislativos, respectivamente, acompanhados por alguns dos funcionários do dicastério. Estavam presentes também os funcionários da Fábrica da Basílica de São João de Latrão, com mons. Santiago Ceretto, e os empregados da Casa Santa Marta.

Atesourar no céu

A luta pelo único tesouro que podemos levar conosco depois desta vida é a razão de ser de um cristão. É a razão de ser que Jesus explica aos discípulos, na passagem de hoje do evangelho de Mateus: “Onde estiver o teu tesouro, ali estará também teu coração”. A questão, explica o papa, é não confundir as riquezas. Há “tesouros arriscados” que seduzem, “mas que devemos abandonar”: aqueles acumulados durante a vida e que a morte destrói. Francisco observa com um toque de ironia: “Nunca vi um caminhão de mudança atrás de um cortejo fúnebre”. Mas há um tesouro que “podemos levar conosco”, um tesouro que ninguém pode nos roubar e que “não é o que você vem guardando para si”, mas sim “o que você dá para os outros”.

“O tesouro que damos aos outros é o tesouro que nós levamos. E esse vai ser o nosso mérito, entre aspas, mas é um ‘nosso mérito’ de Jesus Cristo em nós! E é isso o que nós temos que levar. E é aquilo que nosso Senhor nos deixa levar. O amor, a caridade, o serviço, a paciência, a bondade, a ternura são lindos tesouros: são os tesouros que nós levamos. Os outros, não”.

Conforme o evangelho, o tesouro que tem valor perante os olhos de Deus é aquele que acumulamos no céu a partir da terra. Mas Jesus, destaca o papa Francisco, dá um passo a mais: ele vincula o tesouro ao “coração”, criando uma “relação” entre os dois termos. Isto porque o nosso “é um coração inquieto”, que nosso Senhor “fez desse jeito para procurarmos por Ele”.

“Nosso Senhor nos criou inquietos para o encontrarmos, para crescermos. Mas se o nosso tesouro é um tesouro que não está perto dele, que não é do Senhor, então o nosso coração se inquieta por coisas que não duram, por esses tesouros… Muita gente, inclusive nós, está inquieta… Para ter isso, para comprar aquilo, e, no fim, o nosso coração se cansa, nunca está satisfeito: ele se cansa, fica preguiçoso, se torna um coração sem amor. O cansaço do coração. Vamos pensar nisso. O que é que eu tenho? Um coração cansado, que só quer se acomodar, três ou quatro coisas, uma boa conta bancária, isto, aquilo?  Ou um coração irrequieto, que procura sempre as coisas do Senhor? Essa inquietação do coração tem que ser cuidada sempre”.

Um coração que brilhe

Continua o papa Francisco: Cristo também coloca na berlinda o “olho”, que simboliza “a intenção do coração” e que se reflete no corpo: “um coração cheio de amor” deixa o corpo “brilhante”, enquanto um “coração mau” o torna escuro. Do contraste luz-escuridão, explica o papa, depende “o nosso parecer sobre as coisas”, como também é demonstrado pelo fato de que o gerador das guerras é um “coração de pedra”, “apegado a um tesouro da terra”, a “um tesouro egoísta”, que pode se transformar em um tesouro “do ódio”. Na oração final, o papa pediu, através da intercessão de São Luis Gonzaga, a quem a Igreja recorda hoje, “a graça de um coração novo”, um “coração de carne”.

“Deus torna humanos todos aqueles pedaços do coração que são feitos de pedra, com aquela inquietação positiva, com aquela ânsia boa de ir para frente, procurando por Ele, deixando-se buscar por Ele! Que nosso Senhor mude o nosso coração! E assim ele nos salvará. Ele nos protegerá dos tesouros que não nos ajudam para o nosso encontro com Ele, para servirmos aos outros, e nos dará a luz para ver e julgar de acordo com o verdadeiro tesouro: a sua verdade. Que nosso Senhor mude o nosso coração para procurarmos o verdadeiro tesouro e nos tornarmos pessoas luminosas e não pessoas da escuridão”.

Para rezar o pai-nosso: coração em paz com os irmãos

Papa Francisco na homilia: um Deus Pai, não um deus cósmico. Oração não é magia.

Por Salvatore Cernuzio

CIDADE DO VATICANO, 20 de Junho de 2013 (Zenit.org) – Para rezar o pai-nosso, precisamos ter o coração em paz com os nossos irmãos. É o que foi destacado nesta manhã pelo papa Francisco na missa da Casa Santa Marta. O papa ressaltou que acreditamos em um Deus que é Pai, que está muito perto de nós, que não é anónimo, que não é “um Deus cósmico”. A missa foi concelebrada, entre outros, pelo cardeal Zenon Grocholewski. Participaram um grupo de funcionários da Congregação para a Educação Católica e outro dos Museus Vaticanos.

“A oração não é magia”, mas um “confiar-se ao abraço do Pai”. O papa concentrou a homilia na oração do pai-nosso, que Jesus ensinou aos discípulos e da qual fala o evangelho de hoje. Jesus nos dá um conselho na oração: “Não desperdicem palavras, não façam mero barulho”, o barulho “do mundano, da vaidade”, disse o papa. “A oração não é uma coisa mágica, não se faz magia com a oração. Me disseram que, quando você procura um curandeiro, ele diz um monte de palavras para curar. Mas aquilo é pagão. O que Jesus nos ensina é: não temos que ir até Ele com muitas palavras, porque Ele já sabe tudo”. E completa: “A primeira palavra é pai, esta é a chave da oração. Sem dizer, sem escutar essa palavra, não se pode orar”.

“A quem eu devo orar? Ao Deus Todo-Poderoso? Distante demais. A quem devo orar? Ao Deus cósmico? Um tanto comum nos dias de hoje, não é? Orar ao Deus cósmico, não? Essa cultura politeísta, que tem essa cultura light… Nós temos que rezar ao nosso Pai! É uma palavra forte: Pai. Temos que orar àquele que nos gerou, que nos deu a vida. Ele não deu a vida ‘a todos’: todos é muito anônimo. Ele deu a vida a você, a mim. E também orar para aquele que nos acompanha no caminho: que conhece toda a nossa vida. Tudo: o que é bom e o que não é tão bom assim. Ele sabe tudo. Se não começamos a oração com essa palavra, dita não dos lábios para fora, mas de dentro do coração, então não podemos orar ‘em cristão’”.

A palavra “pai”, reiterou o papa, “é uma palavra forte”, mas que “abre as portas”. No momento do sacrifício, Isaac se dá conta de que “algo estava errado”, já que “faltava a ovelha”, mas ele confia no Pai. “Mais ainda: pai é a palavra em que pensou aquele filho que foi embora de casa com a sua parte da herança e que depois queria voltar para casa. E aquele pai ‘o vê chegar e vai correndo ao seu encontro’, se lança ao seu abraço para enchê-lo de amor.  E aquele ‘Pai, eu pequei’: esta é a chave de toda oração, sentir-se amado por um Pai”.

“Nós temos um Pai. E muito próximo, que nos abraça… Todas estas preocupações, inquietações que nós temos, vamos entregá-las ao Pai: ele sabe do que nós precisamos. Pai o quê, meu? Não, pai nosso! Porque eu não sou filho único, nenhum de nós é, e se eu não consigo ser um irmão, será difícil me tornar um filho desse Pai, porque ele é o pai de todos. Claro que é meu, mas também dos outros, dos meus irmãos. E se eu não estou em paz com os meus irmãos, não posso chamá-lo de pai”.

Isto explica o fato de que Jesus, depois de nos ensinar o pai-nosso, enfatiza que, se não perdoarmos aos outros, o Pai não nos perdoará os pecados. “É muito difícil perdoar aos outros, é muito difícil mesmo, porque sempre temos aquele pesar por dentro. Pensamos: ‘Você me aprontou, espera só…’, para ‘devolver’”.

“Não, não podemos orar com inimigos no coração, com irmãos e inimigos no coração. Isso é difícil, sim, é difícil, não é fácil. ‘Pai, eu não posso dizer Pai, não consigo’. É verdade, eu entendo. ‘Não posso dizer nosso, porque fulano me fez isso, aquilo e…’, enfim, não posso! ‘Aqueles lá merecem ir para o inferno’, não é assim? ‘Eles não são dos meus!’. Não é fácil. Mas Jesus nos prometeu o Espírito Santo: é ele que nos ensina, a partir de dentro, do coração, a dizer ‘Pai’ e ‘nosso’. Peçamos hoje ao Espírito Santo que ele nos ensine a dizer ‘Pai’ e a dizer ‘nosso’, selando a paz com todos os nossos inimigos”.

Como é difícil amar os nossos inimigos!

Casa Santa Marta: o papa Francesco enfatiza que amar o inimigo é o que nos torna mais parecidos com Cristo e nos convida a rezar para sermos capazes de perdoar

Por Salvatore Cernuzio

CIDADE DO VATICANO, 18 de Junho de 2013 (Zenit.org) – A força do cristão é a sua capacidade de amar. Amar especialmente aqueles que lhe fazem mal, aqueles que o odeiam. Não é um instinto natural, mas é o que Jesus nos pede se quisermos ficar mais próximos dele, que não se vingou de quem o traiu e pregou na cruz.

A partir desta reflexão, desenrolou-se a homilia do papa Francisco na missa desta manhã na Casa Santa Marta, concelebrada com o cardeal Giuseppe Versaldi e com a participação de alguns funcionários da Prefeitura para os Assuntos Econômicos da Santa Sé e dos Museus do Vaticano.

“Amar os nossos inimigos é muito difícil”, afirmou o papa. E não é questão de amar quem teve alguma briga conosco: as nossas próprias forças poderiam ser suficientes para isso. O que Jesus nos pede é amar aqueles que “decidem cometer um atentado e matar muitas pessoas”, disse o papa; aqueles que, “por amor ao dinheiro, não deixam os remédios chegarem até os idosos e os deixam morrer”; aqueles que procuram apenas “os seus próprios interesses, o seu próprio poder e provocam grandes males”. Como é possível amar essas pessoas?, perguntou Bergoglio.

“Parece muito difícil amar o inimigo”, prosseguiu. É uma graça que só Deus pode nos conceder, com a força que vem da oração por eles, para que “nosso Senhor mude os seus corações” e converta o nosso próprio coração. Porque “todos nós temos inimigos”, mas “nós mesmos, tantas vezes, nos tornamos inimigos dos outros em vez de amá-los”.

Este mandamento de Jesus parece ainda mais difícil de cumprir do que os outros: “Achamos que Jesus está nos pedindo demais! Deixamos isso para as freiras de clausura, que são santas; deixamos isso para as santas almas, porque na vida cotidiana não dá! Mas tem que dar! Jesus diz: Nós temos que fazer isto! Porque, caso contrário, somos como os publicanos, como os pagãos. Não somos cristãos”.

Jesus Cristo “nos diz duas coisas em particular”: primeiro, olhar para o Pai, que tem “amor por todos” e “faz nascer o seu sol sobre maus e bons e chover sobre os justos e os injustos”. E, segundo, ser “perfeitos como o vosso Pai celestial é perfeito”, “imitando o Pai naquela perfeição do amor”.

Jesus, reiterou o Santo Padre, “perdoa os seus inimigos”, “faz de tudo para perdoá-los” porque os cristãos não procuram vingança: a sua arma é a oração. “Rezar”, exclamou Francisco, “é o que Jesus nos aconselha: orai pelos vossos inimigos! Orai por aqueles que vos perseguem! Orai! E dizei a Deus: Muda, Senhor, o coração dele. Ele tem um coração de pedra, dá-lhe um coração de carne, sensível e que ame”. “Quando se reza por quem nos faz sofrer”, acrescentou o papa, “é como se Deus chegasse com seu bálsamo e preparasse os nossos corações para a paz”.

O Santo Padre convidou todos os presentes a fazer uma pergunta em seu coração: “Eu rezo pelos meus inimigos? Eu oro por aqueles que não me amam? Se dissermos que sim, eu direi: Então vamos em frente, vamos orar mais ainda; este é um bom caminho. Se a resposta for não, então nosso Senhor nos diz: Pobre homem… Você também é inimigo dos outros”.

Amar até mesmo quem “aprontou das grandes” ou quem comete más ações “empobreceria as pessoas”? É “com essa desculpa que nós queremos vingança, olho por olho, dente por dente”. Não só isso: “De acordo com os critérios do mundo, não é um bom negócio” amar que nos faz sofrer: além de ser difícil, isso também “nos empobreceria”.

Amar o inimigo, porém, explicou o papa, “nos torna pobres”, sim, mas com a mesma pobreza de Jesus, que se fez pobre “quando veio até nós e se rebaixou”. Ele, sendo rico, se fez pobre, e “nesse rebaixamento é que está a graça que justificou a todos nós, que nos tornou ricos”: o “mistério da salvação”. “O amor nos empobrece, mas com aquela pobreza que é a semente da fertilidade e do amor ao próximo”, ressaltou o papa.

“Seria muito bonito oferecermos a missa, o sacrifício de Jesus, por aqueles que não nos amam. Seria bom para eles, mas também para nós, para que Deus nos ensine esta sabedoria tão difícil, mas tão bela, que nos assemelha ao nosso Pai que traz a luz do sol para todos, tanto bons quanto maus”.

Jesus é o “tudo” e é disto que deriva a sua magnanimidade

Homilia do Santo Padre Francisco na missa diaria celebrada na capela da Casa Santa Marta

ROMA, 17 de Junho de 2013 (Zenit.org) – Para os cristãos, Jesus é o “tudo” e é disto que deriva a sua magnanimidade: esta foi a mensagem enfatizada pelo papa Francisco na missa desta manhã na Casa Santa Marta.

O papa reiterou que a justiça trazida por Jesus é superior à dos escribas, ao “olho por olho, dente por dente”. Na missa, que foi concelebrada pelo cardeal Attilio Nicora, estavam presentes, entre outros, os funcionários da Autoridade de Informação Financeira e um grupo de funcionários dos Museus do Vaticano, acompanhados pelo diretor administrativo, dom Paolo Nicolini. Também participou da missa o cardeal arcebispo de Manila, Luis Antonio Tagle.

“Se alguém te bater na face direita, oferece-lhe também a outra”. O papa Francisco centrou a homilia nestas palavras perturbadoras de Jesus aos discípulos. Esse tapa, observou o pontífice, já “se tornou um clássico para ridicularizar os cristãos”. Na vida, afinal, a “lógica do dia-a-dia” nos diz que “devemos lutar, devemos defender o nosso espaço” e, se nos derem um tapa, “vamos devolver dois, para nos defender”. Além disso, prosseguiu Francisco, “quando eu aconselho os pais sobre como repreender seus filhos, sempre alerto: ‘Mas nunca batam na face deles’, porque ‘a face é a dignidade’. Jesus, no entanto, nos surpreende: depois de falar sobre oferecer a outra face, ele nos ensina a entregar também o nosso manto, a despojar-nos de tudo”.

“A justiça que Ele traz é uma justiça totalmente diferente do ‘olho por olho, dente por dente’. É outra justiça”. Podemos entendê-la quando São Paulo fala dos cristãos como “pessoas que não têm nada” e que, ao mesmo tempo, “têm tudo”. A segurança cristã está justamente nesse “tudo”, que Jesus. As outras coisas são “nada” para o cristão. “Para o espírito do mundo, o ‘tudo’ são as coisas: a riqueza, as vaidades”, e o “nada” é Jesus. Se um cristão caminha cem quilômetros quando lhe pedem caminhar dez, “é porque, para ele, isso é ‘nada’”, e, com serenidade, ele “pode ​​dar o manto quando lhe pedem a túnica”. Este é o “segredo da magnanimidade cristã, que sempre caminha junto com a mansidão”: é o “tudo”; é Jesus Cristo.

“O cristão é uma pessoa que engrandece o próprio coração com essa magnanimidade, porque ela tem o ‘tudo’, que é Jesus Cristo. As outras coisas são o ‘nada’. São boas, são úteis, mas, no momento do confronto, ele sempre escolhe o ‘tudo’, com aquela brandura, com aquela mansidão cristã que é a marca dos discípulos de Jesus: mansidão e magnanimidade. E viver assim não é fácil, porque “nós realmente levamos muitas bofetadas, não é mesmo? E nas duas faces! Mas o cristão é humilde, o cristão é magnânimo: ele dilata o seu coração. Mas quando encontramos aqueles cristãos de coração reduzido, de coração encolhido… aquilo não é cristianismo: é egoísmo disfarçado de cristianismo”.

“O verdadeiro cristão sabe resolver essa oposição bipolar, essa tensão entre o tudo e o nada, do jeito que Jesus recomendou: ‘Buscai primeiro o Reino de Deus e a sua justiça, e o resto virá por acréscimo’. O Reino de Deus é o ‘tudo’, o resto é secundário, não é principal. E todos os erros cristãos, todos os erros da Igreja, todos os nossos erros, nascem daqui, quando dizemos que o nada é tudo e que o tudo… bom, parece que ele não conta…  Seguir Jesus não é fácil, não é fácil. Mas também não é difícil, porque, no caminho do amor, Deus faz as coisas de modo que possamos seguir em frente. Deus mesmo engrandece o nosso coração”.

Esta é a oração que nós temos que fazer “diante dessas propostas do tapa, do manto, dos cem quilômetros”: devemos orar ao Senhor para engrandecer “os nossos corações”, para “sermos generosos, humildes” e para não lutarmos “por coisas insignificantes, pelo nada de cada dia”.

“Quando se faz uma opção pelo nada, nascem daquela opção os desencontros na família, nas amizades, com os amigos, com a sociedade; são confrontos que terminam em guerra: em guerra pelo nada! O nada é sempre semente de guerra! Porque é semente do egoísmo. O tudo é o que é grandioso, é Jesus. Peçamos ao Senhor a graça de engrandecer o nosso coração, para sermos humildes, mansos e magnânimos, porque nele nós temos o tudo; e que Ele nos livre de criar problemas cotidianos em torno do nada”.

Vamos em busca das 99 ovelhas perdidas

Na abertura do Congresso da Diocese de Roma, o Papa Francisco convida a não ceder à “deusa lamentação”

Por Sergio Mora

ROMA, 17 de Junho de 2013 (Zenit.org) – O Papa Francesco abriu hoje o Congresso da Diocese de Roma sobre o tema Eu não tenho vergonha do evangelho. O evento inaugurado na Sala Paulo VI, no Vaticano, continuará terça-feira na Catedral de São João de Latrão e terminará quarta-feira nas diversas paróquias da diocese.

A Sala Paulo VI, que normalmente hospeda a Audiência de quarta-feira, de repente, revelou-se demasiado pequena para a quantidade de ouvintes. Participaram do encontro pelo menos quinze mil pessoas.

Francisco recordou que “alguns cristãos parecem devotos da deusa lamentação” e sublinhou que “o mundo é mundo, o mesmo de cinco séculos” e que é necessário “dar um testemunho forte e ir em frente”, mas também “suportar as coisas que não podem mudar”. O Santo Padre convidou “com coragem e paciência a sairmos de nós mesmos e ir ao encontro da comunidade para convidar as pessoas”.

E acrescentou: “Seja em todos os lugares portadores da palavra de vida, em seus bairros, onde as pessoas estiverem”, e recordou a figura do Bom Pastor, que deixa as noventa e nove ovelhas para procurar a perdida.

“Queridos irmãos, temos uma e noventa e nove estão desaparecidas, vamos buscá-las”, peçamos  “a graça de sair para anunciar o Evangelho”, porque “é mais fácil ficar em casa com uma ovelha, escová-la, acariciá-la”.  Então, exclamou: “Mas o Senhor nos quer, nós sacerdotes, e também vocês, cristãos, pastores, e não ‘escovadores’ de ovelhas …”.

O Papa concluiu dizendo que “Deus nos dá esta graça gratuitamente, e nós gratuitamente devemos dar”.

Seguiu-se um momento de reflexão, que começou com algumas músicas interpretadas pelo coral e orquestra da diocese de Roma. Amanhã falará o Vigário do Papa para a Diocese de Roma, Cardeal Agostino Vallini e o Bispo de Novara, Franco Brambilla.

Em sua apresentação, o cardeal Vallini explicou que “optou-se por abrir os três dias de reflexão na Sala Paulo VI  para permitir uma maior participação dos agentes pastorais e dos fiéis”.

Vallini acrescentou que “teremos a alegria de ouvir, pela primeira vez, a reflexão do Papa Francisco que, após a sua tomada de posse da Basílica de São João em Latrão, no último dia 7 de abril, se encontrará novamente como Bispo de Roma com a comunidade eclesial local”. 

Deus leva à vida ao passo que seguir os ídolos leva à morte

Homilia do Papa Francisco pronunciada na Santa Missa por ocasião da Jornada pela Vida


CIDADE DO VATICANO, 16 de Junho de 2013 (Zenit.org) – Às 10:30 de hoje, XI Domingo do Tempo Comum, na Praça de São Pedro, o Santo Padre Francisco celebrou a missa pela Jornada Evangelium Vitae, por ocasião do Ano da Fé. Apresentamos a seguir o texto da homilia pronunciada pelo Papa após a leitura do Santo Evangelho.

Amados irmãos e irmãs!

Esta celebração tem um nome muito belo: o Evangelho da Vida. Com esta Eucaristia, no Ano da Fé, queremos agradecer ao Senhor pelo dom da vida, em todas as suas manifestações, e ao mesmo tempo queremos anunciar o Evangelho da Vida.

Partindo da Palavra de Deus que escutámos, gostava de vos propor simplesmente três pontos de meditação para a nossa fé: primeiro, a Bíblia revela-nos o Deus Vivo, o Deus que é Vida e fonte da vida; segundo, Jesus Cristo dá a vida e o Espírito Santo mantém-nos na vida; terceiro, seguir o caminho de Deus leva à vida, ao passo que seguir os ídolos leva à morte.

1. A primeira leitura, tirada do Segundo Livro de Samuel, fala-nos de vida e de morte. O rei David quer esconder o adultério cometido com a esposa de Urias, o hitita, um soldado do seu exército, e, para o conseguir, manda colocar Urias na linha da frente para ser morto em batalha. A Bíblia mostra-nos o drama humano em toda a sua realidade, o bem e o mal, as paixões, o pecado e as suas consequências. Quando o homem quer afirmar-se a si mesmo, fechando-se no seu egoísmo e colocando-se no lugar de Deus, acaba por semear a morte. Exemplo disto mesmo é o adultério do rei David. E o egoísmo leva à mentira, pela qual se procura enganar a si mesmo e ao próximo. Mas, a Deus, não se pode enganar, e ouvimos as palavras que o profeta disse a David: Tu praticaste o mal aos olhos do Senhor (cf. 2 Sam 12, 9). O rei vê-se confrontado com as suas obras de morte– na verdade o que ele fez é uma obra de morte, não de vida! –, compreende e pede perdão: «Pequei contra o Senhor» (v. 13); e Deus misericordioso, que quer a vida e sempre nos perdoa, perdoa-lhe, devolve-lhe a vida; diz-lhe o profeta: «O Senhor perdoou o teu pecado. Não morrerás». Que imagem temos de Deus? Quem sabe se nos aparece como um juiz severo, como alguém que limita a nossa liberdade de viver?! Mas toda a Escritura nos lembra que Deus é o Vivente, aquele que dá a vida e indica o caminho da vida plena. Penso no início do Livro do Génesis: Deus plasma o homem com o pó da terra, insufla nas suas narinas um sopro de vida e o homem torna-se um ser vivente (cf. 2, 7). Deus é a fonte da vida; é devido ao seu sopro que o homem tem vida, e é o seu sopro que sustenta o caminho da nossa existência terrena. Penso também na vocação de Moisés, quando o Senhor Se apresenta como o Deus de Abraão, de Isaac e de Jacob, como o Deus dos viventes; e, quando enviou Moisés ao Faraó para libertar o seu povo, revela o seu nome: «Eu sou aquele que sou», o Deus que Se torna presente na história, que liberta da escravidão, da morte e traz vida ao povo, porque é o Vivente. Penso também no dom dos Dez Mandamentos: uma estrada que Deus nos indica para uma vida verdadeiramente livre, para uma vida plena; não são um hino ao «não» – não deves fazer isto, não deves fazer aquilo, não deves fazer aqueloutro… Não! – São um hinoao «sim» dito a Deus, ao Amor, à vida. Queridos amigos, a nossa vida só é plena em Deus,porque sóEle é o Vivente!

2. A passagem do Evangelho de hoje permite-nos avançar mais um passo. Jesus encontra uma mulher pecadora durante um almoço em casa de um fariseu, suscitando o escândalo dos presentes: Jesus deixa-Se tocar por uma pecadora e até lhe perdoa os pecados, dizendo: «São-lhe perdoados os seus muitos pecados, porque muito amou; mas àquele a quem pouco se perdoa, pouco ama» (Lc 7, 47). Jesus é a encarnação do Deus Vivo, Aquele que traz a vida fazendo frente a tantasobras de morte, fazendo frente ao pecado, ao egoísmo, ao fechamento em si mesmo. Jesus acolhe, ama, levanta, encoraja, perdoa e dá novamente a força de caminhar, devolve a vida. Ao longo do Evangelho, vemos como Jesus, por gestos e palavras, traz a vida de Deus que transforma. É a experiência da mulher que unge com perfume os pés do Senhor: sente-se compreendida, amada, e responde com um gesto de amor, deixa-se tocar pela misericórdia de Deus e obtém o perdão, começa uma vida nova. Deus, o Vivente, é misericordioso. Estais de acordo? Digamo-lo juntos: Deus, o Vivente, é misericordioso! Todos: Deus, o Vivente, é misericordioso. Outra vez: Deus, o Vivente, é misericordioso!

Esta foi também a experiência do apóstolo Paulo, como ouvimos na segunda leitura: «A vida que agora tenho na carne, vivo-a na fé do Filho de Deus, que me amou e a Si mesmo Se entregou por mim» (Gl 2, 20). E que vida é esta? É a própria vida de Deus. E quem nos introduz nesta vida? É o Espírito Santo, dom de Cristo ressuscitado; é Ele que nos introduz na vida divina como verdadeiros filhos de Deus, como filhos no Filho Unigénito, Jesus Cristo. Estamos nós abertos ao Espírito Santo? Deixamo-nos guiar por Ele? O cristão é um homem espiritual, mas isto não significa que seja uma pessoa que vive «nas nuvens», fora da realidade, como se fosse um fantasma. Não! O cristão é uma pessoa que pensa e age de acordo com Deus na vida quotidiana, uma pessoa que deixa que a sua vida seja animada, nutrida pelo Espírito Santo, para ser plena, vida de verdadeiros filhos. E isto significa realismo e fecundidade. Quem se deixa conduzir pelo Espírito Santo é realista, sabe medir e avaliar a realidade, e também é fecundo: a sua vida gera vida em redor.

3. Deus é o Vivente, é o Misericordioso. Jesus traz-nos a vida de Deus, o Espírito Santo introduz-nos e mantém-nos na relação vital de verdadeiros filhos de Deus. Muitas vezes, porém – sabemo-lo por experiência –, o  homem não escolhe a vida, não acolhe o «Evangelho da vida», mas deixa-se guiar por ideologias e lógicas que põem obstáculos à vida, que não a respeitam, porque são ditadas pelo egoísmo, o interesse pessoal, o lucro, o poder, o prazer, e nãosão ditadas pelo amor, a busca do bem do outro. É a persistente ilusão de querer construir a cidade do homem sem Deus, sem a vida e o amor de Deus: uma nova Torre de Babel; é pensar que a rejeição de Deus, da mensagem de Cristo, do Evangelho da Vida leve à liberdade, à plena realização do homem. Resultado: o Deus Vivo acaba substituído por ídolos humanos e passageiros, que oferecem o arrebatamento de um momento de liberdade, mas no fim são portadores de novas escravidões e de morte. O Salmista diz na sua sabedoria: «Os mandamentos do Senhor são rectos, alegram o coração; os preceitos do Senhor são claros, iluminam os olhos» (Sal 19, 9). Recordemo-nos sempre disto: O Senhor é o Vivente, é misericordioso. O Senhor é o Vivente, é misericordioso.

Amados irmãos e irmãs, consideremos Deus como o Deus da vida, consideremos a sua lei, a mensagem do Evangelho como um caminho de liberdade e vida. O Deus Vivo faz-nos livres! Digamos sim ao amor e não ao egoísmo, digamos sim à vida e não à morte, digamos sim à liberdade e não à escravidão dos numerosos ídolos do nosso tempo; numa palavra, digamos sim a Deus, que é amor, vida e liberdade, e jamais desilude (cf. 1 Jo 4, 8; Jo 8, 32; 11, 2), digamos sim a Deus que é o Vivente e o Misericordioso. Só nos salva a fé no Deus Vivo; no Deus que, em Jesus Cristo, nos concedeu a sua vida com o dom do Espírito Santo e nos faz viver como verdadeiros filhos de Deus com a sua misericórdia. Esta fé torna-nos livres e felizes. Peçamos a Maria, Mãe da Vida, que nos ajude a acolher e testemunhar sempre o «Evangelho da Vida». Assim seja.

“O que quer dizer ‘Povo de Deus'” ?

Catequese do Papa Francisco na Audiência Geral dessa quarta-feira.

 

ROMA, 12 de Junho de 2013 (Zenit.org) – Publicamos a seguir a catequese do Papa Franscisco durante a Audiência Geral da Quarta-feira, na Praça de São Pedro: 

***

Queridos irmãos e irmãs, bom dia!

Hoje gostaria de concentrar-me brevemente sobre um dos termos com o qual o Concílio Vaticano II definiu a Igreja, aquele do “Povo de Deus” (cfr. Const. Dog. Lumen Gentium, 9; Catecismo da Igreja Católica, 782). E o faço com algumas perguntas, sobre as quais cada um poderá refletir.

1. O que significa dizer ser “Povo de Deus”? Antes de tudo quer dizer que Deus não pertence propriamente a algum povo; porque Ele nos chama, convoca-nos, convida-nos a fazer parte do seu povo, e este convite é dirigido a todos, sem distinção, porque a misericórdia de Deus “quer a salvação para todos” (1 Tm 2, 4). Jesus não diz aos Apóstolos e a nós para formarmos um grupo exclusivo, um grupo de elite. Jesus diz: ide e fazei discípulos todos os povos (cfr Mt 28, 19). São Paulo afirma que no povo de Deus, na Igreja, “não há judeu nem grego… pois todos vós sois um em Cristo Jesus” (Gal 3, 28). Gostaria de dizer também a quem se sente distante de Deus e da Igreja, a quem está temeroso ou indiferente, a quem pensa não poder mais mudar: o Senhor chama também você a fazer parte do seu povo e o faz com grande respeito e amor! Ele nos convida a fazer parte deste povo, povo de Deus.

2. Como tornar-se membros deste povo? Não é através do nascimento físico, mas através de um novo nascimento. No Evangelho, Jesus diz a Nicodemos que é preciso nascer do alto, da água e do Espírito para entrar no Reino de Deus (cfr Jo 3, 3-5). É através do Batismo que nós somos introduzidos neste povo, através da fé em Cristo, dom de Deus que deve ser alimentado e crescer em toda a nossa vida. Perguntamo-nos: como faço crescer a fé que recebi no Batismo? Como faço crescer esta fé que eu recebi e que o povo de Deus possui?

3. Outra pergunta. Qual é a lei do Povo de Deus? É a lei do amor, amor a Deus e amor ao próximo segundo o mandamento novo que nos deixou o Senhor (cfr Jo 13, 34). Um amor, porém, que não é estéril sentimentalismo ou algo vago, mas que é o reconhecer Deus como único Senhor da vida e, ao mesmo tempo, acolher o outro como verdadeiro irmão, superando divisões, rivalidades, incompreensões, egoísmos; as duas coisas andam juntas. Quanto caminho temos ainda a percorrer para viver concretamente esta nova lei, aquela do Espírito Santo que age em nós, aquela da caridade, do amor! Quando nós olhamos para os jornais ou para a televisão tantas guerras entre cristãos, mas como pode acontecer isso? Dentro do povo de Deus, quantas guerras! Nos bairros, nos locais de trabalho, quantas guerras por inveja, ciúmes! Mesmo na própria família, quantas guerras internas! Nós precisamos pedir ao Senhor que nos faça entender bem esta lei do amor. Quanto é belo amar-nos uns aos outros como verdadeiros irmãos. Como é belo! Façamos uma coisa hoje. Talvez todos tenhamos simpatias e antipatias; talvez tantos de nós estamos um pouco irritados com alguém; então digamos ao Senhor: Senhor, eu estou irritado com esta pessoa ou com esta; eu rezo ao Senhor por ele e por ela. Rezar por aqueles com os quais estamos irritados é um belo passo nesta lei do amor. Vamos fazer isso? Façamos isso hoje!

4. Que missão tem este povo? Aquela de levar ao mundo a esperança e a salvação de Deus: ser sinal do amor de Deus que chama todos à amizade com Ele; ser fermento que faz fermentar a massa, sal que dá o sabor e que preserva da corrupção, ser uma luz que ilumina. Ao nosso redor, basta abrir um jornal – como disse – e vemos que a presença do mal existe, o Diabo age. Mas gostaria de dizer em voz alta: Deus é mais forte! Vocês acreditam nisso: que Deus é mais forte? Mas o digamos juntos, digamos juntos todos: Deus é mais forte! E sabem por que é mais forte? Porque Ele é o Senhor, o único Senhor. E gostaria de acrescentar que a realidade às vezes escura, marcada pelo mal, pode mudar, se nós primeiro levamos a luz do Evangelho sobretudo com a nossa vida. Se em um estádio, pensemos aqui em Roma no Olímpico, ou naquele de São Lourenço em Buenos Aires, em uma noite escura, uma pessoa acende uma luz, será apenas uma entrevista, mas se os outros setenta mil expectadores acendem cada um a própria luz, o estádio se ilumina.  Façamos que a nossa vida seja uma luz de Cristo; juntos levaremos a luz do Evangelho a toda a realidade.

5. Qual é a finalidade deste povo? A finalidade é o Reino de Deus, iniciado na terra pelo próprio Deus e que deve ser ampliado até a conclusão, até a segunda vinda de Cristo, vida nossa (cfr Lumen gentium, 9). A finalidade então é a comunhão plena com o Senhor, a familiaridade com o Senhor, entrar na sua própria vida divina, onde viveremos a alegria do seu amor sem medidas, uma alegria plena.

Queridos irmãos e irmãs, ser Igreja, ser Povo de Deus, segundo o grande desígnio do amor do Pai, quer dizer ser o fermento de Deus nesta nossa humanidade, quer dizer anunciar e levar a salvação de Deus neste nosso mundo, que muitas vezes está perdido, necessitado de ter respostas que encorajem, que dêem esperança, que dêem novo vigor no caminho. A Igreja seja lugar da misericórdia e da esperança de Deus, onde cada um possa sentir-se acolhido, amado, perdoado, encorajado a viver segundo a vida boa do Evangelho. E para fazer o outro sentir-se acolhido, amado, perdoado, encorajado, a Igreja deve estar com as portas abertas, para que todos possam entrar. E nós devemos sair destas portas e anunciar o Evangelho.

Tradução Jéssica Marçal / Canção Nova

Política, um dever do católico

Atuar na política, diz Papa Francisco, é uma das formas mais altas de caridade

O Papa Francisco recordou um ensinamento grave da Igreja acerca da participação dos leigos na política. Respondendo à pergunta de um jovem, o Santo Padre afirmou que “temos que nos envolver na política, porque ela é uma das formas mais altas de caridade”. Questionou ainda as razões pelas quais ela está “suja”: “está suja por quê? Por que os cristãos não se envolveram nela com espírito evangélico?”. Para o Pontífice, o fiel não pode se fazer de Pilatos e lavar as mãos. “É fácil colocar a culpa nos outros, mas e eu, o que faço?”, perguntou Francisco ao grupo de estudantes do Colégio Jesuíta da Itália, durante um encontro na última sexta-feira, 7 de junho, no Vaticano.

O alerta vem em boa hora, sobretudo quando se vê a aprovação de leis cada vez mais iníquas em países de longa tradição católica. Essa derrocada dos princípios cristãos deve-se, entre outras coisas, à negligência dos leigos e pastores e ao relativismo de muitos políticos que se dizem cristãos, mas na prática, professam outras doutrinas. Embora se tente dizer que é vedado à Igreja opinar sobre questões ligadas ao Estado, o Papa Bento XVI, por ocasião das eleições de 2010, lembrou aos bispos brasileiros que “quando os direitos fundamentais da pessoa ou a salvação das almas o exigirem, os pastores têm o grave dever de emitir um juízo moral, mesmo em matérias políticas”.

A legítima separação entre Igreja e Estado, instituída por Cristo quando disse “dai a Cesar o que é de Cesar e a Deus o que é Deus”, não significa de maneira alguma que a moral oriunda da lei natural possa ser relativizada no campo político. E cabe aos cristãos impedir qualquer tentativa que caminhe neste sentido. Um documento da Congregação para Doutrina da Fé, assinado pelo então Cardeal Joseph Ratzinger em 2002, sobre a atuação dos leigos católicos na política ensina precisamente isso: “não pode haver, na sua vida, dois caminhos paralelos: de um lado, a chamada vida espiritual, com os seus valores e exigências, e, do outro, a chamada vida secular, ou seja, a vida de família, de trabalho, das relações sociais, do empenho político e da cultura”.

E aqui deve-se trazer à memória o testemunho contumaz de vários santos, como São Tomás More, que sofreram o martírio por se recusarem a obedecer leis contrárias à reta moral. Ensina o Catecismo da Igreja Católica que “se acontecer de os dirigentes promulgarem leis injustas ou tomarem medidas contrárias à ordem moral, estas disposições não poderão obrigar as consciências” (1903). Ademais, continua o Catecismo, “a recusa de obediência às autoridades civis, quando suas exigências são contrárias às da reta consciência, funda-se na distinção entre o serviço a Deus e o serviço à comunidade política”, (2242).

Realizada na Irlanda a maior marcha pró-vida da história do país

As passeatas francesas, conhecidas como “La Manif pour tous”, contrárias ao “casamento” entre pessoas do mesmo sexo, as Marchas pela Vida que ocorrem nos Estados Unidos e, mais recentemente, na Irlanda, sendo as maiores dos últimos anos, são também um ótimo exemplo a ser seguido pelos demais leigos católicos. Outro fato louvável é a atuação da ministra do Trabalho e Assuntos Sociais na Alemanha, Úrsula Von der Leyen, que está rompendo paradigmas ao mostrar que é possível ter uma família numerosa, mesmo trabalhando. Úrsula é mãe de sete crianças e chama a atenção no seu país por saber conciliar os trabalhos políticos com os cuidados do lar. Segundo a ministra, “comprovamos que sem crianças um país não pode seguir existindo, por razões econômicas e também emocionais”.

A história dos últimos vinte anos mostra de maneira incisiva o declive no qual se coloca a sociedade cristã, quando esta não assume de maneira responsável seus encargos na esfera política. Vê-se a ascensão de governos anticristãos coniventes com todo o tipo de perversidade e imoralidade. Essa crise tem uma razão, diria São Josemaria Escrivá. É uma crise de santos. Somente um testemunho santo e piedoso terá a força para barrar o avanço do mal.

Por: Equipe Christo Nihil Praeponere

Referências

  1. Nota doutrinal sobre algumas questões relativas à participação e comportamento dos católicos na vida política
  2. Visita “Ad Limina Apostolorum” degli ecc. mi presuli della Conferenza Episcopale del Brasile

Reconhecer-se com sinceridade como frágeis e pecadores

Homilia de hoje do papa Francisco na Casa Santa Marta

Por Redacao

CIDADE DO VATICANO, 14 de Junho de 2013 (Zenit.org) – A única maneira de receber verdadeiramente o dom da salvação de Cristo é reconhecer-se com sinceridade como frágeis e pecadores, evitando toda forma de autojustificação. Esta foi uma das ideias desenvolvidas na homilia do papa Francisco na missa desta manhã, na capela da Casa Santa Marta.

Com o papa, concelebraram o prefeito e secretário da Congregação para o Clero, cardeal Mauro Piacenza, e o arcebispo Celso Morga, acompanhados pelos presbíteros e pelo pessoal do dicastério. De acordo com a Rádio Vaticano, também estiveram  presentes o cardeal Giuseppe Bertello, o bispo de Humahuaca, na Argentina, dom Pedro Olmedo Rivero, e o bispo emérito de Daet, Filipinas, dom Benjamin Almoneda.

Somos pecadores

Consciente de ser um frágil recipiente de barro, o guardião de um grande tesouro recebido de forma totalmente gratuita: este é o seguidor de Cristo perante o Senhor. Francisco concentra a sua reflexão na Carta de Paulo aos cristãos de Corinto, mediante a qual ele explica que o “poder extraordinário” da fé é obra de Deus, vertida em homens pecadores, como em “vasos de barro”. Mas da relação “entre a graça e o poder de Jesus Cristo” e nós, pobres pecadores, brota “o diálogo da salvação.” Esse diálogo, acrescenta o papa, deve evitar, no entanto, qualquer “autojustificação; (…) deve ser feito do jeito que nós somos”.

“Paulo falou muitas vezes dos seus pecados, como um estribilho, não é? ‘Eu lhes digo: eu fui um perseguidor da Igreja, eu persegui…’. O pecado sempre volta à lembrança dele. Ele se sente pecador. Mas, apesar disso, ele não diz: ‘Eu fui pecador, mas agora sou santo’. Não. Mesmo agora, ele fala de ‘um aguilhão de Satanás na minha carne’. Ele nos faz ver a nossa própria fraqueza. O próprio pecado. É um pecador que acolhe Jesus Cristo. Que fala com Jesus Cristo”.

O crucial, indica o papa, é, portanto, a humildade. Paulo mesmo a demostra. Ele reconhece publicamente o seu “currículo de serviço”, tudo o que foi feito como apóstolo enviado por Jesus. Mas, nem por isto, ele oculta ou esconde o que o papa chama de “seu prontuário”: os seus pecados.

Viver em humildade

“Este é o modelo de humildade para nós, presbíteros. Se nos orgulhamos só do nosso currículo e de mais nada, vamos terminar mal. Não podemos proclamar Jesus Cristo Salvador, porque, no fundo, não o sentimos. Mas temos que ser humildes, com uma verdadeira humildade, com nome e sobrenome: ‘Sou um pecador por isto, por isto e por isto’. Como Paulo: ‘Eu persegui a Igreja’. Como ele reconhece: pecadores concretos. Não pecadores com aquela humildade que mais parece uma cara de panfleto. Ah, não, uma humildade firme”.

“A humildade do presbítero, a humildade do cristão, é concreta”, afirma o papa Francisco. Se um cristão não consegue “fazer por si mesmo esta confissão, alguma coisa está mal”: é não ser capaz de “entender a beleza da salvação que Jesus nos traz”.

Cristo, nosso tesouro

“Irmãos, temos um tesouro: Jesus Cristo, o Salvador. A cruz de Jesus Cristo, aquele tesouro do qual nos sentimos orgulhosos. Mas nós o guardamos numa panela de barro. Podemos nos vangloriar também do nosso prontuário, dos nossos pecados. E, assim, o diálogo é cristão e católico: concreto, porque a salvação de Jesus Cristo é concreta. Jesus Cristo não nos salvou com uma ideia, com um programa intelectual. Não. Ele nos salvou com a carne, com o concreto da carne. Ele se rebaixou, se fez homem, se fez carne até o fim. Mas isto só pode ser entendido, recebido, em vasos de barro”.

A mulher samaritana que encontra Jesus, depois de falar com ele, conta aos seus vizinhos o seu pecado, e, depois de encontrar o Senhor, se comporta de maneira semelhante a Paulo. “Eu acredito”, observa o papa Francisco, “que esta mulher com certeza está no céu. Porque, como diz Manzoni, ‘eu nunca vi nosso Senhor começar um milagre sem terminá-lo bem’, e este milagre que Ele começou, definitivamente, foi bem acabado no céu”.

“Peçamos”, encerra o papa, “que Ele nos ajude a ser vasos de barro para guardar e entender o mistério glorioso de Jesus Cristo”.

Não falem mal uns dos outros

Homilia do Papa Francisco na missa desta manhã na capela da Casa Santa Marta

CIDADE DO VATICANO, 13 de Junho de 2013 (Zenit.org) – Que Deus nos conceda a graça de prestar atenção aos comentários que fazemos sobre os outros: esta foi a ideia central da homilia do papa Francisco na missa desta manhã, na Casa Santa Marta.

O papa fez a homilia em espanhol, com a presença dos funcionários das embaixadas e consulados da Argentina na Itália e junto à FAO. “Desde o dia 26 de fevereiro que eu não celebrava a missa em espanhol”, disse o papa. “Estou muito feliz”, completou, e agradeceu aos participantes pelo trabalho que fazem em prol do seu país.

“Que a sua justiça seja maior que a dos fariseus”: Francisco explicou sua homilia partindo da exortação que Jesus fez aos discípulos. Palavras que vêm depois das bem-aventuranças e depois de Jesus afirmar que não veio para dissolver a lei, mas para levá-la a cumprimento. A reforma de Cristo, destacou o papa, “é uma reforma que não rompe, uma reforma na continuidade: da semente até o fruto”. Aquele que “entra na vida cristã tem exigências superiores às dos outros; não tem vantagens superiores”, advertiu.

Jesus menciona algumas dessas necessidades e toca em particular “no tema da relação negativa com os irmãos”. Quem fala mal dos outros, diz Jesus, “merece o inferno”. Se no seu coração existe “algo de negativo” no tocante ao seu irmão, então “existe algo que não funciona. Você tem que se converter, tem que mudar”. E mais: “A ira é um insulto contra o irmão, é algo que o mata”. Francisco observou também que, em especial na tradição latina, existe uma certa “criatividade maravilhosa” para inventar qualificativos: “Quando esse apelido é amistoso, tudo bem; o problema é quando existe o outro tipo de apelidos”, quando acontece “o mecanismo do insulto, uma forma de denegrir os outros”.

“Não há necessidade de consultar um psicólogo para saber que quando você denigre o outro é porque você mesmo não consegue crescer e precisa que o outro seja rebaixado para você se sentir alguém”. E este é “um mecanismo feio”. Jesus, “com toda a simplicidade, afirma: ‘Não falem mal uns dos outros. Não se denigram, não se desqualifiquem’. E isto”, completou o papa, “porque, no fim das contas, nós estamos todos caminhando pela mesma estrada, todos seguimos esse caminho que nos levará até o final”. Portanto, “se não caminhamos de um jeito fraterno, vamos todos acabar mal: aquele que insulta e aquele que é insultado”. Francisco destacou que “se você não é capaz de dominar a língua, você se perde”. Além disso, “a agressividade natural, aquela que Caim teve contra Abel, se repete ao longo da história”. Não é que sejamos maus, disse o papa: “somos frágeis e pecadores”. Por isso, é “muito mais fácil tentar arrumar uma situação com um insulto, com uma calúnia, com uma difamação, do que solucioná-la por bem”. “Eu queria pedir ao Senhor, para todos nós, a graça de prestar mais atenção à língua, àquilo que nós dizemos dos outros. É ‘uma pequena penitência’, mas dá bons resultados”.

Às vezes “ficamos com fome” ao nos abster de comentários sobre o próximo e pensamos: “Que pena que eu não experimentei aquele gosto de um delicioso comentário sobre o outro”… Mas no fim, “essa fome frutifica e nos faz bem”. Por isso, temos que pedir ao Senhor esta graça: adaptar a nossa vida “a esta nova lei, que é a lei da mansidão, a lei do amor, a lei da paz, e pelo menos ‘podar’ um pouco a nossa língua, ‘podar’ um pouco os comentários que fazemos sobre os outros e as explosões que nos levam ao insulto e à ira fácil. Que Deus conceda esta graça a todos nós!”.

“Eu gostaria de agradecer a nosso Senhor”, concluiu o papa, “também pela feliz coincidência de que o arcebispo maior dos ucranianos, dom Sviatoslav Shevchuk, que foi bispo em Buenos Aires, esteja em Roma hoje para a reunião da Secretaria do Sínodo e tenha podido participar conosco desta nostalgia argentina”.