Beijar as feridas dos pobres e dos necessitados para encontrar o Deus vivo

Homilia do Papa Francisco: Só existe uma forma de realmente conhecer a Cristo – beijar as suas feridas nas pessoas que sofrem

Por Salvatore Cernuzio

ROMA, 03 de Julho de 2013 (Zenit.org) – São Tomé “foi um teimoso”, mas “Cristo quis justamente um teimoso” para afirmar plenamente a sua divindade. O papa Francisco, na missa de hoje na Casa Santa Marta, lança nova luz sobre a figura do apóstolo cuja festa litúrgica é celebrada hoje e que se tornou conhecido na história como “o incrédulo”.

Partindo do seu gesto de querer “tocar nas chagas de Cristo para acreditar”, o Santo Padre deu hoje mais uma indicação a quem quer seguir o caminho que leva até Deus: beijar as feridas de Jesus em nossos irmãos em necessidade.

Comentando o evangelho do dia, que fala da aparição de Jesus aos apóstolos depois da ressurreição, o papa destacou a ausência de Tomé. Um fato não casual: Cristo, disse o papa, “quis que ele esperasse uma semana”. Ele “sabe por que faz as coisas” e “dá para cada um de nós o tempo que acha melhor. Para Tomé, Ele deu uma semana”.

Quando o apóstolo vê Jesus se revelando com o seu corpo “limpo, belíssimo e cheio de luz”, mas ainda coberto de chagas, é “convidado a colocar o dedo na ferida dos pregos, a colocar a mão em seu lado trespassado”. Tomé, fazendo este gesto, “não disse ‘É verdade: o Senhor ressuscitou’, mas foi ainda mais longe”, disse o papa. Tomé afirmou: “Deus!” e o adorou, tornando-se “o primeiro dos discípulos a fazer a confissão da divindade de Cristo após a ressurreição”.

Isso explica “a intenção do Senhor ao fazê-lo esperar”, disse Bergoglio: “levar a sua descrença não apenas à afirmação da ressurreição, mas à afirmação da sua divindade”. Porque há somente um caminho “para o encontro com Jesus-Deus: as suas feridas. Não há outro”.

“Na história da Igreja”, prosseguiu Francisco, “houve alguns enganos no caminho rumo a Deus”. Alguns, disse ele, “acreditaram que o Deus vivo, o Deus dos cristãos, pode ser encontrado no caminho da meditação, indo ‘mais alto’ na meditação. Isso é perigoso”, alertou: “muitos se perderam nessa estrada, porque, mesmo que até possam ter chegado ao conhecimento de Deus, nunca chegaram ao de Jesus Cristo, Filho de Deus, segunda Pessoa da Santíssima Trindade”. É como “o caminho dos gnósticos”, disse o pontífice, que “são bons, que trabalham”, mas que não seguem o “caminho certo”, e sim outro caminho “muito complicado”, que “não leva a bom porto”.

Há outros, disse o Santo Padre, que “pensaram que, para chegar até Deus, devemos nos mortificar, ser austeros, e escolheram o caminho da penitência e do jejum”. Nem estes, no entanto, “chegaram até o Deus vivo, até Jesus Cristo Deus vivo”. Eles “são os pelagianos, que acreditam que podem chegar lá com o seu próprio esforço”, e que, portanto, erram completamente o caminho indicado por Jesus Cristo para encontrá-lo, isto é, “as suas chagas”.

O problema é entender como e onde estão essas chagas de Cristo. O papa Francisco respondeu a esta pergunta afirmando: “Nós encontramos as feridas de Jesus fazendo as obras de misericórdia, ao corpo e à alma, e eu destaco ‘ao corpo’, dos nossos irmãos e irmãs que sofrem, que passam fome, que têm sede, que estão nus, que são humilhados, que são escravos, que estão presos, que estão no hospital”.

“Essas são as chagas de Jesus hoje”, reiterou, “e Jesus nos pede um ato de fé nele através destas chagas”. É muito bom criar uma fundação para ajudar os necessitados, “mas se ficarmos só nesse âmbito, seremos apenas filantrópicos. Temos que tocar nas chagas de Jesus, acariciar as feridas de Jesus, cuidar das feridas de Jesus com ternura, temos que beijar as chagas de Jesus, e isso literalmente”. Como São Francisco, que, depois de abraçar o leproso, “viu a sua vida mudar”.

Em essência, concluiu o papa, “não precisamos de um curso de reciclagem para tocar no Deus vivo”, mas “simplesmente sair às ruas”, indo procurar, encontrar e tocar nas chagas de Cristo em quem é pobre, frágil, marginalizado. Uma coisa que não é simples nem natural. Por esta razão, exortou o Santo Padre, “peçamos a São Tomé a graça de ter a coragem de entrar nas feridas de Jesus com a nossa ternura e certamente teremos a graça de adorar o Deus vivo

“Saudade” e “curiosidade” nos amarram ao pecado

Na homilia de hoje o Papa Francisco exorta a ser corajosos em meio à fraqueza para continuar seguindo a estrada de nosso Senhor

Por Luca Marcolivio

ROMA, 02 de Julho de 2013 (Zenit.org) – Fugir do pecado, deixando-o para trás sem “saudades”: foi em torno a este assunto difícil que o papa Francisco articulou a homilia desta manhã, na Casa Santa Marta.

Participou da missa um grupo de sacerdotes e funcionários do Tribunal da Penitenciaria Apostólica, um grupo da Pontifícia Academia Eclesiástica e, como concelebrantes, o cardeal Manuel Monteiro de Castro e dom Beniamino Stella.

Nas situações “difíceis” ou “de conflito”, explicou o papa, as atitudes recorrentes são quatro: a primeira é a da “lentidão”, encontrada hoje em Lot, o protagonista da primeira leitura (cf. Gn 19,15-29).

Quando o anjo o aconselha a deixar para trás a sua cidade destruída, Lot obedece, mas com bastante hesitação: ele sofre “a incapacidade do desapego do mal e do pecado”. Por esta razão, começa até a negociar com o anjo.

Embora as situações de pecado sejam muitas vezes difíceis de superar, nosso Senhor sempre nos diz: “Fuja! Você não consegue lutar ali, porque o fogo e o enxofre vão matar você”.

Quem seguiu à risca este princípio foi Santa Teresinha do Menino Jesus, que reconhecia que, em determinadas tentações, “nós somos fracos e temos que fugir”: mas é uma fuga “para frente, para avançar no caminho de Jesus”, disse o Santo Padre.

O anjo disse a Lot: “Não olhes para trás”. Pediu-lhe vencer “a saudade do pecado”, na qual tinha caído o povo de Deus no deserto quando sentiu “saudades das cebolas do Egito”, esquecendo-se que aquelas cebolas eram servidas “à mesa da escravidão”.

É preciso, portanto, vencer a tentação da “curiosidade”, que, em situações de pecado, “não nos serve de nada”, mas apenas “nos prejudica”, advertiu o papa.

Uma terceira tentação a vencer, depois da “lentidão” e da “saudade” do pecado, é a do “medo”, que assalta os apóstolos durante uma tempestade no mar de Tiberíades (cf. Mt 8,23-27). Em pânico, eles exclamam: “Senhor, salva-nos, que perecemos!”. Ter “medo de avançar no caminho do Senhor” também é uma “tentação do diabo”. O medo “não é um bom conselheiro”, o que Jesus deixa claro diversas vezes, observou o Santo Padre.

A quarta atitude diante do pecado é virtuosa: é “a graça do Espírito Santo”. Diante da lentidão para combater o pecado, diante da saudade do pecado e diante do medo de avançar, devemos nos voltar para Deus e admitir: “Senhor, eu tenho essa tentação. Eu quero continuar nessa situação de pecado. Senhor, eu tenho a curiosidade de conhecer essas coisas. Senhor, eu tenho medo”.

O que nos salva é sempre “a maravilha do novo encontro com Jesus”, disse o papa Francisco. Mesmo na nossa fraqueza, “não somos cristãos ingênuos nem mornos, somos valentes, corajosos”, observou ele.

Mantendo-nos “corajosos em meio à nossa fraqueza”, devemos perseverar, não nos deixar levar pela “saudade ruim” nem pelo medo, olhando sempre para Deus, finalizou o papa.

Três pensamentos sobre o ministério petrino, guiados pelo verbo «confirmar»

Homilia pronunciada pelo Papa Francisco na Solenidade dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo

CIDADE DO VATICANO, 01 de Julho de 2013 (Zenit.org) – Apresentamos o texto da homilia pronunciada pelo Papa Francisco na Solenidade dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo e Santa Missa e imposição do pálio aos novos arcebispos metropolitanos celebrada sábado, 29 de junho, na Basílica Vaticana.

Senhores Cardeais,

Eminentíssimo Metropolita Ioannis, Venerados Irmãos no Episcopado e no Sacerdócio, Amados irmãos e irmãs!

Celebramos a solenidade dos Apóstolos São Pedro e São Paulo, padroeiros principais da Igreja de Roma; uma festa tornada ainda mais jubilosa pela presença de Bispos de todo o mundo. Uma enorme riqueza que nos faz reviver, de certa forma, o evento de Pentecostes: hoje, como então, a fé da Igreja fala em todas as línguas e quer unir os povos numa só família.

Saúdo cordialmente e com gratidão a Delegação do Patriarcado de Constantinopla, guiada pelo Metropolita Ioannis. Agradeço ao Patriarca ecuménico Bartolomeu I este novo gesto fraterno. Saúdo os Senhores Embaixadores e as Autoridades civis. Um obrigado especial ao Thomanerchor, o Coro da Thomaskirche [Igreja de São Tomé] de Lípsia – a igreja de Bach – que anima a Liturgia e constitui mais uma presença ecuménica.

Três pensamentos sobre o ministério petrino, guiados pelo verbo «confirmar». Em que é chamado a confirmar o Bispo de Roma?

1. Em primeiro lugar, confirmar na fé. O Evangelho fala da confissão de Pedro: «Tu és o Messias, o Filho de Deus vivo» (Mt 16, 16), uma confissão que não nasce dele, mas do Pai celeste. É por causa desta confissão que Jesus diz: «Tu és Pedro, e sobre esta Pedra edificarei a minha Igreja» (16, 18). O papel, o serviço eclesial de Pedro tem o seu fundamento na confissão de fé em Jesus, o Filho de Deus vivo, tornada possível por uma graça recebida do Alto. Na segunda parte do Evangelho de hoje, vemos o perigo de pensar de forma mundana. Quando Jesus fala da sua morte e ressurreição, do caminho de Deus que não corresponde ao caminho humano do poder, voltam ao de cima em Pedro a carne e o sangue: «Pedro começou a repreendê-Lo, dizendo: (…) Isso nunca Te há-de acontecer!» (16, 22). E Jesus tem uma palavra dura: «Afasta-te, Satanás! Tu és para Mim um estorvo» (16, 23). Quando deixamos prevalecer os nossos pensamentos, os nossos sentimentos, a lógica do poder humano e não nos deixamos instruir e guiar pela fé, por Deus, tornamo-nos pedra de tropeço. A fé em Cristo é a luz da nossa vida de cristãos e de ministros na Igreja!

2. Confirmar no amor. Na segunda leitura, ouvimos as palavras comoventes de São Paulo: «Combati o bom combate, terminei a corrida, permaneci fiel» (2 Tm 4, 7). Qual combate? Não é o das armas humanas, que, infelizmente, ainda ensanguenta o mundo, mas o combate do martírio. São Paulo tem uma única arma: a mensagem de Cristo e o dom de toda a sua vida por Cristo e pelos outros. E foi precisamente este facto de expor-se em primeira pessoa, deixar-se consumar pelo Evangelho, fazer-se tudo para todos sem se poupar, que o tornou credível e edificou a Igreja. O Bispo de Roma é chamado a viver e confirmar neste amor por Cristo e por todos, sem distinção, limite ou barreira. E não só o Bispo de Roma, mas todos vós, novos arcebispos e bispos, tendes o mesmo dever: deixar-se consumar pelo Evangelho, fazer-se tudo para todos. O dever de não se poupar, de se esquecer de si ao serviço do povo santo e fiel de Deus.

3. Confirmar na unidade. Aqui detenho-me a considerar o gesto que realizámos. O Pálio é símbolo de comunhão com o Sucessor de Pedro, «princípio e fundamento perpétuo e visível da unidade de fé e comunhão» (Conc. Ecum. Vat. II, Lumen gentium, 18). E hoje a vossa presença, amados Irmãos, é o sinal de que a comunhão da Igreja não significa uniformidade. Referindo-se à estrutura hierárquica da Igreja, o Concílio Vaticano II afirma que o Senhor «constituiu [os Apóstolos] em colégio ou grupo estável e deu-lhes como chefe a Pedro, escolhido de entre eles» (ibid., 19). Confirmar na unidade: o Sínodo dos Bispos, em harmonia com o primado. Devemos avançar por esta estrada da sinodalidade, crescer em harmonia com o serviço do primado. E continua o Concílio: «Este colégio, enquanto composto por muitos, exprime a variedade e universalidade do Povo de Deus» (ibid., 22). Na Igreja, a variedade, que é uma grande riqueza, sempre se funde na harmonia da unidade, como um grande mosaico onde todos os ladrilhos concorrem para formar o único grande desígnio de Deus. E isto deve impelir a superar sempre todo o conflito que possa ferir o corpo da Igreja. Unidos nas diferenças: não há outra estrada para nos unirmos. Este é o espírito católico, o espírito cristão: unir-se nas diferenças. Este é o caminho de Jesus! O Pálio, se é sinal da comunhão com o Bispo de Roma, com a Igreja universalcom o Sínodo dos Bispos é também um compromisso que obriga cada um de vós a ser instrumento de comunhão.

Confessar o Senhor deixando-se instruir por Deus, consumar-se por amor de Cristo e do seu Evangelho, ser servidores da unidade: estas são as incumbências que os Apóstolos São Pedro e São Paulo confiam a cada um de nós, amados Irmãos no Episcopado, para serem vividas por cada cristão. Sempre nos guie e acompanhe com a sua intercessão a Santíssima Mãe de Deus: Rainha dos Apóstolos, rogai por nós! Amen.

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Orar com insistência, até ser inconvenientes com Deus

Missa na Casa Santa Marta: papa Francisco explica que a oração não é pedir coisas a Deus, mas “negociar” com ele corajosamente, até cansá-lo

Por Salvatore Cernuzio

CIDADE DO VATICANO, 01 de Julho de 2013 (Zenit.org) – Rezem, rezem, rezem. Com coragem, insistentemente, “negociando” com Deus. A exortação do papa Francisco na missa de hoje na Casa Santa Marta é clara: não devemos nos dirigir a Deus com orações “descartáveis”, mas rezar até o ponto de ser inconvenientes com ele. A missa foi concelebrada com mons. Brian Farrell e com o cardeal Kurt Koch, acompanhado por um grupo de sacerdotes e de colaboradores do Pontifício Conselho para a Promoção da Unidade dos Cristãos.

O convite do Santo Padre parte da primeira leitura do dia, Gênesis 18, 16-33, que conta a história de Abraão: com coragem e persistência, ele se volta a Deus para salvar Sodoma da destruição. “Abraão é um bravo e reza com coragem”, disse o pontífice; ele “sente a força de falar cara a cara com o Senhor e procura defender a cidade”, inclusive com certa obstinação.

Existem diferentes tipos de coragem, explicou o papa: “Quando falamos de coragem, sempre pensamos na coragem apostólica, em ir pregar o evangelho, essas coisas… Mas há também a coragem diante do Senhor: aquela parresia diante do Senhor, de se dirigir a Ele corajosamente para pedir as coisas”.

Talvez, acrescentou o Santo Padre, seja algo “um pouco engraçado”. O próprio Abraão, na leitura de hoje, “fala com o Senhor de maneira especial”, disse o papa, a ponto de às vezes não sabermos se estamos “diante de um homem de oração ou de um comprador fenício, que vai puxando o preço para baixo, pechinchando. Ele insiste: de cinquenta, consegue baixar o preço para dez”.

“É engraçado”, reiterou o papa, mas “está tudo bem”, porque se realça a “atitude teimosa” que é necessária no diálogo com Deus. Às vezes, nós nos voltamos a Ele para “pedir uma coisa para uma pessoa” e acabamos pedindo outra, e outra e mais outra. “Isso não é a oração”, disse o papa Francisco. “Se você quer uma graça do Senhor, você tem que pedir com coragem e fazer o que Abraão fez, com insistência”.

Jesus nos ensina a orar com essa insistência, contando e reforçando episódios como o da viúva que recorre ao juiz, ou do homem que vai bater à porta do amigo à noite, ou da mulher siro-fenícia que pede repetidamente a cura da filha. Esta insistência “é muito cansativa”, disse o papa, mas “esta é a oração, isto é pedir uma graça de Deus”. Santa Teresa também “fala da oração como uma negociação com o Senhor”, diz Francisco. Isto só é possível quando se tem “a familiaridade com Deus”.

Rezar, portanto, “é negociar com Deus, até ser inoportunos com o Senhor”, insistiu Bergoglio: é “louvar o Senhor nas suas coisas boas e pedir que Ele dê aquelas coisas lindas a nós. E se Ele é tão misericordioso, tão bom, pedir que nos ajude”.

O papa fez um pedido pessoal e espontâneo no fim da homilia: “Eu gostaria que, hoje, todos nós, durante cinco minutos, não precisa mais do que isto, pegássemos a bíblia e, lentamente, rezássemos o Salmo 102: ‘Bendiz o Senhor, ó minha alma! Que tudo o que há em mim bendiga o seu nome! Não te esqueças de todos os seus benefícios. Ele perdoa todas as culpas, sara todas as feridas, salva a tua vida do fosso, te circunda de bondade e de misericórdia…’ ”.

Recitando essas palavras, explicou o Santo Padre, “vamos aprender as coisas que temos que dizer a Deus quando pedimos uma graça: ‘Tu, que és misericordioso, tu que me perdoas,me dáessa graça’, como pediu Abraão, como pediu Moisés”. Assim, concluiu Francisco, “vamos em frente na oração, corajosos, com esses ‘argumentos’ que vêm direto do próprio coração de Deus”.

Nosso Senhor entra em nossas vidas quando quer

Homilia do papa Francisco nesta sexta-feira: devemos ser pacientes e tentar ser irrepreensíveis

CIDADE DO VATICANO, 28 de Junho de 2013 (Zenit.org) – Nosso Senhor nos pede ser pacientes e sem máculas, caminhando sempre em sua presença, afirmou nesta manhã o papa Francisco durante a missa na Casa Santa Marta. O santo padre enfatizou que nosso Senhor sempre escolhe o seu próprio jeito para entrar em nossas vidas e isto nos exige paciência, porque Ele nem sempre se deixa ver. Segundo a Rádio Vaticano, participou da missa um grupo de funcionários do Departamento de Saúde e Higiene do Vaticano, acompanhados pelo diretor, doutor Patrizio Polisca.

Deus entra aos poucos na vida de Abraão, que tem 99 anos quando o Senhor lhe promete um filho. Mas entra imediatamente na vida do leproso: Jesus escuta a sua oração, o toca e faz o milagre. Na reflexão de hoje, Francisco partiu da primeira leitura e do evangelho do dia para mostrar como Deus decide se envolver “nas nossas vidas, na vida do seu povo”. “Quando nosso Senhor chega, ele nem sempre chega da mesma maneira. Não existe um protocolo da ação de Deus em nossa vida, não existe (…) Uma vez, ele vem de um jeito; outra vez, de outro”, mas sempre vem. “Sempre acontece o encontro entre nós e o Senhor”.

“Nosso Senhor sempre escolhe o modo de entrar em nossa vida, muitas vezes tão lentamente que corremos o risco de perder um pouco a paciência: ‘Mas, Senhor, quando?’. E oramos, oramos… E não chega a intervenção dele na nossa vida. Outras vezes, quando pensamos em tudo o que o Senhor nos prometeu, isso é tão grande que ficamos um pouco incrédulos, um pouco céticos, e, como Abraão, tentamos meio que esconder um sorriso… Esta primeira leitura diz que Abraão escondeu o rosto e sorriu… Um pouco de ceticismo: ‘Mas como é que eu, com quase cem anos, vou ter um filho, e a minha mulher, aos 90 anos, vai ter um filho?’”.

A mulher de Abraão, Sara, terá o mesmo ceticismo, recordou o papa. “Quantas vezes, quando o Senhor não faz o milagre e não nos dá o que nós queremos, nós ficamos impacientes ou céticos!”.

“Mas Ele não faz, não pode fazer para os céticos. Deus se concede o seu próprio tempo. Mas Ele, nessa relação conosco, tem muita paciência. Não somos só nós que temos que ter paciência: Ele tem! Ele nos espera! Ele nos espera até o final da vida! Pensemos no bom ladrão, justo no final; foi no final que ele reconheceu a Deus. O Senhor caminha conosco, mas muitas vezes não se deixa ver, como no caso dos discípulos de Emaús. Nosso Senhor está envolvido na nossa vida, isto é certo, mas muitas vezes nós não vemos. Isto nos exige paciência. Mas Deus, que caminha conosco, Ele também tem muita paciência conosco”.

O papa aprofundou assim, no “mistério da paciência de Deus, que, ao caminhar, caminha ao nosso ritmo”. Às vezes, na vida, constatou Francisco, “as coisas ficam muito escuras, há tanta escuridão que, se tivermos problemas, queremos descer da cruz”. Este “é o momento preciso: a noite é mais escura quando se aproxima a alvorada. E sempre que descemos da cruz, descemos cinco minutos antes que chegue a libertação, no momento maior da impaciência”.

“Jesus, na cruz, ouviu que o desafiavam: ‘Desce, desce! Vem para baixo!’. Paciência até o final, porque Ele tem paciência conosco. Ele sempre está envolvido conosco, mas do jeito dele e quando Ele acha melhor. Ele só nos diz o que disse a Abraão: ‘Caminha na minha presença e sê perfeito’, sê irrepreensível; esta é a palavra correta. Caminha na minha presença e tenta ficar acima de qualquer repreensão. Este é o caminho com o Senhor e Ele intervém, mas temos que esperar, esperar o momento, caminhando sempre na presença dele e procurando ser irrepreensíveis. Vamos pedir esta graça ao Senhor: caminhar sempre na sua presença, tentando ser irrepreensíveis”.

Ser cristãos sem Cristo

Na homilia na Casa Santa Marta, o papa nos convida a não ser “cristãos só de nome”, mas a construir a vida sobre a “rocha” que é Cristo, o único que dá segurança

Por Salvatore Cernuzio

ROMA, 27 de Junho de 2013 (Zenit.org) – “Ao longo da história da Igreja, tem havido duas classes de cristãos: os cristãos de nome –aqueles do ‘Senhor, Senhor, Senhor’- e os cristãos de ação, de verdade”. O papa Francisco partiu desta clara distinção para desenvolver a sua reflexão na missa de hoje, concelebrada com outros bispos e com o cardeal arcebispo de Aparecida, dom Raimundo Damasceno.

Como faz toda manhã, o Santo Padre deu hoje mais algumas pinceladas no desenho do rosto do verdadeiro cristão. Infelizmente, disse ele hoje, não há somente um tipo de cristãos, mas até mesmo cristãos com várias caras. Há os cristãos “de superfície”; há os muito “rígidos” e, portanto, muito “tristes”; há os “alegres”, mas sem a verdadeira alegria de Cristo, e, pior ainda, há os que “se mascaram de cristãos”. O denominador comum entre todos eles é o fato de não se fundamentarem na “rocha” da Palavra de Cristo, conforme relatava o evangelho do dia, escrito por Mateus: eles seguem “um cristianismo de nome, um cristianismo sem Jesus, um cristianismo sem Cristo”, observou o papa.

Nos séculos da Igreja, “sempre houve a tentação de viver o nosso cristianismo fora da rocha que é Cristo”, acrescentou. As pessoas se esquecem muitas vezes que Jesus é “o único que nos dá a liberdade de chamar Deus de Pai”, é o único que “nos sustenta nos momentos difíceis” e nos protege quando “cai a chuva, quando os rios transbordam, quando sopram os vendavais”. Porque quando se está fundamentado sobre a rocha, tem-se uma segurança. As palavras, enquanto isso, apenas “voam; não são suficientes”.

“Ser cristãos sem Cristo” é algo que “aconteceu e está acontecendo na Igreja hoje”, prosseguiu Francisco. Em particular, podemos identificar atualmente duas categorias. O cristão “gnóstico”, que, “em vez de amar a rocha, ama as belas palavras” e vive um “cristianismo líquido”, acreditando em Cristo, sim, mas não como “o que lhe dá fundamento”. E o cristão “pelagiano”, que se caracteriza por um estilo de vida “engomado”: pessoas que acreditam que “a vida cristã deve ser levada tão a sério que acabam confundindo solidez e firmeza com rigidez” e, por isso mesmo, pensam que “para ser cristão é preciso viver de luto”.

“Há muitos cristãosassim”, disse o Santo Padre. Mas também é errado chamá-los de cristãos, porque eles são apenas máscaras: “Eles não sabem quem é nosso Senhor, não sabem o que é a rocha, não têm a liberdade dos cristãos. E, para falar de um modo simples, eles não têm a verdadeira alegria”. No meio desse leque que abrange desde os supostamente “alegres” até aqueles que vivem perpetuamente de luto, esses crentes “não sabem o que é a felicidade cristã, não sabem aproveitar a vida que Jesus nos dá, porque não sabem falar com Jesus. Eles não se fundamentam em Jesus, com aquela firmeza que a presença de Jesus nos dá”, constatou Bergoglio.

E não apenas não têm alegria genuína, acrescentou o papa, como sequer têm liberdade: “Uns são escravos da superficialidade, de uma vida difusa, e outros são escravos da rigidez, não são livres. O Espírito Santo não tem lugar na vida deles. É o Espírito que nos dá a liberdade”. Nosso Senhor, portanto, concluiu o papa, “nos convida hoje a construir a nossa vida cristã com base nele, a rocha, aquele que nos dá a liberdade, aquele que nos envia o Espírito, que nos impele a caminhar com felicidade, pela sua estrada, nas suas propostas”.

Que os padres também sejam pais

O papa exorta os sacerdotes a pedirem a “graça” de uma “paternidade espiritual”

Por Salvatore Cernuzio

ROMA, 26 de Junho de 2013 (Zenit.org) – Os padres, mesmo celibatários, também devem ser “pais”. Não é uma proposta de mudança aventada pelo progressista de plantão, mas a mensagem do papa Francisco na missa de hoje, na Casa Santa Marta. A “paternidade” mencionada por Bergoglio não é “física”, e sim a paternidade espiritual dos padres no tocante às pessoas confiadas a eles. Uma “graça especial”, que só em alguns casos nosso Senhor concede.

O convite de hoje está ligado ao convite similar que o papa fez às oitocentas irmãs da União Internacional das Superioras Gerais, recebidas em audiência no dia 9 de maio na Sala Paulo VI, a ser “mães fecundas”. Sentir-se “pai” de um ser humano significa dar a vida por outro, explicou Bergoglio, e, nos torna semelhantes a Jesus Cristo, que morreu e ressuscitou por nós, pelos outros.

O “desejo de ser pai”, disse o papa, está inscrito “nas fibras mais profundas do homem”. Inclusive do padre, que orienta e vive esse desejo, mas de forma espiritual. “Quando um homem não tem esse desejo”, prosseguiu o pontífice, “algo falta nele”. Todos nós, para “ser completos, maduros, precisamos sentir a alegria da paternidade: também nós, celibatários”. Porque “a paternidade é dar a vida aos outros, dar vida, dar vida… Para nós, é a paternidade pastoral, a paternidade espiritual; mas é dar vida, é tornar-nos pais”.

A reflexão do papa foi sugerida pela passagem de hoje do Gênesis, em que Deus promete a Abraão a alegria de um filho e de uma descendência infinita, apesar da sua idade avançada. Abraão sacrifica então alguns animais, de acordo com as instruções de Deus, para selar o pacto, e, depois, defende o seu holocausto do ataque de aves de rapina. Uma cena comovente, na opinião do papa, porque “olhar para aquele nonagenário, com seu bastão”, defendendo o seu sacrifício, “me faz pensar num pai que defende a família, os filhos”.

Ser pai segundo a paternidade “espiritual” é “uma bênção” que todo sacerdote deve pedir, disse o pontífice. “Pecados nós temos muitos, mas isso é commune sanctorum: todos nós temos pecados. Mas não ter filhos, não ser pai, é como se a vida não chegasse ao fim. Ela para no meio do caminho”. Os próprios fieis, observou Bergolio, querem ver isso no padre: “As pessoas nos chamam de padre, de pai… Temos que ser pais pela graça da paternidade pastoral”.

“Demos graças a Deus por essa bênção da paternidade na Igreja, que passa de pai para filho”, continuou o papa. Nisto, é de exemplo a dupla imagem de “Abraão que pede um filho” e de “Abraão que defende a família”. Temos também “a imagem do velho Simeão no templo, que, quando recebe a vida nova, faz uma liturgia espontânea, a liturgia da alegria”.

Certamente não é coincidência, mas as palavras de hoje do papa Francisco “caíram como uma luva” para o público presente na capela da Casa Santa Marta: talvez, pela primeira vez nestes três meses, composto exclusivamente por prelados e sacerdotes.

Eles acompanhavam o cardeal Salvatore De Giorgi, arcebispo emérito de Palermo, que hoje celebrava o seu 60º aniversário de ordenação sacerdotal.

O papa Francisco recordou o aniversário na homilia, dirigindo ao cardeal ​​palavras afetuosas e cheias de estima pelo “marco” alcançado. “Eu não sei o que foi que fez o nosso querido Salvador”, disse o pontífice, mas “tenho certeza de que ele foi ‘pai’. Este é um sinal”, acrescentou, pedindo à multidão de religiosos que o acompanhavam a seguir o seu exemplo. “Agora é com vocês”, incitou Bergoglio, simpaticamente: cada árvore “dá o fruto de si mesma, e, se a árvore é boa, o fruto deve ser bom, certo?”. E concluiu: “Não façam feio!”.

Uma Igreja sem ideologias, seguindo o exemplo de São João Batista

O papa nos lembra a vocação da Igreja: “ser voz” da Palavra de Deus e proclamá-la “até o martírio”

Por Redacao

ROMA, 25 de Junho de 2013 (Zenit.org) – São João Batista era uma “lua”, cuja luz mostra o caminho para quem está no escuro, mas começa a diminuir à medida que nasce o sol do Cristo ressuscitado.

É sugestiva a imagem que o papa Francisco propôs ontem na missa da Casa Santa Marta, no dia de São João. O “profeta” é um símbolo da vocação da Igreja, chamada a anunciar, servir e proclamar até o martírio, não para aparecer ela própria, mas para divulgar a verdade do Evangelho.

Antes de iniciar a homilia, o papa saudou a todos os homens chamados “João”. Um nome importante, disse ele, porque nos lembra uma das principais figuras do cristianismo. Uma figura “nem sempre fácil de entender”.

Se olharmos para a vida de João Batista, prosseguiu o papa, parece que “tem algo que não fecha”: ele é um homem “que foi grande” desde o seio materno, que foi saudado como “profeta” e, no fim, “termina como um coitado”. A grandeza de João, no entanto, se distancia de qualquer concepção humana, e consiste em ser “uma voz no deserto”, como ele mesmo se define. Ele “é uma voz sem Palavra, porque a Palavra não é ele, mas Outro”. Ele “nunca se apodera da Palavra”, porque o “sentido da sua vida é apontar para Outro”, observou o pontífice.

Não por acaso, a Igreja escolheu comemorar a sua festa na época do ano em que, no hemisfério norte, os dias são mais longos e “têm mais luz”, disse Bergoglio. Um aspecto que ressalta o ser de João como um “homem da luz”, que “portava a luz”.

Não uma luz própria, mas uma “luz refletida”, como a da lua, que “começou a se apagar” com o início da pregação de Cristo. “Essa é a vocação de João: aniquilar-se”, disse o papa. E quando “contemplamos a vida deste homem, tão grande, tão poderoso”, a tal ponto que todos pensavam era ele o Messias, mas que se aniquila “até a escuridão do cárcere”, estamos contemplando “um grande mistério”.

“Nós não sabemos como foram os últimos dias de João”, continuou o papa. “Sabemos apenas que ele foi morto, que a cabeça dele foi colocada em uma bandeja, como um grande presente de uma dançarina para uma adúltera”. Sabemos que na prisão ele sofreu todo tipo de dor, de angústia e de dúvida: ele mesmo chamou os seus discípulos e os mandou até Jesus para lhe perguntar: “É você ou devemos esperar por outro?”. Nem isto “lhe foi poupado”, disse Bergoglio, acrescentando: “Eu não acho que seja possível descer mais ainda, aniquilar-se. Esse foi o fim de João”.

Mas, como todo martírio, também o de João Batista não aconteceu em vão, porque tem iluminado na Igreja o caminho a seguir, feito de sangue, pregação e verdadeira fé. “A figura de João me faz pensar muito na Igreja”, disse o pontífice. Ela “existe para proclamar, para ser a voz de uma Palavra, do seu Esposo, que é a Palavra”. “João podia se fazer de importante, podia falar de si mesmo”, mas ele apenas “indicava, ele se considerava uma voz, não a Palavra”.

Este é o “segredo” de João. É por este motivo que ele é santo. “Porque ele nunca, nunca tomou uma verdade como sua própria”, nunca “quis ser um ideólogo”, mas, ao contrário, “negou a si mesmo, para ressaltar somente a Palavra”.

Seguindo o seu exemplo, exortou Francisco, “nós, como Igreja, podemos pedir hoje a graça de não ser uma Igreja ideologizada”, mas uma Igreja “que é o mysterium lunae, que tem luz porque ela vem do seu Esposo, e que deve diminuir para que Ele cresça”; uma Igreja que “está sempre a serviço da Palavra” e que “nunca toma nada para si mesma”.

“Oremos”, pediu o papa Francisco, “para que o Senhor nos conceda o dom de ser a voz dessa Palavra, de pregar essa Palavra”, imitando João, “sem ideias próprias, sem um evangelho usado como propriedade nossa”, “até o martírio”.

Os pilares da salvação cristã

CIDADE DO VATICANO, 24 de Junho de 2013 (Zenit.org) – As riquezas e as preocupações do mundo nos fazem esquecer o passado, ficar confusos no presente e estar incertos quanto ao futuro. Elas nos fazem perder de vista os três pilares da história da salvação cristã: um Pai que, no passado, nos escolheu; que fez uma promessa para o nosso futuro e a quem nós demos uma resposta ao firmar com ele, no presente, uma aliança. Este é o sentido da reflexão proposta pelo papa Francisco na missa deste último sábado, 22 de junho, na Domus Sanctae Marthae, da qual participaram funcionários dos Museus do Vaticano.

A homilia do papa se baseou na passagem do evangelho de Mateus 6, 24-34, sobre as recomendações de Jesus aos discípulos: “Ninguém pode servir a dois senhores, porque há de odiar a um e amar o outro. Não podeis servir a Deus e às riquezas”. E continua: “Por isso vos digo: não vos preocupeis com a vossa vida, com o que haveis de comer ou beber”. Disse o papa: “O capítulo 13 de São Mateus nos ajuda a entender isso, ao narrar que Jesus explica aos seus discípulos a parábola do semeador. Ele diz que a semente que caiu no terreno cheio de espinhos foi sufocada. Mas o que a sufoca? Jesus diz: ‘as riquezas e as preocupações do mundo’. Vemos que Jesus tinha uma ideia clara sobre isso”.

Assim, “as riquezas e os cuidados do mundo sufocam a Palavra de Deus. Não a deixam crescer. E a Palavra morre porque não é protegida, é sufocada. São os casos em que prevalecem a riqueza e os cuidados do mundo, mas não a Palavra de Deus”.

Depois de ressaltar que Jesus, nas suas explicações para os discípulos, introduz o elemento temporal, o papa perguntou: “O que as riquezas e as preocupações causam em nós? Simplesmente nos roubam o tempo. Toda a nossa vida se sustenta em três pilares: um no passado; um no presente; o outro no futuro. E isso está claro na bíblia: o pilar do passado é a escolha. O Senhor nos escolheu. Cada um de nós pode dizer: ‘O Senhor me escolheu, me amou e me chamou, e, no batismo, me escolheu para seguir um caminho, o caminho cristão’”. O futuro é a promessa que Jesus fez aos homens: “Fui eleito para caminhar rumo a uma promessa. Ele nos fez uma promessa”. Finalmente, o presente “é a nossa resposta a esse Deus tão bom que me escolheu, que me faz uma promessa e que me propõe uma aliança. E eu faço uma aliança com ele”.

Escolha, promessa e aliança são os três pilares de toda a história da salvação. Mas pode acontecer, às vezes, que, “quando o nosso coração entra nisto que Jesus nos explica, ele corta o tempo. Corta o passado, corta o futuro e confunde o presente”. Isso acontece porque aquele “que está apegado às riquezas não se interessa pelo passado, nem pelo futuro; ele tem tudo. A riqueza é um ídolo. Ele não precisa de um passado, de uma promessa, de uma escolha, de futuro, de nada. O que o preocupa é o que pode acontecer”; por isso, ele “corta a sua relação com o futuro”, que, para ele, se torna um ‘futurível’”. Mas não o orienta para uma promessa e isso o deixa confuso, solitário. “É por isso que Jesus nos diz: ou Deus ou a riqueza, ou o reino de Deus e a sua justiça ou as preocupações”. Simplesmente nos convida a seguir a estrada desse presente tão grande que ele nos deu: ser os seus escolhidos. Com o batismo, nós fomos escolhidos no amor”, afirmou o pontífice.

“Não cortem o passado. Temos um Pai que nos colocou a caminho. E o futuro também é alegre, porque caminhamos em direção a uma promessa. O Senhor é fiel, não decepciona. E por isso, vamos caminhar!”, exortou o papa. Quanto ao presente,” façamos o que podemos, mas façamos na prática, sem ilusões e sem esquecer que temos um Pai no passado que nos escolheu”.

Por isso, acrescentou Francisco, “lembrem-se bem: a semente que cai entre os espinhos é sufocada, sufocada pelas riquezas e pelas preocupações do mundo”, dois elementos que nos fazem esquecer o passado e o futuro. Assim, “temos um Pai, mas vivemos como se não tivéssemos”, e deixamos o nosso futuro incerto. Desta forma, o presente também é “algo que não vai bem”. Mas é precisamente por esta razão, assegurou o papa, que “devemos confiar no Senhor que diz: ‘Não se preocupem, procurem o Reino de Deus e a sua justiça. Todo o resto virá’”.

Terminando a homilia, o papa exortou os fiéis a pedir ao Senhor a graça de não errar, dando peso às preocupações e à idolatria da riqueza, mas sempre lembrando que “temos um Pai que nos escolheu e que nos promete algo bom”. Devemos, por isto, “caminhar em direção àquela promessa, acolhendo o presente do jeito que ele vem”.

Francisco: “Nunca vi um caminhão de mudança atrás de um cortejo fúnebre”

Papa propõe uma reflexão na missa diária sobre não acumular riquezas na terra

Por Redacao

CIDADE DO VATICANO, 21 de Junho de 2013 (Zenit.org) – Pedir a Deus a graça de um coração que saiba amar e que não se deixe desviar por tesouros inúteis: esta é a substância da homilia do papa Francisco na Casa Santa Marta, durante a missa concelebrada nesta manhã com o cardeal Francisco Coccopalmerio, o bispo Juan Ignacio Arrieta e o auxiliar José Aparecido Gonçalves de Almeida, presidente, secretário e subsecretário do Pontifício Conselho para os Textos Legislativos, respectivamente, acompanhados por alguns dos funcionários do dicastério. Estavam presentes também os funcionários da Fábrica da Basílica de São João de Latrão, com mons. Santiago Ceretto, e os empregados da Casa Santa Marta.

Atesourar no céu

A luta pelo único tesouro que podemos levar conosco depois desta vida é a razão de ser de um cristão. É a razão de ser que Jesus explica aos discípulos, na passagem de hoje do evangelho de Mateus: “Onde estiver o teu tesouro, ali estará também teu coração”. A questão, explica o papa, é não confundir as riquezas. Há “tesouros arriscados” que seduzem, “mas que devemos abandonar”: aqueles acumulados durante a vida e que a morte destrói. Francisco observa com um toque de ironia: “Nunca vi um caminhão de mudança atrás de um cortejo fúnebre”. Mas há um tesouro que “podemos levar conosco”, um tesouro que ninguém pode nos roubar e que “não é o que você vem guardando para si”, mas sim “o que você dá para os outros”.

“O tesouro que damos aos outros é o tesouro que nós levamos. E esse vai ser o nosso mérito, entre aspas, mas é um ‘nosso mérito’ de Jesus Cristo em nós! E é isso o que nós temos que levar. E é aquilo que nosso Senhor nos deixa levar. O amor, a caridade, o serviço, a paciência, a bondade, a ternura são lindos tesouros: são os tesouros que nós levamos. Os outros, não”.

Conforme o evangelho, o tesouro que tem valor perante os olhos de Deus é aquele que acumulamos no céu a partir da terra. Mas Jesus, destaca o papa Francisco, dá um passo a mais: ele vincula o tesouro ao “coração”, criando uma “relação” entre os dois termos. Isto porque o nosso “é um coração inquieto”, que nosso Senhor “fez desse jeito para procurarmos por Ele”.

“Nosso Senhor nos criou inquietos para o encontrarmos, para crescermos. Mas se o nosso tesouro é um tesouro que não está perto dele, que não é do Senhor, então o nosso coração se inquieta por coisas que não duram, por esses tesouros… Muita gente, inclusive nós, está inquieta… Para ter isso, para comprar aquilo, e, no fim, o nosso coração se cansa, nunca está satisfeito: ele se cansa, fica preguiçoso, se torna um coração sem amor. O cansaço do coração. Vamos pensar nisso. O que é que eu tenho? Um coração cansado, que só quer se acomodar, três ou quatro coisas, uma boa conta bancária, isto, aquilo?  Ou um coração irrequieto, que procura sempre as coisas do Senhor? Essa inquietação do coração tem que ser cuidada sempre”.

Um coração que brilhe

Continua o papa Francisco: Cristo também coloca na berlinda o “olho”, que simboliza “a intenção do coração” e que se reflete no corpo: “um coração cheio de amor” deixa o corpo “brilhante”, enquanto um “coração mau” o torna escuro. Do contraste luz-escuridão, explica o papa, depende “o nosso parecer sobre as coisas”, como também é demonstrado pelo fato de que o gerador das guerras é um “coração de pedra”, “apegado a um tesouro da terra”, a “um tesouro egoísta”, que pode se transformar em um tesouro “do ódio”. Na oração final, o papa pediu, através da intercessão de São Luis Gonzaga, a quem a Igreja recorda hoje, “a graça de um coração novo”, um “coração de carne”.

“Deus torna humanos todos aqueles pedaços do coração que são feitos de pedra, com aquela inquietação positiva, com aquela ânsia boa de ir para frente, procurando por Ele, deixando-se buscar por Ele! Que nosso Senhor mude o nosso coração! E assim ele nos salvará. Ele nos protegerá dos tesouros que não nos ajudam para o nosso encontro com Ele, para servirmos aos outros, e nos dará a luz para ver e julgar de acordo com o verdadeiro tesouro: a sua verdade. Que nosso Senhor mude o nosso coração para procurarmos o verdadeiro tesouro e nos tornarmos pessoas luminosas e não pessoas da escuridão”.