Para rezar o pai-nosso: coração em paz com os irmãos

Papa Francisco na homilia: um Deus Pai, não um deus cósmico. Oração não é magia.

Por Salvatore Cernuzio

CIDADE DO VATICANO, 20 de Junho de 2013 (Zenit.org) – Para rezar o pai-nosso, precisamos ter o coração em paz com os nossos irmãos. É o que foi destacado nesta manhã pelo papa Francisco na missa da Casa Santa Marta. O papa ressaltou que acreditamos em um Deus que é Pai, que está muito perto de nós, que não é anónimo, que não é “um Deus cósmico”. A missa foi concelebrada, entre outros, pelo cardeal Zenon Grocholewski. Participaram um grupo de funcionários da Congregação para a Educação Católica e outro dos Museus Vaticanos.

“A oração não é magia”, mas um “confiar-se ao abraço do Pai”. O papa concentrou a homilia na oração do pai-nosso, que Jesus ensinou aos discípulos e da qual fala o evangelho de hoje. Jesus nos dá um conselho na oração: “Não desperdicem palavras, não façam mero barulho”, o barulho “do mundano, da vaidade”, disse o papa. “A oração não é uma coisa mágica, não se faz magia com a oração. Me disseram que, quando você procura um curandeiro, ele diz um monte de palavras para curar. Mas aquilo é pagão. O que Jesus nos ensina é: não temos que ir até Ele com muitas palavras, porque Ele já sabe tudo”. E completa: “A primeira palavra é pai, esta é a chave da oração. Sem dizer, sem escutar essa palavra, não se pode orar”.

“A quem eu devo orar? Ao Deus Todo-Poderoso? Distante demais. A quem devo orar? Ao Deus cósmico? Um tanto comum nos dias de hoje, não é? Orar ao Deus cósmico, não? Essa cultura politeísta, que tem essa cultura light… Nós temos que rezar ao nosso Pai! É uma palavra forte: Pai. Temos que orar àquele que nos gerou, que nos deu a vida. Ele não deu a vida ‘a todos’: todos é muito anônimo. Ele deu a vida a você, a mim. E também orar para aquele que nos acompanha no caminho: que conhece toda a nossa vida. Tudo: o que é bom e o que não é tão bom assim. Ele sabe tudo. Se não começamos a oração com essa palavra, dita não dos lábios para fora, mas de dentro do coração, então não podemos orar ‘em cristão’”.

A palavra “pai”, reiterou o papa, “é uma palavra forte”, mas que “abre as portas”. No momento do sacrifício, Isaac se dá conta de que “algo estava errado”, já que “faltava a ovelha”, mas ele confia no Pai. “Mais ainda: pai é a palavra em que pensou aquele filho que foi embora de casa com a sua parte da herança e que depois queria voltar para casa. E aquele pai ‘o vê chegar e vai correndo ao seu encontro’, se lança ao seu abraço para enchê-lo de amor.  E aquele ‘Pai, eu pequei’: esta é a chave de toda oração, sentir-se amado por um Pai”.

“Nós temos um Pai. E muito próximo, que nos abraça… Todas estas preocupações, inquietações que nós temos, vamos entregá-las ao Pai: ele sabe do que nós precisamos. Pai o quê, meu? Não, pai nosso! Porque eu não sou filho único, nenhum de nós é, e se eu não consigo ser um irmão, será difícil me tornar um filho desse Pai, porque ele é o pai de todos. Claro que é meu, mas também dos outros, dos meus irmãos. E se eu não estou em paz com os meus irmãos, não posso chamá-lo de pai”.

Isto explica o fato de que Jesus, depois de nos ensinar o pai-nosso, enfatiza que, se não perdoarmos aos outros, o Pai não nos perdoará os pecados. “É muito difícil perdoar aos outros, é muito difícil mesmo, porque sempre temos aquele pesar por dentro. Pensamos: ‘Você me aprontou, espera só…’, para ‘devolver’”.

“Não, não podemos orar com inimigos no coração, com irmãos e inimigos no coração. Isso é difícil, sim, é difícil, não é fácil. ‘Pai, eu não posso dizer Pai, não consigo’. É verdade, eu entendo. ‘Não posso dizer nosso, porque fulano me fez isso, aquilo e…’, enfim, não posso! ‘Aqueles lá merecem ir para o inferno’, não é assim? ‘Eles não são dos meus!’. Não é fácil. Mas Jesus nos prometeu o Espírito Santo: é ele que nos ensina, a partir de dentro, do coração, a dizer ‘Pai’ e ‘nosso’. Peçamos hoje ao Espírito Santo que ele nos ensine a dizer ‘Pai’ e a dizer ‘nosso’, selando a paz com todos os nossos inimigos”.

Como é difícil amar os nossos inimigos!

Casa Santa Marta: o papa Francesco enfatiza que amar o inimigo é o que nos torna mais parecidos com Cristo e nos convida a rezar para sermos capazes de perdoar

Por Salvatore Cernuzio

CIDADE DO VATICANO, 18 de Junho de 2013 (Zenit.org) – A força do cristão é a sua capacidade de amar. Amar especialmente aqueles que lhe fazem mal, aqueles que o odeiam. Não é um instinto natural, mas é o que Jesus nos pede se quisermos ficar mais próximos dele, que não se vingou de quem o traiu e pregou na cruz.

A partir desta reflexão, desenrolou-se a homilia do papa Francisco na missa desta manhã na Casa Santa Marta, concelebrada com o cardeal Giuseppe Versaldi e com a participação de alguns funcionários da Prefeitura para os Assuntos Econômicos da Santa Sé e dos Museus do Vaticano.

“Amar os nossos inimigos é muito difícil”, afirmou o papa. E não é questão de amar quem teve alguma briga conosco: as nossas próprias forças poderiam ser suficientes para isso. O que Jesus nos pede é amar aqueles que “decidem cometer um atentado e matar muitas pessoas”, disse o papa; aqueles que, “por amor ao dinheiro, não deixam os remédios chegarem até os idosos e os deixam morrer”; aqueles que procuram apenas “os seus próprios interesses, o seu próprio poder e provocam grandes males”. Como é possível amar essas pessoas?, perguntou Bergoglio.

“Parece muito difícil amar o inimigo”, prosseguiu. É uma graça que só Deus pode nos conceder, com a força que vem da oração por eles, para que “nosso Senhor mude os seus corações” e converta o nosso próprio coração. Porque “todos nós temos inimigos”, mas “nós mesmos, tantas vezes, nos tornamos inimigos dos outros em vez de amá-los”.

Este mandamento de Jesus parece ainda mais difícil de cumprir do que os outros: “Achamos que Jesus está nos pedindo demais! Deixamos isso para as freiras de clausura, que são santas; deixamos isso para as santas almas, porque na vida cotidiana não dá! Mas tem que dar! Jesus diz: Nós temos que fazer isto! Porque, caso contrário, somos como os publicanos, como os pagãos. Não somos cristãos”.

Jesus Cristo “nos diz duas coisas em particular”: primeiro, olhar para o Pai, que tem “amor por todos” e “faz nascer o seu sol sobre maus e bons e chover sobre os justos e os injustos”. E, segundo, ser “perfeitos como o vosso Pai celestial é perfeito”, “imitando o Pai naquela perfeição do amor”.

Jesus, reiterou o Santo Padre, “perdoa os seus inimigos”, “faz de tudo para perdoá-los” porque os cristãos não procuram vingança: a sua arma é a oração. “Rezar”, exclamou Francisco, “é o que Jesus nos aconselha: orai pelos vossos inimigos! Orai por aqueles que vos perseguem! Orai! E dizei a Deus: Muda, Senhor, o coração dele. Ele tem um coração de pedra, dá-lhe um coração de carne, sensível e que ame”. “Quando se reza por quem nos faz sofrer”, acrescentou o papa, “é como se Deus chegasse com seu bálsamo e preparasse os nossos corações para a paz”.

O Santo Padre convidou todos os presentes a fazer uma pergunta em seu coração: “Eu rezo pelos meus inimigos? Eu oro por aqueles que não me amam? Se dissermos que sim, eu direi: Então vamos em frente, vamos orar mais ainda; este é um bom caminho. Se a resposta for não, então nosso Senhor nos diz: Pobre homem… Você também é inimigo dos outros”.

Amar até mesmo quem “aprontou das grandes” ou quem comete más ações “empobreceria as pessoas”? É “com essa desculpa que nós queremos vingança, olho por olho, dente por dente”. Não só isso: “De acordo com os critérios do mundo, não é um bom negócio” amar que nos faz sofrer: além de ser difícil, isso também “nos empobreceria”.

Amar o inimigo, porém, explicou o papa, “nos torna pobres”, sim, mas com a mesma pobreza de Jesus, que se fez pobre “quando veio até nós e se rebaixou”. Ele, sendo rico, se fez pobre, e “nesse rebaixamento é que está a graça que justificou a todos nós, que nos tornou ricos”: o “mistério da salvação”. “O amor nos empobrece, mas com aquela pobreza que é a semente da fertilidade e do amor ao próximo”, ressaltou o papa.

“Seria muito bonito oferecermos a missa, o sacrifício de Jesus, por aqueles que não nos amam. Seria bom para eles, mas também para nós, para que Deus nos ensine esta sabedoria tão difícil, mas tão bela, que nos assemelha ao nosso Pai que traz a luz do sol para todos, tanto bons quanto maus”.

Jesus é o “tudo” e é disto que deriva a sua magnanimidade

Homilia do Santo Padre Francisco na missa diaria celebrada na capela da Casa Santa Marta

ROMA, 17 de Junho de 2013 (Zenit.org) – Para os cristãos, Jesus é o “tudo” e é disto que deriva a sua magnanimidade: esta foi a mensagem enfatizada pelo papa Francisco na missa desta manhã na Casa Santa Marta.

O papa reiterou que a justiça trazida por Jesus é superior à dos escribas, ao “olho por olho, dente por dente”. Na missa, que foi concelebrada pelo cardeal Attilio Nicora, estavam presentes, entre outros, os funcionários da Autoridade de Informação Financeira e um grupo de funcionários dos Museus do Vaticano, acompanhados pelo diretor administrativo, dom Paolo Nicolini. Também participou da missa o cardeal arcebispo de Manila, Luis Antonio Tagle.

“Se alguém te bater na face direita, oferece-lhe também a outra”. O papa Francisco centrou a homilia nestas palavras perturbadoras de Jesus aos discípulos. Esse tapa, observou o pontífice, já “se tornou um clássico para ridicularizar os cristãos”. Na vida, afinal, a “lógica do dia-a-dia” nos diz que “devemos lutar, devemos defender o nosso espaço” e, se nos derem um tapa, “vamos devolver dois, para nos defender”. Além disso, prosseguiu Francisco, “quando eu aconselho os pais sobre como repreender seus filhos, sempre alerto: ‘Mas nunca batam na face deles’, porque ‘a face é a dignidade’. Jesus, no entanto, nos surpreende: depois de falar sobre oferecer a outra face, ele nos ensina a entregar também o nosso manto, a despojar-nos de tudo”.

“A justiça que Ele traz é uma justiça totalmente diferente do ‘olho por olho, dente por dente’. É outra justiça”. Podemos entendê-la quando São Paulo fala dos cristãos como “pessoas que não têm nada” e que, ao mesmo tempo, “têm tudo”. A segurança cristã está justamente nesse “tudo”, que Jesus. As outras coisas são “nada” para o cristão. “Para o espírito do mundo, o ‘tudo’ são as coisas: a riqueza, as vaidades”, e o “nada” é Jesus. Se um cristão caminha cem quilômetros quando lhe pedem caminhar dez, “é porque, para ele, isso é ‘nada’”, e, com serenidade, ele “pode ​​dar o manto quando lhe pedem a túnica”. Este é o “segredo da magnanimidade cristã, que sempre caminha junto com a mansidão”: é o “tudo”; é Jesus Cristo.

“O cristão é uma pessoa que engrandece o próprio coração com essa magnanimidade, porque ela tem o ‘tudo’, que é Jesus Cristo. As outras coisas são o ‘nada’. São boas, são úteis, mas, no momento do confronto, ele sempre escolhe o ‘tudo’, com aquela brandura, com aquela mansidão cristã que é a marca dos discípulos de Jesus: mansidão e magnanimidade. E viver assim não é fácil, porque “nós realmente levamos muitas bofetadas, não é mesmo? E nas duas faces! Mas o cristão é humilde, o cristão é magnânimo: ele dilata o seu coração. Mas quando encontramos aqueles cristãos de coração reduzido, de coração encolhido… aquilo não é cristianismo: é egoísmo disfarçado de cristianismo”.

“O verdadeiro cristão sabe resolver essa oposição bipolar, essa tensão entre o tudo e o nada, do jeito que Jesus recomendou: ‘Buscai primeiro o Reino de Deus e a sua justiça, e o resto virá por acréscimo’. O Reino de Deus é o ‘tudo’, o resto é secundário, não é principal. E todos os erros cristãos, todos os erros da Igreja, todos os nossos erros, nascem daqui, quando dizemos que o nada é tudo e que o tudo… bom, parece que ele não conta…  Seguir Jesus não é fácil, não é fácil. Mas também não é difícil, porque, no caminho do amor, Deus faz as coisas de modo que possamos seguir em frente. Deus mesmo engrandece o nosso coração”.

Esta é a oração que nós temos que fazer “diante dessas propostas do tapa, do manto, dos cem quilômetros”: devemos orar ao Senhor para engrandecer “os nossos corações”, para “sermos generosos, humildes” e para não lutarmos “por coisas insignificantes, pelo nada de cada dia”.

“Quando se faz uma opção pelo nada, nascem daquela opção os desencontros na família, nas amizades, com os amigos, com a sociedade; são confrontos que terminam em guerra: em guerra pelo nada! O nada é sempre semente de guerra! Porque é semente do egoísmo. O tudo é o que é grandioso, é Jesus. Peçamos ao Senhor a graça de engrandecer o nosso coração, para sermos humildes, mansos e magnânimos, porque nele nós temos o tudo; e que Ele nos livre de criar problemas cotidianos em torno do nada”.

Deus leva à vida ao passo que seguir os ídolos leva à morte

Homilia do Papa Francisco pronunciada na Santa Missa por ocasião da Jornada pela Vida


CIDADE DO VATICANO, 16 de Junho de 2013 (Zenit.org) – Às 10:30 de hoje, XI Domingo do Tempo Comum, na Praça de São Pedro, o Santo Padre Francisco celebrou a missa pela Jornada Evangelium Vitae, por ocasião do Ano da Fé. Apresentamos a seguir o texto da homilia pronunciada pelo Papa após a leitura do Santo Evangelho.

Amados irmãos e irmãs!

Esta celebração tem um nome muito belo: o Evangelho da Vida. Com esta Eucaristia, no Ano da Fé, queremos agradecer ao Senhor pelo dom da vida, em todas as suas manifestações, e ao mesmo tempo queremos anunciar o Evangelho da Vida.

Partindo da Palavra de Deus que escutámos, gostava de vos propor simplesmente três pontos de meditação para a nossa fé: primeiro, a Bíblia revela-nos o Deus Vivo, o Deus que é Vida e fonte da vida; segundo, Jesus Cristo dá a vida e o Espírito Santo mantém-nos na vida; terceiro, seguir o caminho de Deus leva à vida, ao passo que seguir os ídolos leva à morte.

1. A primeira leitura, tirada do Segundo Livro de Samuel, fala-nos de vida e de morte. O rei David quer esconder o adultério cometido com a esposa de Urias, o hitita, um soldado do seu exército, e, para o conseguir, manda colocar Urias na linha da frente para ser morto em batalha. A Bíblia mostra-nos o drama humano em toda a sua realidade, o bem e o mal, as paixões, o pecado e as suas consequências. Quando o homem quer afirmar-se a si mesmo, fechando-se no seu egoísmo e colocando-se no lugar de Deus, acaba por semear a morte. Exemplo disto mesmo é o adultério do rei David. E o egoísmo leva à mentira, pela qual se procura enganar a si mesmo e ao próximo. Mas, a Deus, não se pode enganar, e ouvimos as palavras que o profeta disse a David: Tu praticaste o mal aos olhos do Senhor (cf. 2 Sam 12, 9). O rei vê-se confrontado com as suas obras de morte– na verdade o que ele fez é uma obra de morte, não de vida! –, compreende e pede perdão: «Pequei contra o Senhor» (v. 13); e Deus misericordioso, que quer a vida e sempre nos perdoa, perdoa-lhe, devolve-lhe a vida; diz-lhe o profeta: «O Senhor perdoou o teu pecado. Não morrerás». Que imagem temos de Deus? Quem sabe se nos aparece como um juiz severo, como alguém que limita a nossa liberdade de viver?! Mas toda a Escritura nos lembra que Deus é o Vivente, aquele que dá a vida e indica o caminho da vida plena. Penso no início do Livro do Génesis: Deus plasma o homem com o pó da terra, insufla nas suas narinas um sopro de vida e o homem torna-se um ser vivente (cf. 2, 7). Deus é a fonte da vida; é devido ao seu sopro que o homem tem vida, e é o seu sopro que sustenta o caminho da nossa existência terrena. Penso também na vocação de Moisés, quando o Senhor Se apresenta como o Deus de Abraão, de Isaac e de Jacob, como o Deus dos viventes; e, quando enviou Moisés ao Faraó para libertar o seu povo, revela o seu nome: «Eu sou aquele que sou», o Deus que Se torna presente na história, que liberta da escravidão, da morte e traz vida ao povo, porque é o Vivente. Penso também no dom dos Dez Mandamentos: uma estrada que Deus nos indica para uma vida verdadeiramente livre, para uma vida plena; não são um hino ao «não» – não deves fazer isto, não deves fazer aquilo, não deves fazer aqueloutro… Não! – São um hinoao «sim» dito a Deus, ao Amor, à vida. Queridos amigos, a nossa vida só é plena em Deus,porque sóEle é o Vivente!

2. A passagem do Evangelho de hoje permite-nos avançar mais um passo. Jesus encontra uma mulher pecadora durante um almoço em casa de um fariseu, suscitando o escândalo dos presentes: Jesus deixa-Se tocar por uma pecadora e até lhe perdoa os pecados, dizendo: «São-lhe perdoados os seus muitos pecados, porque muito amou; mas àquele a quem pouco se perdoa, pouco ama» (Lc 7, 47). Jesus é a encarnação do Deus Vivo, Aquele que traz a vida fazendo frente a tantasobras de morte, fazendo frente ao pecado, ao egoísmo, ao fechamento em si mesmo. Jesus acolhe, ama, levanta, encoraja, perdoa e dá novamente a força de caminhar, devolve a vida. Ao longo do Evangelho, vemos como Jesus, por gestos e palavras, traz a vida de Deus que transforma. É a experiência da mulher que unge com perfume os pés do Senhor: sente-se compreendida, amada, e responde com um gesto de amor, deixa-se tocar pela misericórdia de Deus e obtém o perdão, começa uma vida nova. Deus, o Vivente, é misericordioso. Estais de acordo? Digamo-lo juntos: Deus, o Vivente, é misericordioso! Todos: Deus, o Vivente, é misericordioso. Outra vez: Deus, o Vivente, é misericordioso!

Esta foi também a experiência do apóstolo Paulo, como ouvimos na segunda leitura: «A vida que agora tenho na carne, vivo-a na fé do Filho de Deus, que me amou e a Si mesmo Se entregou por mim» (Gl 2, 20). E que vida é esta? É a própria vida de Deus. E quem nos introduz nesta vida? É o Espírito Santo, dom de Cristo ressuscitado; é Ele que nos introduz na vida divina como verdadeiros filhos de Deus, como filhos no Filho Unigénito, Jesus Cristo. Estamos nós abertos ao Espírito Santo? Deixamo-nos guiar por Ele? O cristão é um homem espiritual, mas isto não significa que seja uma pessoa que vive «nas nuvens», fora da realidade, como se fosse um fantasma. Não! O cristão é uma pessoa que pensa e age de acordo com Deus na vida quotidiana, uma pessoa que deixa que a sua vida seja animada, nutrida pelo Espírito Santo, para ser plena, vida de verdadeiros filhos. E isto significa realismo e fecundidade. Quem se deixa conduzir pelo Espírito Santo é realista, sabe medir e avaliar a realidade, e também é fecundo: a sua vida gera vida em redor.

3. Deus é o Vivente, é o Misericordioso. Jesus traz-nos a vida de Deus, o Espírito Santo introduz-nos e mantém-nos na relação vital de verdadeiros filhos de Deus. Muitas vezes, porém – sabemo-lo por experiência –, o  homem não escolhe a vida, não acolhe o «Evangelho da vida», mas deixa-se guiar por ideologias e lógicas que põem obstáculos à vida, que não a respeitam, porque são ditadas pelo egoísmo, o interesse pessoal, o lucro, o poder, o prazer, e nãosão ditadas pelo amor, a busca do bem do outro. É a persistente ilusão de querer construir a cidade do homem sem Deus, sem a vida e o amor de Deus: uma nova Torre de Babel; é pensar que a rejeição de Deus, da mensagem de Cristo, do Evangelho da Vida leve à liberdade, à plena realização do homem. Resultado: o Deus Vivo acaba substituído por ídolos humanos e passageiros, que oferecem o arrebatamento de um momento de liberdade, mas no fim são portadores de novas escravidões e de morte. O Salmista diz na sua sabedoria: «Os mandamentos do Senhor são rectos, alegram o coração; os preceitos do Senhor são claros, iluminam os olhos» (Sal 19, 9). Recordemo-nos sempre disto: O Senhor é o Vivente, é misericordioso. O Senhor é o Vivente, é misericordioso.

Amados irmãos e irmãs, consideremos Deus como o Deus da vida, consideremos a sua lei, a mensagem do Evangelho como um caminho de liberdade e vida. O Deus Vivo faz-nos livres! Digamos sim ao amor e não ao egoísmo, digamos sim à vida e não à morte, digamos sim à liberdade e não à escravidão dos numerosos ídolos do nosso tempo; numa palavra, digamos sim a Deus, que é amor, vida e liberdade, e jamais desilude (cf. 1 Jo 4, 8; Jo 8, 32; 11, 2), digamos sim a Deus que é o Vivente e o Misericordioso. Só nos salva a fé no Deus Vivo; no Deus que, em Jesus Cristo, nos concedeu a sua vida com o dom do Espírito Santo e nos faz viver como verdadeiros filhos de Deus com a sua misericórdia. Esta fé torna-nos livres e felizes. Peçamos a Maria, Mãe da Vida, que nos ajude a acolher e testemunhar sempre o «Evangelho da Vida». Assim seja.

Reconhecer-se com sinceridade como frágeis e pecadores

Homilia de hoje do papa Francisco na Casa Santa Marta

Por Redacao

CIDADE DO VATICANO, 14 de Junho de 2013 (Zenit.org) – A única maneira de receber verdadeiramente o dom da salvação de Cristo é reconhecer-se com sinceridade como frágeis e pecadores, evitando toda forma de autojustificação. Esta foi uma das ideias desenvolvidas na homilia do papa Francisco na missa desta manhã, na capela da Casa Santa Marta.

Com o papa, concelebraram o prefeito e secretário da Congregação para o Clero, cardeal Mauro Piacenza, e o arcebispo Celso Morga, acompanhados pelos presbíteros e pelo pessoal do dicastério. De acordo com a Rádio Vaticano, também estiveram  presentes o cardeal Giuseppe Bertello, o bispo de Humahuaca, na Argentina, dom Pedro Olmedo Rivero, e o bispo emérito de Daet, Filipinas, dom Benjamin Almoneda.

Somos pecadores

Consciente de ser um frágil recipiente de barro, o guardião de um grande tesouro recebido de forma totalmente gratuita: este é o seguidor de Cristo perante o Senhor. Francisco concentra a sua reflexão na Carta de Paulo aos cristãos de Corinto, mediante a qual ele explica que o “poder extraordinário” da fé é obra de Deus, vertida em homens pecadores, como em “vasos de barro”. Mas da relação “entre a graça e o poder de Jesus Cristo” e nós, pobres pecadores, brota “o diálogo da salvação.” Esse diálogo, acrescenta o papa, deve evitar, no entanto, qualquer “autojustificação; (…) deve ser feito do jeito que nós somos”.

“Paulo falou muitas vezes dos seus pecados, como um estribilho, não é? ‘Eu lhes digo: eu fui um perseguidor da Igreja, eu persegui…’. O pecado sempre volta à lembrança dele. Ele se sente pecador. Mas, apesar disso, ele não diz: ‘Eu fui pecador, mas agora sou santo’. Não. Mesmo agora, ele fala de ‘um aguilhão de Satanás na minha carne’. Ele nos faz ver a nossa própria fraqueza. O próprio pecado. É um pecador que acolhe Jesus Cristo. Que fala com Jesus Cristo”.

O crucial, indica o papa, é, portanto, a humildade. Paulo mesmo a demostra. Ele reconhece publicamente o seu “currículo de serviço”, tudo o que foi feito como apóstolo enviado por Jesus. Mas, nem por isto, ele oculta ou esconde o que o papa chama de “seu prontuário”: os seus pecados.

Viver em humildade

“Este é o modelo de humildade para nós, presbíteros. Se nos orgulhamos só do nosso currículo e de mais nada, vamos terminar mal. Não podemos proclamar Jesus Cristo Salvador, porque, no fundo, não o sentimos. Mas temos que ser humildes, com uma verdadeira humildade, com nome e sobrenome: ‘Sou um pecador por isto, por isto e por isto’. Como Paulo: ‘Eu persegui a Igreja’. Como ele reconhece: pecadores concretos. Não pecadores com aquela humildade que mais parece uma cara de panfleto. Ah, não, uma humildade firme”.

“A humildade do presbítero, a humildade do cristão, é concreta”, afirma o papa Francisco. Se um cristão não consegue “fazer por si mesmo esta confissão, alguma coisa está mal”: é não ser capaz de “entender a beleza da salvação que Jesus nos traz”.

Cristo, nosso tesouro

“Irmãos, temos um tesouro: Jesus Cristo, o Salvador. A cruz de Jesus Cristo, aquele tesouro do qual nos sentimos orgulhosos. Mas nós o guardamos numa panela de barro. Podemos nos vangloriar também do nosso prontuário, dos nossos pecados. E, assim, o diálogo é cristão e católico: concreto, porque a salvação de Jesus Cristo é concreta. Jesus Cristo não nos salvou com uma ideia, com um programa intelectual. Não. Ele nos salvou com a carne, com o concreto da carne. Ele se rebaixou, se fez homem, se fez carne até o fim. Mas isto só pode ser entendido, recebido, em vasos de barro”.

A mulher samaritana que encontra Jesus, depois de falar com ele, conta aos seus vizinhos o seu pecado, e, depois de encontrar o Senhor, se comporta de maneira semelhante a Paulo. “Eu acredito”, observa o papa Francisco, “que esta mulher com certeza está no céu. Porque, como diz Manzoni, ‘eu nunca vi nosso Senhor começar um milagre sem terminá-lo bem’, e este milagre que Ele começou, definitivamente, foi bem acabado no céu”.

“Peçamos”, encerra o papa, “que Ele nos ajude a ser vasos de barro para guardar e entender o mistério glorioso de Jesus Cristo”.

Não falem mal uns dos outros

Homilia do Papa Francisco na missa desta manhã na capela da Casa Santa Marta

CIDADE DO VATICANO, 13 de Junho de 2013 (Zenit.org) – Que Deus nos conceda a graça de prestar atenção aos comentários que fazemos sobre os outros: esta foi a ideia central da homilia do papa Francisco na missa desta manhã, na Casa Santa Marta.

O papa fez a homilia em espanhol, com a presença dos funcionários das embaixadas e consulados da Argentina na Itália e junto à FAO. “Desde o dia 26 de fevereiro que eu não celebrava a missa em espanhol”, disse o papa. “Estou muito feliz”, completou, e agradeceu aos participantes pelo trabalho que fazem em prol do seu país.

“Que a sua justiça seja maior que a dos fariseus”: Francisco explicou sua homilia partindo da exortação que Jesus fez aos discípulos. Palavras que vêm depois das bem-aventuranças e depois de Jesus afirmar que não veio para dissolver a lei, mas para levá-la a cumprimento. A reforma de Cristo, destacou o papa, “é uma reforma que não rompe, uma reforma na continuidade: da semente até o fruto”. Aquele que “entra na vida cristã tem exigências superiores às dos outros; não tem vantagens superiores”, advertiu.

Jesus menciona algumas dessas necessidades e toca em particular “no tema da relação negativa com os irmãos”. Quem fala mal dos outros, diz Jesus, “merece o inferno”. Se no seu coração existe “algo de negativo” no tocante ao seu irmão, então “existe algo que não funciona. Você tem que se converter, tem que mudar”. E mais: “A ira é um insulto contra o irmão, é algo que o mata”. Francisco observou também que, em especial na tradição latina, existe uma certa “criatividade maravilhosa” para inventar qualificativos: “Quando esse apelido é amistoso, tudo bem; o problema é quando existe o outro tipo de apelidos”, quando acontece “o mecanismo do insulto, uma forma de denegrir os outros”.

“Não há necessidade de consultar um psicólogo para saber que quando você denigre o outro é porque você mesmo não consegue crescer e precisa que o outro seja rebaixado para você se sentir alguém”. E este é “um mecanismo feio”. Jesus, “com toda a simplicidade, afirma: ‘Não falem mal uns dos outros. Não se denigram, não se desqualifiquem’. E isto”, completou o papa, “porque, no fim das contas, nós estamos todos caminhando pela mesma estrada, todos seguimos esse caminho que nos levará até o final”. Portanto, “se não caminhamos de um jeito fraterno, vamos todos acabar mal: aquele que insulta e aquele que é insultado”. Francisco destacou que “se você não é capaz de dominar a língua, você se perde”. Além disso, “a agressividade natural, aquela que Caim teve contra Abel, se repete ao longo da história”. Não é que sejamos maus, disse o papa: “somos frágeis e pecadores”. Por isso, é “muito mais fácil tentar arrumar uma situação com um insulto, com uma calúnia, com uma difamação, do que solucioná-la por bem”. “Eu queria pedir ao Senhor, para todos nós, a graça de prestar mais atenção à língua, àquilo que nós dizemos dos outros. É ‘uma pequena penitência’, mas dá bons resultados”.

Às vezes “ficamos com fome” ao nos abster de comentários sobre o próximo e pensamos: “Que pena que eu não experimentei aquele gosto de um delicioso comentário sobre o outro”… Mas no fim, “essa fome frutifica e nos faz bem”. Por isso, temos que pedir ao Senhor esta graça: adaptar a nossa vida “a esta nova lei, que é a lei da mansidão, a lei do amor, a lei da paz, e pelo menos ‘podar’ um pouco a nossa língua, ‘podar’ um pouco os comentários que fazemos sobre os outros e as explosões que nos levam ao insulto e à ira fácil. Que Deus conceda esta graça a todos nós!”.

“Eu gostaria de agradecer a nosso Senhor”, concluiu o papa, “também pela feliz coincidência de que o arcebispo maior dos ucranianos, dom Sviatoslav Shevchuk, que foi bispo em Buenos Aires, esteja em Roma hoje para a reunião da Secretaria do Sínodo e tenha podido participar conosco desta nostalgia argentina”.

“Nem ir para trás, nem um progressismo adolescente”

Papa Francisco convida: Abrir-se à liberdade do Espírito Santo

Por Redacao

ROMA, 12 de Junho de 2013 (Zenit.org) – Não devemos ter medo da liberdade que o Espírito Santo nos dá. Este foi um dos destaques da homilia do papa Francisco na missa de hoje, celebrada na Casa Santa Marta. Francisco ressaltou que a Igreja precisa ter cuidado com duas tentações: a de voltar para trás e a do “progressismo adolescente”.

Concelebraram com o papa o cardeal emérito Bernard Agre, da Costa do Marfim, e o cardeal brasileiro João Braz de Aviz, prefeito da Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e para as Sociedades de Vida Apostólica. Também participou um grupo de presbíteros, religiosos e leigos deste mesmo dicastério.

Maduros perante a lei

“Não pensem que eu vim suprimir a lei”. Francisco desenrolou a homilia a partir destas palavras de Jesus aos discípulos e indicou que esta passagem segue a das bem-aventuranças, “expressão da nova lei”, mais exigente que a de Moisés. Esta lei, acrescentou o papa, é “o fruto da aliança” e não pode ser entendida sem ela. “Esta aliança, esta lei, é sagrada porque levava as pessoas para Deus”. Francisco comparou a “maturidade desta lei” com o “broto que surge e se transforma em flor”. Jesus “é a expressão da maturidade da lei”, disse o pontífice, e Paulo nos fala de dois tempos “sem ruptura da continuidade” entre a lei da história e a lei do Espírito:

“O tempo do cumprimento da lei, o momento em que a lei alcança a maturidade, é a lei do Espírito. Avançar neste caminho é um pouco arriscado, mas é a única forma de amadurecer, para superar as vezes em que não fomos maduros. Neste caminho para a maturidade da lei, que é indicado precisamente pela pregação de Jesus, sempre existe o medo, o medo da liberdade que o Espírito nos dá. A lei do Espírito que nos torna livres! Esta liberdade nos dá um pouco de medo, porque temos medo de confundir a liberdade do Espírito com outra liberdade humana”.

Não voltar para trás

A lei do Espírito, reforçou o papa, “nos guia por uma estrada de contínuo discernimento para fazer a vontade de Deus e isto nos dá medo”. Um medo que “tem duas tentações”. A primeira é a de “voltar para trás”, de dizer “até aqui nós podíamos chegar, mas não podemos ir até lá, vamos ficar por aqui”. Esta é “a tentação do medo da liberdade, do medo do Espírito Santo (…) É melhor ficar naquilo que é seguro”. O papa contou então o caso de um superior geral que, nos anos 1930, “prescreveu todo tipo de regras anti-carisma” para os seus religiosos, “um trabalho de anos”. Quando chegou a Roma, um abade beneditino lhe disse, depois de ouvir este fato, que ele teria “matado o carisma da congregação”, “teria matado a liberdade”, já que “este carisma dá frutos na liberdade e ele tinha freado o carisma”.

“Existe essa tentação de voltar para trás, porque nos achamos mais ‘seguros’ lá atrás: mas a segurança plena está no Espírito Santo que nos leva para frente. E o que nos dá essa confiança, como diz São Paulo, é o Espírito, que é mais exigente, porque Jesus nos diz: ‘Em verdade vos digo: até não passarem os céus e a terra, não passará um ápice da lei’. É mais exigente! Mas não nos dá aquela segurança humana. Não podemos controlar o Espírito Santo: esse é o ‘problema’! Isto é uma tentação”.

A tentação do relativismo

Há também, prosseguiu Francisco, outra tentação: a do “progressismo adolescente”, que nos faz “sair da estrada”.

“Pegamos de um lado ou de outro os valores dessa cultura… Querem fazer essa lei? Então que seja feita essa lei. Querem levar adiante aquilo outro? Então vamos alargar um pouco mais o caminho. No fim, isso não é um verdadeiro progressismo. É um progressismo adolescente: como os adolescentes que querem ter tudo, com entusiasmo, e no final? Tropeçam… É como a estrada quando está congelada e o carro desliza e sai da pista… É outra tentação deste momento! Nós, neste momento da história da Igreja, não podemos voltar atrás nem sair da estrada!”.

O caminho, disse o papa, “é o da liberdade no Espírito Santo, que nos torna livres; do contínuo discernimento sobre a vontade de Deus para seguir em frente neste caminho, sem ter que voltar para trás e sem sair da estrada”. Peçamos ao Senhor “a graça que o Espírito Santo nos dá para seguir adiante”.

É preciso deixar-se amar por Deus

Meditação do papa na festa do Sagrado Coração de Jesus

CIDADE DO VATICANO, 07 de Junho de 2013 (Zenit.org) – Deixar-se amar por Deus com ternura é difícil, mas é a graça que temos que pedir dele. Este foi o convite do papa Francisco na missa desta manhã na Casa Santa Marta.

Concelebrou com ele o bibliotecário da Santa Igreja Romana, dom Jean-Louis Bruguès, e o pe. Sergio Pagano. Assistiu à missa parte do pessoal do Arquivo Secreto Vaticano.

“Jesus nos amou muito, não com palavras, mas com fatos e com a vida”, repetiu várias vezes o papa na homilia de hoje, solenidade do Sagrado Coração de Jesus, que ele chama de “festa do amor”, de um “coração que amou muito”. Um amor que, como repetia Santo Inácio, “se manifesta mais nas obras do que nas palavras” e que é especialmente “mais um dar-se do que um receber”.

Bases do amor de Deus

“Estes dois critérios”, destacou o papa, “são os pilares do amor verdadeiro”, e é o Bom Pastor quem representa todo o amor de Deus. Ele conhece as suas ovelhas uma por uma, “porque o amor não é abstrato nem geral: é o amor por cada um”.

“Um Deus que se torna próximo por amor, que caminha com o seu povo, e esse caminhar chega a um ponto inimaginável. Nunca podemos imaginar que o próprio Deus se torna um de nós e caminha conosco, fica conosco, permanece na sua Igreja, continua presente na Eucaristia, continua na sua Palavra, permanece nos pobres, fica conosco para caminhar! E isto é estar perto: é o pastor perto do seu rebanho, das suas ovelhas, que ele conhece uma por uma”.

Explicando uma passagem do livro do profeta Ezequiel, Francisco ressalta outro aspecto do amor de Deus: o cuidado da ovelha perdida e da ovelha ferida e doente:

“A ternura! Deus nos ama ternamente! Nosso Senhor conhece aquela linda ciência das carícias, aquela ternura de Deus. Não se ama com as palavras. Ele se aproxima, chega perto, e nos dá aquele amor com ternura. Proximidade e ternura! Esses dois estilos de Deus que se torna próximo e que dá todo o seu amor inclusive nas menores coisas: com a ternura. E é um amor forte, porque a proximidade e a ternura nos fazem ver a fortaleza do amor de Deus”.

Chamados a amar

“Mas vocês amam como eu os amei?”, foi a pergunta que o papa destacou, reforçando que o amor deve “ser próximo”, deve ser “como o do bom samaritano” e, em particular, ter “o sinal da proximidade e da ternura”. Mas como devolver todo esse amor a Deus? Este foi o outro ponto em que Francisco se concentrou: “amando-o”, ficando “perto dele”, sendo “ternos com Ele”. Mas isto não é suficiente:

“Pode parecer uma heresia, mas é a maior das verdades! Mais difícil do que amar a Deus é deixar-se amar por Ele! A maneira de devolver tanto amor é abrir o coração e deixar-se amar. Deixar que Ele venha até nós e senti-lo perto. Permitir que ele seja terno, que ele nos acaricie. Isso é muito difícil: deixar-se amar por Ele. E é isto o que talvez devamos pedir hoje na missa: Senhor, eu quero te amar, mas me ensina essa difícil ciência, esse difícil hábito de me deixar amar por ti, de te sentir por perto e de sentir a tua ternura! Que o Senhor nos dê esta graça”.

Destruir os ídolos para amar a Deus plenamente

Homilia do Papa Francisco na missa celebrada na capela da Casa Santa Marta

Por Salvatore Cernuzio

ROMA, 06 de Junho de 2013 (Zenit.org) – A missa desta manhã  na capela da Casa Santa Marta foi concelebrada pelo arcebispo de Curitiba, José Vitti; Juan Segura, de Ibiza, Espanha;  Chirayath Anthony, de Sagar, Índia. Participaram alguns funcionários da Biblioteca do Vaticano, acompanhados pelo vice-prefeito Ambrose Paizzoni e um grupo de leigos da Universidade Lateranense junto com o  Vice-Reitor, Mons. Patrick Valdrini.

O Papa, como todos os dias,  apresenta em seu sermão argumentos extraídos do Evangelho da liturgia diária. Refletindo sobre a passagem de Marcos, o Santo Padre falou sobre a figura do escriba que  foi até Jesus e perguntou: “Qual é o primeiro de todos os mandamentos?”. A questão aparentemente inocente, de acordo com o Papa, esconde um desejo de “testar” o Messias, se não “fazê-lo cair na armadilha”.

Isso é demonstrado pela resposta de Jesus: “Tu não estás longe do reino de Deus”.  Uma maneira implícita, de acordo com o papa Francisco, com a qual Jesus gostaria de dizer ao escriba: “Você sabe a teoria”, mas “ainda te falta certa distância do Reino de Deus”, isto é, você tem que caminhar para transformar “em realidade esse mandamento”.

“Não basta dizer: “Mas eu acredito em Deus, Deus é o único Deus ‘”, disse o Pontífice. “Tudo bem, mas como você vive isso no caminho da vida? Porque podemos dizer: “O Senhor é o único Deus, não há outro, mas viver como se Ele não fosse o único Deus,  e ainda ter outras divindades à nossa disposição “.

O perigo é a idolatria. Essa “é trazida até nós com o espírito do mundo. E Jesus  foi claro: o espírito do mundo, não! Pede ao Pai que nos defenda do espírito do mundo, na última ceia “, porque” nos leva  à idolatria”.

“A idolatria é sutil”, enfatizou  Bergoglio, insinua-se na alma do homem. Nós também “temos nossos ídolos ocultos”.  “Descobri-los”, procurá-los e “destruí-los”  é a única maneira de avançar e “não estar longe do reino de Deus”.

Deus, então, “pede-nos para afastar os ídolos” que “estão escondidos em nossa personalidade, em nosso modo de viver” e “impedem-nos de amar a Deus”.  

Isso explica por que o apóstolo Tiago, quando diz que quem é amigo do mundo, é inimigo de Deus, começa dizendo: Adúlteros. Nos condena, mas com o adjetivo: Adúlteros ” .Por que, disse Bergoglio, “quem é” amigo “do mundo é um idólatra, não é fiel ao amor de Deus! A estrada para não estar muito longe” e “avançar no Reino de Deus, é uma estrada de fidelidade que se assemelha a do amor conjugal”.

O amor do Senhor, no entanto, é um amor ainda maior, que apesar das “pequenas ou não tão pequenas idolatrias que possuímos”, é impossível não ser fiel. O Santo Padre exortou a rezar nos momentos em que somos invadidos pela fraqueza e não somos capazes de viver a fidelidade total a Deus, pedindo a Jesus: “Senhor, você é tão bom, ensina-me o caminho para estar sempre perto de Deus e afastar sempre todos os ídolos. É difícil, mas temos que começar, porque eles nos tornam inimigos de Deus”. 

 

Viver a Eucaristia é “derrotar o medo de doar e de ser transformados por Ele”

Homilia na solenidade de Corpus Christi: papa Francisco exorta à partilha e 

Por Luca Marcolivio

ROMA, 31 de Maio de 2013 (Zenit.org) – Seguimento de Cristo, comunhão, partilha: com base nesta nova “tríade”, em estilo inaciano, o papa Francisco articulou a sua homilia na missa da solenidade do Corpo e do Sangue de Cristo, celebrada ontem na basílica de São João de Latrão.

O primeiro dos três conceitos aborda a presença de Jesus no meio das pessoas e as “situações concretas do mundo”. Cristo “acolhe as pessoas, fala com elas, cuida delas, lhes mostra a misericórdia de Deus”. E as pessoas “o seguem” e “escutam”, porque Jesus “fala e age de um modo novo, com a autoridade de quem é autêntico e coerente, de quem fala e age com verdade, de quem dá a esperança que vem de Deus, que é a revelação do Rosto de um Deus que é amor”, afirmou o pontífice.

Convidando os fiéis reunidos na praça de São João de Latrão a se identificarem com a “multidão do Evangelho”, que se encaminhava para seguir o Messias, o Santo Padre colocou a seguinte pergunta: “Como é que eu sigo Jesus?”. Do silêncio da Eucaristia, a partir da qual Ele nos fala, Jesus “nos lembra que segui-lo significa sair de nós mesmos e fazer da nossa vida não uma posse nossa, mas um presente para ele e para os outros”.

O segundo conceito, o de comunhão, decorre da “preocupação dos discípulos, que pediram que Jesus mandasse a multidão procurar comida e abrigo nos povoados das redondezas” (cf. Lc 9:12). A tentação de se abster de ajudar um irmão necessitado, despachando-o com um “Deus te ajude!”, é comum também entre os cristãos.

A solução de Jesus, no entanto, é muito mais grandiosa. Diante da multidão faminta, Ele pede que os discípulos assentem os recém-chegados e, pouco depois, realiza o milagre da multiplicação dos pães e dos peixes. Disse o papa: “É um momento de profunda comunhão: a multidão, saciada pela palavra do Senhor, é agora alimentada pelo pão da sua vida. E todos ficaram satisfeitos, escreve o evangelista”.

A escuta da Palavra de Deus e a alimentação com o Corpo e Sangue de Cristo “nos faz passar da condição de multidão para a condição de comunidade, do anonimato para a comunhão”, e, por meio da Eucaristia, “nos faz sair do individualismo para vivermos juntos o seguimento de Cristo, a fé nele”.

Surge daqui uma nova pergunta: “Como é que eu vivo a Eucaristia? Anonimamente ou como um momento de verdadeira comunhão com o Senhor, e também com os muitos irmãos e irmãs que compartilham da mesma mesa?”.

O último conceito apresentado pelo papa é o da partilha, que, no caso específico, diz respeito aos “cinco pães e dois peixes”. E os discípulos, “diante da incapacidade dos seus meios, da pobreza do que podiam pôr à disposição”, colocaram a sua confiança na palavra de Jesus e conseguiram alimentar a multidão imensa que estava ali à sua frente.

É somente na solidariedade, “palavra malvista pelo espírito mundano”, disse o papa, que “a nossa vida será fecunda e dará frutos”. Ao doar o seu corpo através da Eucaristia, Nosso Senhor nos torna participantes da “solidariedade de Deus”, uma solidariedade que “nunca se esgota” e que “não deixa de nos surpreender”.

Também nessa noite, Jesus se deu a nós na Eucaristia, “o verdadeiro alimento que sustenta a nossa vida, inclusive nos momentos em que a estrada se torna íngreme, em que os obstáculos deixam os nossos passos mais lentos”.

É na Eucaristia que “o pouco que temos, o pouco que somos, se compartilhado, vira riqueza, porque o poder de Deus, que é o poder do amor, desce até a nossa pobreza para transformá-la”, acrescentou Francisco.

O Santo Padre concluiu a homilia com um convite para cada um sair  da sua “caixinha” e derrotar o “medo de doar, de partilhar, de amar a Deus e ao próximo”: em suma, de se deixar “transformar por Ele”.