Um testemunho comovente que a protagonista, uma jovem de 22 anos, quis compartilhar com os leitores da Aleteia
ALETEIA TEAM
23 DE SETEMBRO DE 2015
Este testemunho comovente chegou até nós pelas redes sociais, como resposta ao artigo “Deus quer a vida que vem de um estupro?”. Agradecemos pela coragem da sua autora, que prefere permanecer no anonimato, e esperamos que este relato toque o coração de quem o ler.
Decidi escrever este testemunho depois de ter lido o artigo que vocês publicaram há alguns dias sobre os bebês concebidos em um estupro. Já se passaram 3 anos desde que descobri que fui concebida dessa maneira, e é a primeira vez que falo tão extensamente sobre isso.
No começo, eu tentava negá-lo (ou não pensar muito nisso), pois para mim a primeira impressão foi de que eu não estava nos planos de ninguém da minha família, muito menos nos planos da minha mãe, de verdade! Ela havia planejado uma vida totalmente diferente da que tem agora comigo.
Ela era uma religiosa consagrada no momento do estupro (havia feito os votos perpétuos 5 anos antes do meu nascimento). Sei que ela era uma grande religiosa, e tinha (e ainda tem) a mesma mentalidade do Papa João Paulo II: dar protagonismo aos jovens dentro da Igreja.
Há muitas coisas que ainda desconheço sobre o que aconteceu, porque fiquei sabendo disso por meio de umas cartas velhas que escreveram para a minha mãe na época. Ela passou toda a gravidez longe do seu país, recebendo cartas da sua família, do seu melhor amigo (um sacerdote, que é meu padrinho de Batismo) e de algumas das suas irmãs de comunidade.
Sinto que Deus começou a agir desde o começo, por meio da madre superiora da congregação, cuja única preocupação desde o princípio foi proteger a minha mãe; ela, junto com a família da minha mãe, havia pensado que o melhor seria afastá-la do seu ambiente para que ela pudesse tomar uma decisão sem pressões, e também para proteger a comunidade de freiras. Ela decidiria se me daria em adoção e voltaria à comunidade, ou deixaria o hábito e se tornaria mãe.
Sei que Deus se manifestou por meio das pessoas que estavam com a minha mãe naquele então, e pude palpar como iam crescendo os sentimentos ao longo dos meses (eu não tinha as cartas escritas pela minha mãe, mas as respostas a elas).
Li todas as cartas mais de uma vez, e minhas favoritas sempre foram 3. Cada uma tem alguns meses de diferença; as emoções de cada momento são diferentes, e acho que me ajudarão a dar um testemunho melhor.
Pude notar como, no começo, tudo estava nublado para ela; havia sentimento de culpa (isso é muito comum, pelo que entendi, entre as vítimas de estupro, ao achar que ele poderia ser evitado) e nenhuma solução parecia ser a correta; na verdade, a única resposta clara era confiar em Deus.
Em uma das cartas, meu padrinho lhe escreveu o seguinte: “Minha querida R., até hoje me atormenta a ideia de por que eu não estava lá para defender você, e por que Deus permitiu que isso lhe acontecesse, mas encontrei um pouco de calma na Palavra de Deus, com a leitura de Jó. Deus nos coloca à prova para ver a nossa fidelidade. Sei que você sairá bem desta, como sempre o faz!”.
Ler sobre isso, em um primeiro momento, foi como um balde de água fria. Acho que todos nós gostamos de pensar que fomos planejados e amados (ou pelo menos amados) desde o primeiro momento, mas a realidade é que, mesmo que no começo não seja assim, ou que em muitos casos nunca seja assim, Deus sim nos ama desde o momento em que nos planeja neste mundo. Demorei muito para compreender isso, mas o segredo foi segurar na mão de Deus para compreender que tudo isso tinha um propósito.
Conforme o tempo ia passando, pude notar que as pessoas que nos cercavam tinham muito carinho por mim, e me levavam em consideração em cada situação possível. Já não era só o bem da minha mãe, mas também o meu, porque no começo foi difícil de entender, as decisões que ela tomaria também me afetariam. Todos começavam a nos ver como uma família.
Uma religiosa lhe enviou um cartão com o seguinte texto: “Querida R., espero que você se encontre bem. Rezo sempre por você e por esta criatura que está no seu ventre. Pobrezinha, ela não tem culpa de nada, é uma inocente que não tem por que pagar pelos erros de outros. Querida R., força!”.
Nesse momento, compreendi tudo, e tenho certeza de que minha mãe também começou a superar sua depressão na época em que esse cartão chegou. E eu pensei: “Bem, é isso, sou filha de um estupro. Posso ficar me lamentando por ser um acidente, ou posso agradecer a Deus cada dia por ter me permitido viver e crescer com uma grande mãe”.
Ler esse pequeno cartão foi como voltar a nascer. Conforme fui crescendo, descobri os planos que Deus havia preparado para mim, e agora que sei de onde venho, tenho muito mais vontade de realizar isso, porque sinto que Ele me deu uma oportunidade que é negada a milhões de bebês todos os dias.
Finalmente chegou o dia do meu nascimento, em dezembro de 1993. Cheguei totalmente saudável, graças a Deus e à minha mãe, que também esteve em perfeito estado de saúde. Meu padrinho escreveu este pequeno texto naquele dia: “Querida R., obrigado. Obrigado porque hoje você disse ‘sim’ à vida”.
Não posso dizer que aí tudo se tornou mais fácil, porque ainda restavam muitas coisas complicadas, entre elas pedir à Santa Sé a dispensa dos votos religiosos, explicando os motivos que a obrigavam a isso.
Mas Deus não permite um mal sem tirar um bem dele. Depois do meu nascimento, minha mãe conseguiu um emprego na Conferência Episcopal do meu país, chegando, depois de alguns anos, a ser a responsável nacional da área da juventude. Deus não permitiu que ela se afastasse da sua opção de trabalhar pelos outros, pelos jovens, mesmo não sendo do jeito que ela imaginou no começo.
Eu cresci nesse ambiente, com jovens próximos de Deus, que não tinham vergonha da sua fé, que seguiam Jesus e amavam Maria; por isso mesmo, hoje sou uma jovem apaixonada pela minha fé e pela minha Igreja.
Para concluir, só me resta agradecer a Deus pela oportunidade que Ele me deu, primeiramente de chegar a este mundo, e depois, de crescer ao lado de uma mãe que nunca considerou o aborto como uma opção. Não foi nada fácil, sobretudo para ela, mas todas as noites nós nos colocamos nas mãos de Deus e pedimos a intercessão de todos aqueles que já partiram, entre eles a superiora do convento.
Aprendemos tudo juntas. Acho que ser somente nós duas faz com que tenhamos um vínculo especial, e penso que a maneira como eu cheguei à sua vida faz que o amor que ela tem por mim seja especial, por todas as situações pelas quais ela teve de passar para chegar onde estamos agora.
Espero que este testemunho seja útil para aquelas mulheres que, como minha mãe, estão neste momento decidindo o futuro dos seus filhos. Por favor, nunca pensem no aborto! Deus tem um amor especial por vocês, e grandes planos para as crianças que vêm a este mundo sem ser desejadas; e para as mães, Ele tem uma grande recompensa por terem dito “sim” à vida, mesmo que esta vida tenha vindo de uma situação tão triste.
E às pessoas que foram concebidas em um estupro: por favor, honrem a Deus cada dia da sua vida!
“A Vida foi mais forte do que a violência “(Gabriel Saboia Alves/ CCRM)